I- RECURSO INEC. IMPUGNAÇÃO AOS BENEFÍCIOS DA JUSTIÇA GRATUITA CONCEDIDOS À RECLAMANTE. IMPROVIDO. O critério estabelecido no § 3º do art. 790 (parte obreira perceber salário até 40% do RGPS) é apenas um parâmetro objetivo fixado pelo legislador, porém a legislação não veda que seja deferida a justiça gratuita em outras hipóteses, desde que haja prova da hipossuficiência. E, no caso, a declaração de pobreza, constante nos autos, é considerada meio de prova da hipossuficiência da declarante pessoa física (art. 1º da Lei 7.115 /1983; art. 99 , § 3º , do CPC ; Súmula 463, I, do TST), atendendo à exigência do art. 790 , § 4º , da CLT , com redação dada pela Lei 13.467 /2017. Justiça gratuita mantida. DANO MATERIAL PELA UTILIZAÇÃO DO VEÍCULO. COMBUSTÍVEL E DEPRECIAÇÃO. O postulante não fez prova inequívoca quanto aos gastos com combustível e manutenção de sua moto. Ademais, não fez qualquer prova relacionada ao estado de conservação. Faltam, portanto, parâmetros para as indenizações perseguidas, razão pela qual merece reforma a sentença, para fins de exclusão da condenação pertinente. II- RECURSO DO BNB RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. TERMO DE PARCERIA. APLICABILIDADE DO ENUNCIADO Nº 331 DO TST À ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. DECISÃO DO STF EM RELAÇÃO AO ART. 71, § 1º, DA LEI 8.666/83. A decisão do STF, que considerou constitucional o disposto no art. 71, § 1º, da Lei 8.666/83, não afasta a responsabilidade da Administração Pública, quando esta se omitir na fiscalização do contrato (arts. 58, III e IV, 66 e 67, do mesmo Diploma), causando dano a outrem. Ilicitude que leva à aplicação dos artigos 37, § 6º, da CF/88 e artigos 927 e 186, do C. Civil. CULPA IN VIGILANDO. OMISSÃO FISCALIZATÓRIA. RECONHECIMENTO. ÔNUS DA PROVA. Não comprovando a efetiva fiscalização, reconhecendo a inviabilidade de fiscalizar as empresas prestadoras e/ou não detectando o descumprimento das obrigações pelo contratado, a Administração Pública incide em culpa, sendo passível de responsabilização subsidiária. Ademais, o ônus de comprovar a efetiva fiscalização do contrato compete ao ente público, uma vez que o ordenamento jurídico expressamente lhe atribui esse dever (artigos 58 , III , e 67 , § 1º , da Lei 8.666 /93). Demais disso, exigir que o reclamante procedesse a comprovação da falta de fiscalização do ente público equivaleria a atribuir-lhe a prova de um fato negativo, o que não pode ser tolerado. Inegavelmente, a Administração Pública é quem tem as reais condições de comprovar as medidas que teriam sido adotadas na fiscalização do contrato, daí porque o seu ônus probatório também se justifica pelo Princípio da Aptidão da Prova. Nesse sentido, a jurisprudência majoritária das Turmas do TST. Esclareça-se que a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal, em 26/04/2017, no julgamento do Recurso Extraordinário com Repercussão Geral nº 760931, é exatamente aquela que já havia sido consolidada na ADC 16. O tema "ônus probatório" não foi objeto de deliberação expressa, razão pela qual o aresto em nada muda a forma de pensar deste Relator, no particular, razão pela qual não há subsídios para a reforma da sentença. III- ANÁLISE CONJUNTA JORNADA DE TRABALHO. HORAS EXTRAS. VALIDADE DOS CARTÕES DE PONTO. Nos registros de ponto anexados aos autos, que tratam do período contratual posterior a 16/04/2021 constam horários de entrada e saída variáveis, bem como intervalos intrajornadas, cumprindo, assim, a ré, com o dever legal contido no art. 74 , § 2º , da CLT , bem como na súmula 338 do TST. Os argumentos da parte reclamante e demais provas dos autos não possuem força suficiente para desconstituir referida prova documental. Não se desonerando deste encargo, prevalecem válidos os controles de ponto que demonstram horários variáveis de entrada e saída. HORAS EXTRAS. ATIVIDADE EXTERNA CONTROLE DE JORNADA. INAPLICABILIDADE DO ART. 62 , INC. I , DA CLT . Constatada a possibilidade de fiscalização do trabalho realizado fora do ambiente da empresa, afasta-se