APELAÇÃO CRIMINAL. CRIME DE DISCRIMINAÇÃO OU INTOLERÂNCIA RELIGIOSA. ART. 20 , CAPUT, DA LEI N. 7.716 /89. RECURSO MINISTERIAL. PLEITO PELA CONDENAÇÃO DA ACUSADA ANTE A PRESENÇA DE PROVAS DA AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. NÃO ACOLHIMENTO. CRIME QUE PRESCINDE DA PRESENÇA DE DOLO ESPECÍFICO. CONJUNTO PROBATÓRIO INSUFICIENTE. PROVAS ANGARIADAS EM JUÍZO QUE NÃO REVELAM A INTENÇÃO DA APELADA EM DISCRIMINAR A RELIGIÃO DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DE DEGRADAÇÃO, AGRESSIVIDADE OU HUMILHAÇÃO CONTRA A VÍTIMA OU SUA RELIGIÃO. LIBERDADE RELIGIOSA E LIBERDADE DE EXPRESSÃO. AUSÊNCIA DE TIPICIDADE NA CONDUTA. INTOLERÂNCIA RELIGIOSA. INOCORRÊNCIA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. 1- Busca-se pela presente via a reforma da Sentença absolutória para que seja a ré seja condenada pela prática do crime previsto no art. 20 , caput da Lei 7.716 /89. Levando em consideração que se trata de recurso interposto pelo Ministério Público, a apreciação da insurgência, no que concerne aos lindes da matéria devolvida, está adstrita às arguições vertidas e ao teor do pedido formulado nas razões de fls. 224/228. 2- Colhe-se dos autos que o MM. Juiz a quo absolveu Neide Lopes da Cunha Ribeiro ao considerar que o fato descrito na denúncia é carente de tipicidade. 3-Adstrito aos limites da matéria devolvida, cabe averiguar se a conduta imputada a ré pode, de fato, ser caracterizada como constitutiva do crime de preconceito religioso ou se deve ser mantida a absolvição, nos termos da sentença. 4-A cuidadosa análise dos autos revela que a pretensão acusatória não merece acolhida. Diferentemente do quanto sustentado nas razões recursais, a imersão nos elementos de convicção amealhados evidencia a fragilidade do acervo probatório, o qual não se mostra suficiente para a demonstração concreta e segura da existência do dolo específico exigido para a configuração da prática delitiva de que ora se trata. 5-Com efeito, contata-se que, para além da percepção pessoal da vítima acerca da existência da prática do crime de intolerância religiosa imputado a ré, não remanesce dado objetivo contrastável e isento de dúvida que autorize a condenação nos termos da denúncia. 6-Nota-se das provas orais angariadas em Juízo (depoimentos das testemunhas de acusação, declarações da vítima e interrogatório da acusada) que, em momento algum, a apelada proferiu qualquer palavra contra a religião professada pela vítima, tampouco ofendeu sua crença e/ou rituais. Do que se vê, a Apelada tentou convencer a vítima a professar sua fé Cristã, a convertê-la. Assim, infere-se que a conduta da Apelada nada mais foi do que a de praticar a sua fé, externando uma das características próprias de missionários da sua crença, diferentemente do que ocorre com outras religiões e doutrinas. 7-Não há nos autos qualquer prova de que tenha havido preconceito, ofensa, discriminação ou palavras odiosas contra a religião da vítima (Candomblé), embora não se negue a inconveniência da abordagem insistente realizada pela Apelada. 8-Repise-se que, das provas dos autos, não é possível extrair palavras pejorativas relacionadas a religião da vítima. A conduta da apelada, numa sociedade pluricultural, se insere no cenário da diversidade de religiões e decorrente, especificamente, da liberdade de proselitismo, essencial ao exercício da expressão religiosa da acusada. 9-Nesta perspectiva, seja pelo contexto em que ocorrido o fato (logo após a vítima ter saído de uma reunião no Ministério Público onde o tema era justamente intolerância religiosa), seja pela ausência de elemento subjetivo do tipo, além da desproporcionalidade de imposição de sanção à hipótese em tela, é de ser acolhida a pretensão defensiva. 10- Parecer ministerial pelo conhecimento e não provimento do Apelo. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.