ESTADO DO ESPÍRITO SANTO PODER JUDICIÁRIO Juízo de Vitória - Comarca da Capital - 7ª Vara Cível Rua Leocádia Pedra dos Santos, 80, Enseada do Suá, VITÓRIA - ES - CEP: 29050-370 Telefone:(27) 31980623 PROCESSO Nº XXXXX-09.2014.8.08.0024 PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) REQUERENTE: MICHELLE SIQUEIRA DO CANTO REQUERIDO: CAPARAO EMPREENDIMENTOS LTDA Advogado do (a) REQUERENTE: FABIANO ALVES DOS SANTOS - ES21636 Advogado do (a) REQUERIDO: RODRIGO CAMPANA TRISTAO - ES9445 SENTENÇA Trata-se de ação indenizatória proposta por Michelle Siqueira do Canto em face de Caparaó Empreendimentos Ltda. e Metron Engenharia Ltda., devidamente qualificados nos autos. Narra a autora na petição inicial (fls. 02-07 dos autos digitalizados) que adquiriu um imóvel construído pelas rés, incorporadora e construtora responsáveis por diversos empreendimentos do programa "Minha Casa Minha Vida" (fls. 09-57 dos autos digitalizados) e que, após a ocupação, foram identificadas várias falhas de construção, como falta de acabamento, diferenças na qualidade dos materiais e irregularidades estruturais. Apesar das tentativas de contato, alega que as rés não resolveram os problemas, levando a autora a contratar profissionais por conta própria para fazer os reparos necessários (fl. 61-65 dos autos digitalizados). Nesse sentido, a parte autora busca compensação pelos gastos extras e pela desvalorização do imóvel devido às falhas de construção. No mérito, argumenta que a pretensão indenizatória é respaldada pelos artigos 1245 e 159 do Código Civil ( CC ) e artigos 12 e 27 do Código de Defesa do Consumidor ( CDC ), que estabelecem a responsabilidade do construtor pelos danos causados por defeitos na construção. Assim, argumenta que o empreiteiro é responsável pela solidez e segurança da obra, independentemente de culpa, durante um prazo estabelecido por lei. No caso, aduz que o descumprimento do contrato pode ocorrer quando a obra não é executada conforme o esperado ou quando é executada de forma defeituosa, sendo ambos casos passíveis de responsabilização. Ademais, além das falhas já mencionadas, a autora afirma que outras irregularidades serão comprovadas por meio de perícia judicial, demonstrando a diferença entre o memorial descritivo e os materiais e serviços efetivamente empregados na construção. Por fim, pugna pela concessão do benefício da assistência judiciária gratuita (fl. 58-59 dos autos digitalizados), pela indenização por danos emergentes em R$5.779,79 (cinco mil setecentos e setenta e nove reais e setenta e nove centavos), pela indenização em razão da desvalorização do imóvel e pelo pagamento de indenização por danos morais no valor de R$30.000,00 (trinta mil reais). Citados, os réus apresentaram contestação intempestivamente (fl. 73-80 dos autos digitalizados), tendo sua revelia sido decretada à fl. 124 dos autos digitalizados. Todavia, a ré Caparaó Empreendimentos Ltda. manifestou-se às fls. 129-134 dos autos digitalizados argumentando que mesmo na condição de revel, pode produzir provas e contestar a ação, conforme o enunciado da Súmula 231 do STF. Pelo exposto, defende que a contestação apresentada fora do prazo não deve ser desentranhada dos autos, pois pode servir para a demonstração da verdade real dos fatos. No mais, a ré alega que os documentos acostados aos autos comprovam que o imóvel foi entregue em perfeitas condições, afastando o direito de reparação pleiteado pela autora. Destaca também que a autora desistiu do pedido de perícia técnica, o que implicaria na desistência do pedido de indenização relacionado à desvalorização do imóvel. Ao final, aduz que o pedido de indenização por danos morais não tem fundamento, pois não há comprovação de efetivo abalo à honra da autora. Audiência de conciliação designada à fl. 136 dos autos digitalizados e com resultado infrutífero (fl. 145 dos autos digitalizados). Intimadas as partes para especificarem as provas que pretendem produzir à fl. 149 dos autos, apenas a ré “Caparaó” se manifestou às fls. 152-153 dos autos digitalizados. Audiência de saneamento designada à fl. 154 dos autos digitalizados, com termo lavrado às fls. 156-157, na