a benesse do art. 62 , inc. I , da CLT , competindo ao empregador exercer efetiva monitoração dos horários cumpridos pelo empregado. No caso de que ora se trata, constatou-se que a prestação de serviços do autor esteve cercada de elementos que viabilizariam à ré a possibilidade de acompanhamento do horário de trabalho cumprido pelo promovente, mostrando-se devidas as horas extras. Este julgador, no entanto, sempre tem ponderado que, se se trata de uma presunção, sem qualquer amparo em prova, não é possível simplesmente deferir todas as horas alegadas. Assim, embora não se entenda razoável acatar o pleito do reclamante/recorrente, no sentido de considerar a jornada declinada na exordial, considerando que inexistem parâmetros outros nos autos, a trazer a real jornada cumprida, o tempo estimado pelo juízo mostra-se razoável, razão pela qual não merece reparos a sentença, sob tal aspecto, com exceção do período em que houve a juntada dos cartões de ponto. ADICIONAL DE PERICULOSIDADE. UTILIZAÇÃO DE MOTOCICLETA PARA O EXERCÍCIO DE ATIVIDADES LABORAIS. ANÁLISE CONJUNTA. O art. 193 , § 4º , da CLT estabelece, como fato gerador do pagamento do adicional de periculosidade, o exercício de atividade laboral em motocicleta. A vontade do legislador não foi a de assegurar ao trabalhador o adicional pelo só fato de usar motocicleta em seus deslocamentos, mesmo durante a jornada de trabalho, mas àquele trabalhador em que esse uso seja ínsito à própria atividade, em condições semelhantes às que ocorrem com os motoboys, mototaxistas, moto-frete, motoqueiros-entregadores em geral, em relação aos quais o uso da motocicleta é uma exigência contínua. Ocorre que, do contexto fático probatório dos autos, conclui-se que ao autor não era factível a possibilidade de escolha/substituição do uso de motocicleta por qualquer outro meio de transporte (seja particular ou público), para a execução dos seus serviços profissionais, demandando a utilização permanente de moto. Entende-se devido, portanto, dada as particularidades do caso, o adicional de periculosidade, com amparo no art. 193, § 1º da CLT , devendo-se negar provimento aos recursos das reclamadas, mas prover o do reclamante, para declarar que o cômputo do percentual do adicional de periculosidade deferido incida sobre o salário do autor, compreendendo a parte fixa e a parte variável (comissões). DIFERENÇAS DE COMISSÕES. A prática da primeira reclamada, de fixação, como parâmetro para o pagamento da remuneração variável, do critério da inadimplência dos clientes, sugere a transferência dos riscos do empreendimento para a obreira, a impactar de maneira negativa o alcance das comissões mensais. Reputa-se ilegal tal procedimento - condicionar o pagamento da remuneração variável ao nível de inadimplência dos clientes -, por afronta ao art. 2º da CLT . Todavia, segundo apurado nos autos, a remuneração variável somente não era paga, em caso de inadimplência superior a 5%, razão pela qual, dá-se parcial provimento ao recurso, para que a condenação, no valor arbitrado em sentença e seus reflexos, fique limitada apenas aos eventuais meses em que o valor de remuneração variável esteja zerado. Quanto aos demais meses, persiste a necessidade de pagamento dos reflexos em RSR, desde que tais valores não ultrapassem o fixado em sentença, qual seja, R$ 200,00, em obediência ao princípio da "non reformatio in pejus", já que o recurso é apenas das reclamadas. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS SUCUMBENCIAIS. MAJORAÇÃO DO PERCENTUAL ARBITRADO. Analisando-se os parâmetros constantes nos incisos do art. 791-A da CLT , para fins de definição do percentual a ser arbitrado a título de honorários advocatícios sucumbenciais, verifica-se ser mais consentâneo com o presente processo, o percentual de 15%, haja vista sua complexidade e o fato de estar em grau recursal, com recursos de todas as partes. BENEFICIÁRIO DA JUSTIÇA GRATUITA. CONDENAÇÃO. DECISÃO DO STF. