RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA E COMINATÓRIA. ALEGADA COLIDÊNCIA ENTRE A EXPRESSÃO "TECBRIL" (UTILIZADA COMO MARCA E NOME EMPRESARIAL) E AS MARCAS "BOM BRIL", "BOMBRIL", "BRIL" e "BRILL". 1. A pretensão originariamente deduzida na inicial restringia-se ao alegado uso indevido de marca, inexistindo, à época, ato administrativo federal concessivo de registro em favor da sociedade demandada até a data da prolação da sentença (09.12.2003), motivo pelo qual é de rigor o reconhecimento da competência da Justiça estadual no caso, tendo em vista o disposto no artigo 87 do CPC de 1973. 2. A distintividade é condição fundamental para o registro de uma marca, razão pela qual a Lei 9.279 /96 enumera vários sinais não registráveis, tais como aqueles de uso comum, genérico, vulgar ou meramente descritivos, porquanto desprovidos de um mínimo diferenciador que justifique sua apropriação a título exclusivo (artigo 124). As marcas registráveis podem apresentar diversos graus de distintividade. Assim, fala-se em marcas de fantasia, marcas arbitrárias e marcas evocativas (também chamadas de sugestivas ou fracas). 3. Em razão do baixo grau de distintividade da marca evocativa - aquela constituída por expressão que lembra ou sugere finalidade, natureza ou outras características do produto ou serviço desenvolvido pelo titular -, a regra da exclusividade do registro é mitigada e seu titular deverá suportar o ônus da convivência com outras marcas semelhantes, desde que não se constate, por óbvio, a possibilidade de confusão no público consumidor. Precedentes. 4. O exame da existência de confusão ou de associação de marcas deve ter como parâmetro, em regra, a perspectiva do homem médio (homo medius), ou seja, do ser humano razoavelmente atento, informado e perspicaz, o que não afasta avaliação diferenciada a depender do grau de especialização do público-alvo do produto ou do serviço fornecido ( REsp XXXXX/RJ , Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 05.05.2016, DJe 22.06.2016). 5. No caso ora em julgamento, como bem delineado nas instâncias ordinárias, a Bombril Mercosul S/A ajuizou ação em face da Tecbril Indústria Química Ltda., pugnando pela exclusividade do uso das marcas "BOM BRIL", "BOMBRIL", "BRIL" e "BRILL", bem como requerendo fosse a ré obrigada a abster-se do uso da expressão "TECBRIL" - seja como marca, título de estabelecimento ou nome empresarial - e condenada ao pagamento de indenização pelos danos materiais causados em virtude do uso imitativo de marca alheia. 6. No tocante à expressão "BRIL", é certo que consubstancia um radical - morfema que exprime o significado básico da palavra - representativo da ideia de "brilho", característica básica dos produtos de limpeza fornecidos pelas partes em litígio. Desse modo, revela-se evidente que a marca "BRIL" se enquadra na categoria evocativa, por trazer à mente o resultado buscado com a utilização dos produtos a que se vincula. Nada obstante, como dito alhures, para atrair a jurisprudência sobre a mitigação do direito de exclusividade do registro, também se afigura necessário observar se a coexistência dos sinais semelhantes tem o potencial de gerar confusão no público consumidor. 7. De acordo com a BOMBRIL, o fato de ter obtido registros de inúmeras marcas variantes da expressão "BRIL" ("BOM BRIL", "BOMBRIL", "PINHO BRIL", "SANBRIL", "JETBRIL", entre outras), somado à notoriedade decorrente de campanhas publicitárias bem-sucedidas, teve o impacto de introduzir, no imaginário dos consumidores, a ideia de que produtos com o referido termo estão compreendidos em sua família de marcas, evidenciando-se o risco de associação indevida da marca "TECBRIL", de titularidade da ré, que também diz respeito a produtos de limpeza. 