APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO DO CONSUMIDOR. TRANSPORTE AÉREO. CANCELAMENTO DE VOO. AUSÊNCIA DE DEVOLUÇÃO INTEGRAL DA QUANTIA PAGA. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Cuida-se de ação indenizatória por dano material e moral, objetivando a autora compensação pelos danos suportados, haja vista ter adquirido passagens aéreas através da empresa ré 123 Viagens e Turismo Ltda com destino a Salvador/BA com previsão de ida em 15/05/2020 e volta no dia 26/06/2020 do aeroporto de Salvador, pagas através de seu cartão de crédito no valor total de R$ 714,13, canceladas devido ao avanço da pandemia da COVID-19 e o fechamento de aeroportos, fronteiras e o consequente cancelamento de voos no Brasil e no mundo, tendo sido editada a MP nº 925 /2020 sobre as medidas emergenciais para cancelamento e reembolso de passagens aéreas. 2. A sentença julgou procedentes os pedidos, contra a qual se insurge a demandada. 3. A hipótese versada dos autos envolve relação de consumo a ser regida pelo Código de Defesa do Consumidor , vez que a demandante é destinatária final de serviço de transporte aéreo, enquadrando-se no conceito de consumidora descrito no art. 2º do CDC , e a demandada prestadora de serviços, nos termos do art. 3º do mesmo diploma legal. 4. O referido diploma legal, em seu art. 14, § 3º, inciso II, prevê a responsabilidade objetiva dos fornecedores e prestadores de serviço, independentemente da comprovação da culpa, somente afastada a responsabilidade quando comprovada a culpa exclusiva do ofendido ou de terceiro. 5. Outrossim, pela teoria do risco do empreendimento, aquele que se dispõe a fornecer bens e serviços tem o dever de responder pelos fatos e vícios resultantes dos seus negócios, independentemente de sua culpa, pois a responsabilidade decorre do simples fato de alguém se dispor a realizar atividade de produzir, distribuir e comercializar ou executar determinados serviços. 6. Empresa apelante que integra a cadeia de consumo, sendo indiferente para configuração da legitimidade o fato de figurar como intermediadora entre a parte consumidora e a companhia aérea prestadora do serviço, devendo, pois, responder pelos danos provocados, na forma dos arts. 7º , parágrafo único , 18 , caput, e 25 , § 1º , todos do CDC . Preliminar rejeitada. 7. Dos autos, restou incontroverso o cancelamento do voo em razão da pandemia de COVID-19 e a ausência de restituição integral do valor das passagens à parte autora. 8. A Lei nº 14.034 /2020, que dispõe sobre medidas para a aviação civil em razão da pandemia, prevê em seu art. 3º que "o reembolso do valor da passagem aérea devido ao consumidor por cancelamento de voo no período compreendido entre 19 de março de 2020 e 31 de dezembro de 2020 será realizado pelo transportador no prazo de 12 (doze) meses, contado da data do voo cancelado, observadas a atualização monetária calculada com base no INPC e, quando cabível, a prestação de assistência material, nos termos da regulamentação vigente". 9. Na hipótese, a parte autora procurou pela via administrativa ser reembolsada pelo valor das passagens, contudo permaneceu "em análise" pela empresa ré por tempo excessivo, sem efetivação integral do reembolso, precisando a consumidora buscar auxílio no Poder Judiciário para a garantia de seu direito. 10. Ademais, havendo cancelamento do voo no período estipulado pela legislação aplicável supracitada, aplicável ao presente caso, a escolha pela devolução dos valores ou pela conversão em créditos cabe ao consumidor, sendo certo que caso opte pela primeira alternativa, o consumidor terá que aguardar 12 meses a contar do cancelamento da passagem. 11. Dessarte, tendo o cancelamento ocorrido, estando as passagens aéreas emitidas dentro do período inserido pela Lei nº 14.034 /2020, e ultrapassado o período de 12 meses a contar do cancelamento sem o efetivo reembolso integral à autora/consumidora, resta caracterizada a conduta ilícita da empresa ré, ora apelante, e a retenção indevida do valor dispendido pela autora para a aquisição dos bilhetes aéreos. 12. Conduta narrada nos autos que indica descaso com a consumidora/autora, ultrapassando o mero aborrecimento na vida cotidiana, levando à perda de tempo útil da consumidora. Afinal, empreendeu tempo e energia na tentativa de solucionar amigavelmente um problema de responsabilidade dos prestadores de serviços, para no final constatar que somente alcançaria uma solução pela via judicial. 13. Dano moral caracterizado. Quantia fixada pela magistrada a quo a título de compensação pelos danos morais suportados pela autora na quantia de R$ 3.500,00 que se reputa adequada e em consonância com os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, afigurando-se em alinho com outros precedentes desta eg. Corte Estadual. 14. Recurso desprovido.