ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Atílio Vivacqua - Vara Única Rua Carolina Fraga, 67/69, Fórum Desembargador Manoel Xavier Paes Barreto Filho , Centro, ATÍLIO VIVÁCQUA - ES - CEP: 29490-000 Telefone:(28) 35381249 PROCESSO Nº XXXXX-07.2023.8.08.0060 AÇÃO CIVIL PÚBLICA (65) REQUERENTE: FERNANDA ANTONELI MACEDO , MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO ESPIRITO SANTO REQUERIDO: JULIANA ANTONELI MACEDO , MUNICIPIO DE ATILIO VIVACQUA, ESTADO DO ESPÍRITO SANTO SENTENÇA Vistos etc. Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO ESTADUAL em favor de JULIANA ANTONELI MACEDO em face de ESTADO DO ESPÍRITO SANTO e MUNICÍPIO DE ATÍLIO VIVACQUA, todos devidamente qualificados na exordial. Narra a exordial, em síntese, que JULIANA faz uso constante e excessivo de drogas ilícitas, principalmente “crack”, razão pela qual apresenta transtornos comportamentais. Pugna pelo deferimento da medida liminar em caráter de urgência visando a internação compulsória do cidadão. Decisão inicial deferiu a tutela de urgência em ID XXXXX. Oficio registrado em ID XXXXX registrando a internação do interessado. A requerida Juliana e o ente municipal embora citados, quedaram-se inerte, conforme ID XXXXX. O ente Estadual apresentou contestação em ID XXXXX. Réplica à contestação em ID XXXXX. É o relatório. Fundamento e decido. O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do artigo 355 , inciso I , do Código de Processo Civil , na medida em que não existe a necessidade de dilação probatória para o deslinde da causa, estando a causa suficientemente madura para julgamento com apoio na prova documental produzida. Com efeito, a presente demanda foi instaurada com o fim de se providenciar vaga de internação para a cidadã Juliana , sendo tal medida deferida em decisão liminar registrada em ID XXXXX. No mérito, o pedido é procedente. Conforme relatado a beneficiada Juliana sofre dependência química CID F14.2, motivo pelo qual foi concedida a tutela pleiteada, diante da indicação médica especializada, conforme determina o art. 6º da Lei 10216 /2001. O fornecimento de tratamento de saúde decorre de direito constitucional basilar e de atendimento impostergável, refletido em norma de que a saúde é direito universal e de responsabilidade do Poder Público, em todos os seus níveis, e com vistas não somente na redução da incidência de doenças como na melhora das condições e qualidade de vida dos cidadãos em geral e, sobretudo, do direito à vida e sua preservação. O dever de assistência à saúde é comum aos entes da Federação, de forma que se demonstra a possibilidade de ajuizamento da ação perante União, Estado ou Município. Portanto nenhum dos entes federativos pode eximir-se de seu mister constitucional, invocando para tanto questões de ordem administrativa, financeira ou orçamentária, porque o “direito a saúde é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço” (STF, Segunda Turma, AI 734.487 -AgR, Re. Min. Ellen Gracie , j. 3.8.2010) Neste ínterim, impende destacar os seguintes dispositivos da Lei n.º 10.216 /2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental: Art. 2º Nos atendimentos em saúde mental, de qualquer natureza, a pessoa e seus familiares ou responsáveis serão formalmente cientificados dos direitos enumerados no parágrafo único deste artigo. Parágrafo único. São direitos da pessoa portadora de transtorno mental: I - ter acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II - ser tratada com humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III - ser protegida contra qualquer forma de abuso e exploração; IV - ter garantia de sigilo nas informações prestadas; V - ter direito à presença médica, em qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI - ter livre acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII - receber o maior número de informações a respeito de sua doença e de seu tratamento; VIII - ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos possíveis; IX - ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental. Art. 3º É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais. Art. 4º A internação, em qualquer de suas modalidades, só será indicada quando os recursos extra-hospitalares se mostrarem insuficientes. Art. 6º A internação psiquiátrica somente será realizada mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos. Parágrafo único. São considerados os seguintes tipos de internação psiquiátrica: I - internação voluntária: aquela que se dá com o consentimento do usuário; II - internação involuntária: aquela que se dá sem o consentimento do usuário e a pedido de terceiro; e III - internação compulsória: aquela determinada pela Justiça. Com efeito, a internação, quer seja voluntária, involuntária ou compulsória, é considerada medida extrema, que tem cabimento somente quando verificada a insuficiência dos recursos extra-hospitalares mediante laudo médico circunstanciado que caracterize os seus motivos, conforme legislação supramencionada. De toda a forma, é certo que é obrigação dos requeridos em arcar com os custos necessários para o tratamento de saúde das pessoas carentes que não detém de recursos financeiros para tanto. No caso dos autos, como extraível do Laudo Médico que a beneficiada/requerida sofre dependência química CID F14.2. Esse diagnóstico, devidamente subscrito pelo profissional médico, Dr. Geraldo Guarçoni Filho – CRM-ES 2989, é elemento suficiente a evidenciar a probabilidade do direito à internação involuntária, sobretudo por ser dele perceptível que recursos extra-hospitalares são inábeis ao convalescimento e tratamento do interessado. Verifico que também há nos autos indícios de que a cidadã não possui recursos econômico-financeiros para suportar os custos do tratamento, de forma que foi necessária a intervenção do Ministério Público para ajuizar a presente Ação Civil Pública, restando comprovado que preencheu todos os requisitos necessários para receber legitimamente o tratamento necessário. Ademais, o Laudo médico encartado com inicial demonstra claramente que a internação é imprescindível. Desta forma, entendo ser o caso de reconhecimento da obrigação do Poder Público em proceder à internação, bem como em condenar a requerida a internação involuntária, em virtude da recusa de aderir a tratamento ambulatorial, visando sua recuperação. Dispositivo À luz de todo o exposto, com fulcro no artigo 487 , I , do Código de Processo Civil , JULGO PROCEDENTE a presente Ação Civil Pública para condenar a requerida JULIANA ANTONELI MACEDO a internação compulsória já que comprovado sua dependência química CID F14.2 e recusa em se submeter a tratamento voluntário. Condeno o MUNICÍPIO DE ATÍLIO VIVACQUA e o ESTADO DO ESPÍRITO SANTO, solidariamente, a proceder e manter a internação compulsória da requerida em hospital adequado, tornando definitiva a liminar e, por consequência julgo extinto o processo com resolução de mérito. Determino ainda que os requeridos mantenham a internação com fornecimento de transporte e terapia médica que vier a ser indicada, inclusive fornecimento de medicamentos. Sem condenação ao pagamento das custas em razão da isenção do ente público requerido e da gratuidade concedida. Expeça-se ofício ao CAPS para comunicação e acompanhamento do caso e, sendo necessário, adoção de outras providências pertinentes. Certifique a serventia o trânsito em julgado e, então, arquivem-se os autos independentemente de nova determinação judicial Publique-se. Registre-se. Intimem-se. Atílio Vivácqua/ES, data conforme a assinatura digital. MIGUEL MAIRA RUGGIERI BALAZS JUIZ DE DIREITO