JULGAMENTO POR EMENTA (artigo 46 , Lei nº 9.099 /95) EMENTA: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C COBRANÇA E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. SEGURO PRESTAMISTA. EVENTO MORTE. LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM. HERDEIRO ÚNICO. ORDEM DE VOCAÇÃO HEREDITÁRIA. ILEGITIMIDADE PASSIVA AFASTADA. ESTIPULANTE. RESPONSABILIDADE SOLIDARIA. HIPÓTESE EXCEPCIONAL. TEORIA DA APARÊNCIA. OBJETO CONTRATUAL. PACTO ACESSÓRIO. QUITAÇÃO DO SALDO DEVEDOR CONTATUAL. LIMITAÇÃO. MODALIDADE VINCULADA. CAPITAL SEGURADO. DIFERENÇA NÃO APURADA. ESTIPULANTE. BENEFICIÁRIO EXCLUSIVO. AUSÊNCIA DE CONTRATAÇÃO EM SENTIDO DIVERSO. PARCELAS PAGAS APÓS O SINISTRO. RESTITUIÇÃO DEVIDA AO HERDEIRO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Conforme se infere dos autos, a parte recorrente foi condenada ao pagamento do valor de R$19.431,36, a título de indenização decorrente de seguro prestamista contratado por força do contrato de financiamento bancário firmado entre as partes. 2. Nos contratos de seguro prestamista, ocorrido o evento morte, o capital segurado será pago, se contratado, aos herdeiros do segurado, obedecida a ordem da vocação hereditária prevista em Lei. Assim, comprovada documentalmente a união estável entre a parte recorrida e a segurada, e diante da constatação de que a de cujus não deixou descendentes e/ou ascendentes, conforme denota a certidão de óbito acostada aos autos, patente a legitimidade ad causam do cônjuge sobrevivente para postular o recebimento da indenização securitária, na forma do inciso III do art. 1.829 do CC . 3. Por outro lado, destaca-se que a análise da preliminar arguida em recurso perpassa pela averiguação de responsabilidade da estipulante sobre os serviços contratados, de modo que alcança o mérito da demanda e, como tal, será apreciada. 4. Neste tópico, sustenta a recorrente que, na condição de estipulante de apólice de seguro, emitida pela seguradora Cardif do Brasil Vida e Previdência S/A., não possui ingerência no processo de cobertura de sinistros e figura como credora da indenização securitária, porque da própria natureza do seguro prestamista. 5. Como é cediço, nos contratos de seguro prestamista, existe a figura do estipulante que pode ser uma pessoa física ou jurídica que estipula o seguro, o qual fica investido de poderes de representação do segurado, podendo assumir o papel do credor ou do devedor nas operações de seguro. 7. Nesses termos, vê-se que, em regra, o estipulante não é responsável pelo pagamento da indenização securitária, uma vez que atua como mero mandatário do segurado. Contudo, de forma excepcional, é possível atribuir ao estipulante a responsabilidade pelo pagamento, como nas hipóteses de mau cumprimento das obrigações contratuais ou de criar legítima expectativa de ser o responsável por esse pagamento, consoante preconiza a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça[1]. 8. No caso, considerando que o contrato de seguro em análise afigura-se como pacto acessório ao contrato de financiamento, detém legitimidade ad causam a instituição financeira responsável pela divulgação e efetiva comercialização da contratação do seguro, se apresentando, para o consumidor, como garantidor do negócio, até porque, conforme apurado, a operação efetivou-se por atuação da empresa corretora pertencente a mesmo grupo econômico. 9. Além disso, conquanto a seguradora tenha efetivamente negado a cobertura securitária ao consumidor, a identificação visual apresentada no Certificado de Seguro analisado faz menção à contratação de Seguro Chevrolet Plus, em detrimento da identificação clara e suficiente da empresa seguradora, fato suficiente para incutir no consumidor a ideia de que a instituição financeira, via de aplicação da teoria da aparência, é responsável ou garantidora do pagamento da indenização contratada. 10. Ademais, não obstante estipulante e seguradora sejam pessoas jurídicas distintas, patente a existência de cadeia de fornecedores perante o consumidor ( CDC , art. 7º ), haja vista a parceria havida entre as empresas, visando a evidente obtenção de lucro, de modo a se extrair a responsabilidade solidária entre as prestadoras de serviço. 11. Quanto ao mérito, segundo precedente jurisprudencial do Tribunal de Justiça de Goiás, a simples alegação de omissão de doença preexistente pelo segurado não é fundamento hábil à recusa do pagamento do seguro se não foi exigido do contratante exames prévios ou documentação identificadora de seu estado de saúde, tal como se observou no caso[2]. 