qual foi concedida parcialmente a gratuidade da justiça à parte autora, isentando-a do pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, porém mantendo a obrigação de antecipar o pagamento de honorários periciais, caso eventualmente viesse a ser produzida a aludida prova. Razões finais da ré às fls. 158-165. Era o que havia de relevante a ser consignado em sede de relatório. Decido. Pois bem, conforme se extrai do texto dos artigos 346 , parágrafo único e 349 , ambos do CPC , corroborado pela Súmula nº 231 do STF assim prescreve: "O revel, em processo cível, pode produzir provas, desde que compareça em tempo oportuno." Assim, estando o réu devidamente assistido por advogado e presente nos autos anteriormente ao início da fase instrutória, não há nenhum óbice ao requerimento e produção de provas pelo mesmo. Ante a possibilidade do réu produzir provas, verifico que o mesmo juntou aos autos diversos documentos de fundamental importância para a análise deste processo, isto é, o termo de vistoria e seu anexo, devidamente assinados pela autora em 02 de outubro de 2013 (fls. 98-99 dos autos digitalizados), bem como o comprovante de entrega de chaves (fl. 201 dos autos digitalizados), que pressupõe a realização da vistoria e aceite. Frisa-se ainda, que os ditos documentos comprovam a anuência expressa da parte autora quanto à regularidade do imóvel que lhe fora entregue, em especial, pelo fato de que, todos os supostos vícios elencados na petição inicial são aparentes ou de fácil constatação, identificáveis quando da entrega das chaves do imóvel à compradora. Neste sentido, caminha a jurisprudência que, em caso de vícios aparentes ou de fácil constatação, como no caso dos autos, o recebimento do imóvel pela compradora, sem qualquer ressalva, afasta a obrigação de indenizar. Confira. “COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. Pretendida indenização a título de danos morais, face a entrega de unidade em desconformidade com a unidade decorada. Alegados vícios apontados que são aparentes. Recebimento do imóvel pelos compradores sem quaisquer ressalvas. Perícia judicial que foi conclusiva em atestar a ausência de qualquer descumprimento contratual ou de norma técnica por parte da ré. Ausente configuração de propaganda enganosa. Ademais, obras executadas de acordo com o memorial descritivo, planta e croqui da unidade dos autores. Indenização afastada. Improcedência da ação. Sentença reformada. RECURSO DA RÉ PROVIDO E NÃO PROVIDO O DOS AUTORES. (TJSP; AC XXXXX-45.2020.8.26.0451 ; Ac. XXXXX; Piracicaba; Décima Câmara de Direito Privado; Rel. Des. Elcio Trujillo ; Julg. 07/02/2024; DJESP 14/02/2024; Pág. 1584)” (grifei) Conforme análise do caso concreto, decorre-se a seguinte conclusão: ao contrário do que argumenta a parte autora, conforme os documentos constantes dos autos, houve aceite do imóvel conforme estava, sem que se apontasse nenhum vício aparente. Assim, não vislumbro a possibilidade de violação do contrato e, por decorrência, a responsabilidade civil do construtor em indenizar a ré por qualquer vício no imóvel, visto que a autora deu seu aceite expresso quanto às condições do mesmo no momento da entrega. No mais, na audiência de saneamento, lavrada às fls. 156-157 dos autos digitalizados, as partes demonstraram desinteresse na produção de provas além das já produzidas, não tendo a parte autora se desincumbido do ônus probatório que lhe é atribuído por força do artigo 373 , I e II do CPC . Do exposto, no pedido d da exordial, isto é, “seja julgada procedente para indenizar a Autora nos valores pecuniários a serem apurados com a desvalorização do imóvel decorrente das falhas a ser apontada através de perícia técnica e avaliativa as quais certamente comprovarão as diferenças de qualidade dos materiais e serviços efetivamente empregados na construção e os que constam no memorial descritivo, além da desvalorização do imóvel, decorrente do baixo padrão de acabamento e falhas da construção”, não houve nenhum comprovação nos autos ou requerimento, por parte da autora, de produção da prova técnica que embasasse o referido pleito, razão pela qual imperiosa a improcedência do