TJ-CE - Apelação Criminal: APR XXXXX20198060128 Fortaleza
APELAÇÃO CRIMINAL. PENAL E PROCESSO PENAL. TRÁFICO DE DROGAS E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA ARMADA. PEDIDO DE ABSOLVIÇÃO DO CRIME DE ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA POR INSUFICIÊNCIA DE PROVAS. AUTORIA E MATERIALIDADE DO DELITO SUFICIENTEMENTE ENFEIXADA NOS AUTOS. CONDENAÇÃO MANTIDA. ANÁLISE DOSIMÉTRICA ESCORREITA. OCORRÊNCIA DE CIRCUNSTÂNCIAS JUDICIAIS DESFAVORÁVEIS AO RÉU A ESTEAR A EXASPERAÇÃO DAS PENAS-BASES. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. MAJORANTE DO CRIME CONFORTADA NO COMPÓSITO DE PROVAS. RESPEITADOS OS CRITÉRIO LEGAIS DE APLICAÇÃO DE PENA E A PROPORCIONALIDADE. DECRETO CONDENATÓRIO IRREPROCHÁVEL. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1 - Os elementos de convicção acumulado desde as investigações policiais são coerentes e uniformes, o que permite validar com a certeza necessária a condenação imposta ao apelante pelo crime tipificado no artigo 2º , § 2º , Lei 12.850 /2013 (organização criminosa armada). 2 - O recorrente não trouxe nenhum indício capaz invalidar as provas ajoujadas aos autos, cingindo-se a negar o crime ao argumento de que teria abandonado a organização criminosa. Contudo a alegação autodefensiva se revela extremamente frágil, especialmente diante das mensagens extraídas do aparelho celular apreendido por ele escritas naquele fatídico dia prisão em flagrante das corrés Maria Pauliana Bernardo e Ana Paula da Silva. 3 - Importante salientar que, ao reconhecimento da majorante (§ 2º), exige-se tão somente averiguar se a organização criminosa, coletivamente mensurada, faz uso de artefato bélico, sendo mesmo prescindível o arbítrio individual do integrante, uma vez que prevalece a vontade da organização sobre o ânimo pessoal de seus membros. 4 - Não há vinculação a critérios puramente matemáticos no cálculo da pena, como por exemplo, os de 1/8 (um oitavo) ou 1/6 (um sexto) por vezes sugeridos pela doutrina, mas aos princípios da individualização da pena, da proporcionalidade, do dever de motivação das decisões judiciais e da isonomia. Esses paradigmas exigem que o Julgador, a fim de balizar os limites de sua discricionariedade, opere um juízo de correlação lógica entre: a) o número de circunstâncias judiciais concretamente avaliadas como negativas; b) o intervalo de pena abstratamente previsto para o crime; e c) o quantum de pena que costuma ser aplicado pela jurisprudência em casos parecidos. (STJ - AgRg na RvCr: 5727 SP XXXXX/XXXXX-5, Data de Julgamento: 14/09/2022, S3 - TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 28/09/2022). Em vista disso, não cabe rever pena fixada em parâmetros legais, razoáveis e adequados na sentença de primeiro grau, substituindo a discricionariedade do juiz pela do Tribunal. 5 - Na hipótese aferi-se que estabelecidas penas-bases em 05 (cinco) anos e 06 (seis) meses de reclusão e ao pagamento de 100 (cem) dias-multa, pela prática do crime tipificado no art. 2º , § 2º , da Lei de Organizacoes Criminosas , em face da negativação dos vetores da culpabilidade do agente, circunstâncias e consequências do crime. E a mais, 06 (seis) anos e 08 (oito) meses de reclusão e em 666 (seiscentos e sessenta e seis) dias-multa, pela infração ao art. 33 da Lei 11.343 /06, em virtude do desvalor do modelador circunstâncias do crime. 6 - No vetor culpabilidade do agente, relativamente ao crime de organização criminosa, o magistrado demonstrou com fundamentos idôneos que a gravidade excedeu a normal do tipo penal, posto que a organização criminosa Guardiões do Estado (GDE) é, de fato, uma das maiores do estado do Ceará e vem crescendo se alastrando por todo território nacional. Apenas no Ceará, conta com mais de 9 (nove) mil integrantes que exercem domínio sobre um grande número de bairros e dedicam-se, principalmente, a crimes hediondos e a eles equiparados, especialmente homicídios e tráfico de drogas. 