TJ-DF - XXXXX20208070018 1754794
Ementa: APELAÇÃO. DIREITO ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE CONHECIMENTO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTES OS PEDIDOS APRESENTADOS NA INICIAL. LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. EXPOSIÇÃO DAS RAZÕES PARA DESCONSIDERAR O LAUDO PERICIAL. ARTS. 371 E 479 DO CPC . OBSERVÂNCIA. PRELIMINAR DE CERCEAMENTO AO DIREITO DE DEFESA. REJEITADA. COLOCAÇÃO DE DISPOSITIVO CONTRACEPTIVO ESSURE. EFEITOS ADVERSOS E RISCOS DO PROCEDIMENTO. DEVER DE INFORMAÇÃO DESCUMPRIDO. PROTOCOLOS MÉDICOS NÃO OBSERVADOS. DANOS À APELANTE. NEXO CAUSAL CARACTERIZADO. VIOLAÇÃO AO DIREITO DE ESCOLHA LIVRE E CONSCIENTE RELATIVO AO PLANEJAMENTO FAMILIAR. LESÃO A DIREITOS DE PERSONALIDADE, ESPECIALMENTE A INTEGRIDADE FÍSICA E PSÍQUICA. DANOS MORAIS. RESPONSABILIDADE CIVIL DO DISTRITO FEDERAL. INCAPACIDADE LABORATIVA NÃO CONSTATADA. ART. 950 DO CC . PENSÃO CIVIL. DESCABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. REDISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. 1. Apelação interposta contra a sentença que, em ação de conhecimento ajuizada contra o Distrito Federal, julgou improcedentes os pedidos apresentados na petição inicial. A autora, ora apelante, busca condenação do ente distrital a pagar compensação pecuniária por danos morais e pensão mensal equivalente a seis salários mínimos, em razão de prejuízos que teriam decorrido de falha na prestação do serviço público de saúde quanto à colocação do dispositivo contraceptivo Essure. 2. Constatado que o Juiz, na sentença, apreciou a perícia em conjunto com os demais elementos de prova constantes nos autos e, em observância aos arts. 371 e 479 do CPC , expôs os motivos que o levaram a desconsiderar o resultado da manifestação pericial, com base no princípio do livre convencimento motivado, não há falar em nulidade por cerceamento ao direito de defesa. Preliminar rejeitada. 3. Revela-se, por meio da prova documental, que não houve prestação de informações claras, completas e precisas sobre as vantagens, as desvantagens, os riscos e as reações adversas envolvidas no método Essure, em razão da ausência de assinatura da apelante no ?Termo de Ciência e Consentimento Pós-Informado? e da insuficiência dos dados trazidos em seu prontuário médico, documento que indica não ter ocorrido assistência e monitoramento adequados antes e depois do procedimento de implantação do dispositivo contraceptivo. 4. Verifica-se, de acordo com a prova pericial, que há relação causal entre o quadro de dor crônica diagnosticado na apelante e o uso do dispositivo em referência e que as recomendações e os protocolos médicos sobre o procedimento não foram devidamente cumpridos no caso concreto. 5. Caracterizada a falha na prestação do serviço público de saúde e o nexo de causalidade entre a conduta da Administração Pública e seus agentes e o dano suportado pela recorrente, conclui-se que estão presentes os pressupostos da responsabilidade civil estatal, conforme o art. 37, § 6º, da CF. 6. O ato danoso afetou o direito de escolha livre e consciente relativo ao planejamento familiar (art. 226, § 7º, da CF e arts. 4º , 5º e 9º da Lei n. 9.263 /96) e frustrou a legítima expectativa da apelante, que foi exposta a danos e riscos à sua saúde sobre os quais não foi adequadamente cientificada. Cabe ressaltar que a recorrente, em razão dos sintomas gerados pela utilização do dispositivo, buscou, em mais de uma oportunidade, assistência na rede pública de saúde e encontra-se em processo de preparação para retirada do item por meio de procedimento cirúrgico invasivo. 7. Identificada a lesão a direitos de personalidade (art. 5º, X, da CF e art. 12 do CC ), deve-se reformar a sentença para condenar o apelado a compensar os danos morais causados. 8. De acordo com o critério bifásico para quantificação de danos morais, em análise das peculiaridades do caso concreto, reputa-se razoável e proporcional fixar o valor de R$40.000,00 (quarenta mil reais) para a compensação pecuniária. 9. À luz do art. 950 do CPC , considera-se descabido o pedido de fixação de pensão contra o Distrito Federal, pois não há provas de que o ato ilícito teria afetado a capacidade laborativa da recorrente ou dificultado o exercício de outras atividades cotidianas. 10. Recurso conhecido e parcialmente provido. Sentença reformada. Redistribuição do ônus de sucumbência.