8. Contudo, no tocante às marcas evocativas (a exemplo da expressão "BRIL"), a análise da "potencial confusão do público alvo" (sob a perspectiva do homem médio) não pode ficar adstrita aos elementos nominativos confrontados - no caso, "BOMBRIL"/"BOM BRIL"/"BRIL"/"BRILL" versus "TECBRIL" -, revelando-se de fundamental importância o exame da natureza dos produtos e o meio em que o seu consumo é habitual, bem como o trade dress (conjunto-imagem) adjunto à marca, ou seja, a reunião dos elementos capazes de identificá-los e diferenciá-los dos demais, tais como: embalagem, rótulo, impressão visual, cores, formato, configuração do produto, disposição, estilização e tamanho das letras, desenhos, entre outros. 9. Confrontando-se o trade dress das marcas "BRIL" (evocativa) e "TECBRIL", não se constata potencial de confusão dos produtos no mercado de consumo. Com efeito, procedendo-se à rápida busca de fotografias dos produtos das citadas marcas na rede mundial de computadores, verifica-se a evidente distinção entre suas embalagens e a disposição de elementos visualmente perceptíveis, devendo-se, outrossim, destacar que a TECBRIL utiliza como elemento marcário preponderante a expressão "TEC", nomeando os mais variados produtos para veículos automotores como "TEC BRILHO", "TEC COOL", "TEC MOTOR", "TEC PRO", "TEC TINTA" e "TEC FRESH". 10. O mesmo fundamento afasta a alegação de que a marca "TECBRIL" configuraria imitação da marca "BOMBRIL", em desrespeito ao disposto no inciso XIX do artigo 124 da Lei 9.279 /96. Com efeito, tendo em vista todos os elementos sopesados no item antecedente - o trade dress e a incontroversa diferença entre o público consumidor dos produtos: um voltado à limpeza doméstica e outro destinado a cuidados e conservação de veículos automotores -, não há falar, no caso, em marca imitativa apta a gerar potencial dúvida no mercado consumidor ou associação indevida que implique concorrência desleal. 11. Outrossim, na linha de precedentes desta Corte, o fato de a marca "BOM BRIL" ter sido reconhecida, em 23.09.2008, como de alto renome (isto é, protegida em todos os ramos de atividade) não tem o condão de invalidar os registros de marcas depositadas em datas anteriores ao referido reconhecimento administrativo, uma vez flagrante a boa-fé de seus titulares, ressalvada, por óbvio, a hipótese em que evidenciados aproveitamento parasitário, desvio de clientela ou diluição da marca, com a indução dos consumidores em erro, o que nem sequer potencialmente se constata na espécie. 12. Ademais, é certo que o termo "BOM BRIL", com o passar do tempo, obteve maior grau de distintividade, o que, entretanto, não ocorreu com a expressão "BRIL", marca evocativa, que não alcançou a projeção mercadológica da marca líder da autora, a meu ver, inconfundível com o signo "TECBRIL", notadamente tendo em conta o trade dress de cada uma, capaz de diferenciá-los dos congêneres existentes no mercado, assinalando sua origem e sua procedência, sem risco de estabelecer confusão entre os públicos-alvo. 13. Por fim, não se pode olvidar o julgamento exarado na Justiça Federal, em 29.11.2010, declarando a nulidade do ato administrativo que concedera o registro referente à marca nominativa "TECBRIL" e determinando a suspensão de seus efeitos a partir de então, sentença que, em 29.11.2011, foi confirmada pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, cujo acórdão ainda não transitou em julgado em razão da pendência do AREsp XXXXX/RJ . 14. Entretanto, verifica-se a diferença não só dos pedidos, mas também das causas de pedir da referida ação de nulidade de registro e da presente ação de abstenção de uso de marca, não se podendo dizer que o julgamento de um vincule o outro. Uma coisa é reconhecer a existência de vício no ato administrativo federal, declarando-o nulo; outra é atribuir ao réu da ação cominatória uma conduta lesiva contrária à boa-fé objetiva e ensejadora de condenação em perdas e danos. 15. Desse modo, à luz do pedido e da causa de pedir deduzidos na inicial, não se vislumbra o uso indevido da marca "TECBRIL", uma vez não demonstrada, sequer potencialmente, confusão entre os produtos fornecidos e o consequente desvio de clientela, o que justificaria a condenação da ré ao pagamento da indenização por dano material pleiteada pela BOMBRIL. 16. Recurso especial não provido.