mesmo. Quanto ao pedido de indenização por dano moral, por não verificar que o réu ocorreu em qualquer uma das hipóteses do artigo 186 do CC e que tampouco a autora comprovou ter sofrido abalo ou ocorrência de ofensa injusta à dignidade da pessoa humana, não havendo que se falar em dano in re ipsa. Confira. “AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZATÓRIA. PLEITOS DE RETIRADA DA CAIXA SIFONADA DO QUINTAL DO AUTOR, DE REPAROS E COMPOSIÇÃO PELOS DANOS MORAIS DAÍ ADVINDOS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, COM VISTAS A RECONHECER OS DANOS MORAIS EM RAZÃO DA SUPOSTA DESVALORIZAÇÃO DO IMÓVEL. Apelações. Prova técnica produzida por profissional devidamente qualificado para o mister, jamais impugnada a tempo e modo, a concluir pela inexistência das anomalias citadas na inicial, vícios aparentes que deveriam ser notificadas na entrega das chaves, e não o foram, conforme termo de vistoria acostado aos autos. Autor que desde a entrega do imóvel estava ciente da existência da caixa sifonada em seu quintal, de modo que, tal como consignado na sentença. E ora não impugnado pelos recorrentes --, "não há que se falar em falha na prestação dos serviços das construtoras, eis que na data da vistoria a caixa sifonada se encontrava em pleno funcionamento". Danos morais que não resultam in re ipsa, à conta de que a suposta desvalorização do imóvel. Que não se constitui em dano dessa índole --ou mesmo --ou mesmo a decepção do consumidor não justifica, por si só, se o reconhecesse, salvo se demostrada a especial repercussão do fato sobre direito da personalidade da pessoa, que se limita, na dicção do autor, insista-se, à suposta desvalorização do imóvel, a partir de uma afirmado descumprimento contratual que sequer ficara comprovado nos autos, e que não desonra, desmerece, ou produz reflexos no estado de paz pessoal, sobremodo pela circunstância do perfeito funcionamento da caixa sifonada. Redistribuição dos ônus sucumbenciais. Provimento do segundo recurso, prejudicado o do autor. (TJRJ; APL XXXXX-43.2018.8.19.0205 ; Rio de Janeiro; Décima Oitava Câmara Cível; Rel. Des. Mauricio Caldas Lopes ; DORJ 16/09/2021; Pág. 358)” (grifei) Concluindo. Não tendo restado comprovado nos autos nenhum vício de construção alegada pela parte autora na peça de ingresso, em especial pelo fato da mesma ter recebido o imóvel, apondo expressamente seu aceite nos documentos de entrega das chaves, não vislumbro qualquer ato ilícito praticado pelas rés ou, ainda que capazes de lhe imputar responsabilidade objetiva, ensejadores da obrigação indenizatória pretendida na exordial. É como entendo. Isto posto, e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO AUTORAL, com resolução do mérito, na forma do artigo 487 , I , do CPC . CONDENO a parte autora ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios, que fixo em 20% (dez por cento) sobre o valor retificado atribuído a causa, suspendendo sua exigibilidade, na forma do artigo 98 , § 3º , do CPC . Considerando-se que o vigente CPC suprimiu o juízo de admissibilidade na primeira instância, em havendo apelação, independente de novo despacho, intime-se a parte adversa para contrarrazões no prazo legal (art. 1.010 , § 1º do CPC ). Em seguida, com ou sem resposta, encaminhem-se os autos a instância superior, dispensada nova conclusão dos autos. Preclusas as vias recursais, proceda a Secretaria da seguinte forma: Nada sendo requerido, remetam-se os autos a contadoria do Juízo para cálculo das custas remanescentes, intimando-se, após, para pagamento. Havendo pagamento, arquivem-se, com as cautelas de estilo. Não havendo pagamento, inscreva-se em dívida ativa, após arquivem-se com as cautelas de estilo. Por outro lado, havendo pedido de cumprimento de sentença, intime-se desde logo a parte devedora para cumprimento espontâneo da obrigação, na forma do artigo 523 , do CPC . Em caso de não pagamento, fixo desde logo multa de 10% sobre o valor exequendo e honorários advocatícios no mesmo percentual, na forma do artigo 523 , § 1º , do CPC . Publique-se. Registre-se. Intime-se. VITÓRIA-ES, 01 de março de 2024. FERNANDO CARDOSO FREITAS Juiz de Direito