12. Ademais, para comprovação da má-fé, imprescindível seja demonstrado que o segurado omitiu dolosamente a doença quando contratou o seguro, hipótese não demonstrada no caso. 13. O seguro prestamista tem por objetivo amortizar ou custear, total ou parcialmente, obrigação assumida pelo devedor, no caso de ocorrência de sinistro coberto, até o limite do capital segurado contratado. 14. No seguro prestamista, via de regra, na ocorrência de evento coberto, caso o valor da obrigação financeira devida ao credor seja menor do que o valor a ser indenizado no seguro prestamista, a diferença apurada será paga ao próprio segurado ou ao segundo beneficiário indicado, desde que ajustado expressamente entre as partes, conforme inteligência do art. 31 da Resolução nº 365/2018 da SUSEP. 15. Na origem, observa-se que o seguro prestamista foi contratado em razão do contrato de financiamento, revelando-se, portanto, acessório à obrigação principal, cuja finalidade, por sua própria natureza, é garantir a quitação do saldo devedor apurado da data do sinistro. 16. Não por acaso, consta do Certificado de Seguro, para a cobertura do evento morte, a modalidade vinculada, em que o capital segurado é necessariamente igual ao valor da obrigação, sendo alterado automaticamente a cada amortização, em face da previsão de que o limite máximo de indenização corresponde ao ?Pagamento do Capital Inicial do Contrato de Financiamento na data do evento?, no limite de R$ 150.000,00 pagos à vista?. 17. Há, ainda, previsão de que ?para todas as coberturas contratadas o beneficiário será o Estipulante, o qual fica responsável por efetuar o ajuste do compromisso financeiro do segurado?. 18. As condições gerais do contrato de seguro em comento, Processo Susep nº 15414.001501/2005-31[3], confirma a modalidade do capital segurado vinculado ao saldo devedor, e não a modalidade fixa no valor do financiamento, diante da previsão de que a finalidade do seguro contratado é a quitação do saldo devedor, calculada a indenização na data do evento coberto, qual seja, morte (cláusula 7). 19. Destarte, conforme já decidiu o Superior Tribunal de Justiça[4], considerando que o contrato de seguro do tipo prestamista é aquele pelo qual o estipulante tem a garantia de pagamento da obrigação atrelada, em caso de falecimento do contratante, a indenização securitária destina-se à quitação integral do saldo devedor contratual, sendo indevido o pagamento de eventual saldo remanescente da apólice de seguro prestamista aos herdeiros do segurado se ausente previsão contratual em sentido diverso, cabendo-lhes, tão somente, a restituição do que despenderam para pagamento do débito após o sinistro. 20. De rigor, portanto, a retificação do julgado, de modo a estabelecer que a indenização securitária se dê no importe do saldo devedor contratual apurado na data do falecimento, ao tempo em que havia sido paga a importância de R$ 16.031,78, correspondente a 29 das 36 prestações estipuladas. Por simples cálculo aritmético, considerando o valor total do empréstimo (R$ 19.901,52), o saldo devedor contratual, apurado na data do evento coberto, era de R$ 3.869,74, que corresponde ao valor da indenização securitária devida para a quitação da obrigação principal. 21. Pela dinâmica processual estabelecida no caso por força da obrigação solidária da parte estipulante, tal constatação equivale, na prática, ao reconhecimento da quitação do contrato de financiamento, razão por que deve a sentença ser confirmada na parte em que constituiu a obrigação de fazer consistente na entrega do recibo de quitação do veículo. 22. Todavia, considerando que, após o falecimento da segurada, o herdeiro arcou com o pagamento de 5 parcelas, no importe de R$ 2.827,86, referida quantia deverá ser restituída à parte recorrida, porque despendida após o sinistro. 23. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, EM PARTE, para reformar a sentença objurgada a fim de determinar que a condenação da parte recorrente restrinja-se à restituição do valor despendido após a ocorrência do sinistro, totalizando o importe de R$ 2.827,86 (dois mil e oitocentos e vinte e sete reais e oitenta e seis centavos), monetariamente corrigido pelo INPC a partir do efetivo desembolso e acrescido de juros de mora (1%) ao mês a contar da citação ( CC , art. 405 ). Sentença mantida em seus demais termos. 24. Sem condenação em custas e honorários advocatícios, nos termos do art. 55 da Lei nº 9.099/65.