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL. O Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI 5.766 , realizado em 20.10.2021, conforme divulgado na ocasião, declarou a inconstitucionalidade, dentre outros, do § 4º, do art. 791-A da CLT . Considerou que o dispositivo apresentava obstáculos à efetiva aplicação da previsão constitucional de que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos (art. 5º, inc. LXXIV, da Constituição Federal), bem assim vulneraria a garantia constitucional de acesso à justiça, prevista no art. 5º, inc. XXXV, da Carta Magna ("a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito"). Este relator compreendia que a decisão do STF, tal como inicialmente divulgada, veio a consagrar o entendimento de que os arts. 790-B , "caput" e § 4º, e 791-A, § 4º, da CLT , apresentam obstáculos à efetiva aplicação das Normas Constitucionais acima e, como a decisão não consignou qualquer modulação dos seus efeitos - o que seria uma possibilidade, conferida pelo art. 27 da Lei nº 9868 /99 - uma vez nula a disposição legal, é como se jamais tivesse existido no mundo jurídico, razão pela qual tal declaração produziria efeitos "ex tunc". A despeito de tal entendimento inicial, quando da publicação do acórdão, em 03/05/2022, a decisão do STF foi formalizada contendo o que este julgador considera como uma alteração substancial, pois passou a constar a expressão "nos termos do voto do Ministro ALEXANDRE DE MORAES " que não constava da decisão inicialmente divulgada, que apenas referia-se a ser ele o redator do acórdão. Em seu voto, o mencionado Ministro conclui por declarar a inconstitucionalidade somente da expressão "desde que não tenha obtido em juízo, ainda que em outro processo, créditos capazes de suportar a despesa", constante do § 4º do art. 791-A. Após o julgamento de embargos de declaração, cuja decisão transitou em julgado aos 04/08/2022, restou esclarecido que a inconstitucionalidade, realmente, era somente em relação a tal expressão, tal como pedido na petição inicial da ADI 5766 . Recurso das reclamadas parcialmente. IV- RECURSO DO RECLAMANTE INDENIZAÇÃO SUPLEMENTAR PREVISTA NO ART. 404 , PARÁGRAFO ÚNICO , DO CÓDIGO CIVIL . Antes da decisão do STF nas ADC´s 58 e 59, o trabalhador se via diante do seguinte cenário em relação à correção monetária e aos juros de mora de seus créditos laborais: IPCA + juros de 1% ao mês ou TR + juros de 1% ao mês. Comparado a esse contexto anterior, a determinação do STF de aplicação da SELIC a partir do ajuizamento da ação como índice que congloba juros e correção monetária causou severos prejuízos aos trabalhadores, mormente porque a SELIC em diversos períodos tem estado abaixo de 12% ao ano (piso mínimo que o trabalhador percebia anteriormente com a soma da correção monetária e dos juros de mora) desde abril/2017. Ocorre que o art. 404 , parágrafo único , do Código Civil (que estabelece a possibilidade de arbitramento de indenização suplementar ao credor no caso de os juros de mora não cobrirem os prejuízos experimentados), exige a prova de um prejuízo concreto, e não de um prejuízo abstrato lastreado na injustiça da nova taxa de juros aplicada decorrente de uma decisão do STF. Ademais, apesar de o art. 404 , parágrafo único , do Código Civil , também não ter sido levado em conta no julgamento das ADC´s 58 e 59 e mesmo considerando que o STF realizou uma "analogia" do crédito trabalhista com o cível, fato é que não parece esperado, dentro da linha adotada pela Suprema Corte, que a indenização suplementar prevista no mencionado dispositivo pudesse genericamente ser utilizada com o intuito de praticamente tornar sem efeito os parâmetros, ainda que possam ser reputados equivocados, definidos pelo STF. Assim, à falta de uma demonstração concreta de prejuízos ocasionados ao reclamante derivados da aplicação da taxa SELIC, reputa-se inviável, na presente demanda, o arbitramento da indenização suplementar prevista no art. 404 , parágrafo único , do CC. Recurso do reclamante conhecido e parcialmente provido. Recurso do INEC conhecido e parcialmente provido. Recurso do BNB conhecido e parcialmente provido.