7 - Desse modo, não há ilegalidade na negativação do vetor de circunstâncias do crime relativamente ao crime de organização criminosa, pois, conforme bem demonstrado pelo magistrado, no que diz respeito ao modus operandi da facção Guardiões do Estado, destacando especialmente a estruturação da facção em comento que difere de outras de menor magnitude e influência territorial, que constantemente utiliza de violência contra os moradores das regiões por eles dominadas, gerando medo naqueles que não se submetem às regras impostas, o descumprimento das diretrizes da facção deflagra graves consequências, dentre elas, a expulsão de famílias inteiras de suas casas e até a morte destas pessoas. Ademais, devido a dimensão nacional da organização criminosa em comento goza de acesso às armas mais sofisticadas que são utilizadas como forma de ostentação para coagir comunidades inteiras e o próprio Estado. 8 - Quanto a negativação do vetor consequências do crime, o juiz sentenciante mencionou que a expansão da facção GDE é responsável direta no aumento da violência e criminalidade no município de Morada Nova, representando grave ofensividade social. 9 - É importante ressaltar que tais fundamentações não dizem respeito a qualquer organização criminosa, tratam-se, especificamente, de uma das maiores organizações do país, com ramificações em outros estados brasileiros. Portanto, os integrantes devem ser responsabilizados como um todo, posto que todos agem em nome da facção, contribuindo e concordando com todos os atos por ela praticados e ajudando, desse modo, no agravamento da criminalidade em território nacional. 10 - No que diz respeito ao crime de tráfico de drogas (art. 33 , Lei 11.343 /06), é notório que a quantidade e a natureza das drogas são circunstâncias preponderantes na fixação da pena-base, como prevê expressamente o art. 42 da Lei 11.343 /2006. No caso dos autos, a exasperação da basilar encontra justificação factual plausível no elevado poder de causar dependência e prejuízo à saúde de seus usuários a substância afeita ao caso concreto (crack), circunstância preponderante adversa competente ao recrudescimento da pena-base acima do patamar mínimo previsto em lei. 11 - Na espécie, considerados o intervalo entre as penas mínima e máxima abstratamente cominadas aos crimes praticados, infiro devidamente fundamentada e proporcional a exasperação operadas às basilares na sentença a quo, não dissonado do que recomendado pela jurisprudência pátria. 12 - Na segunda etapa de cálculo, sem agravantes, reconhecida a incidência da circunstância atenuante da confissão espontânea (art. 65 , III , d , CP ), reduzindo às penas em 1/6 (um sexto), fração amplamente recomendada na jurisprudência dominante, ajustando a pena intermediária do crime de organização criminosa para 04 (quatro) anos e 07 (sete) meses de reclusão e 83 (oitenta e três) dias-multa e do crime de tráfico para 05 (cinco) anos, 06 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão e 555 (quinhentos e cinquenta e cinco) dias-multa (tráfico de drogas). 13 - Convertida em definitiva à pena do crime de tráfico de drogas no quanto acima indicado pela ausência de causas de aumento e diminuição, não havendo falar em aplicação do redutor especial de pena ínsita no § 4º do art. 33 da lei de regência, uma vez que comprovada a participação do apelante em organização criminosa. 14 - De outra sorte, relativamente ao crime de organização criminosa, corretamente aplicada a causa especial de aumento de pena, prevista no § 2º do art. 2º da Lei de Organizacoes Criminosas , justificando a exacerbação no patamar de 1/2 (metade) no imensurável arsenal bélico da facção, espalhado em poder de seus integrantes, além da conhecida utilização de armamento pesado como metralhadoras e fuzis, perfazendo, em definitivo, a pena de 06 (seis) anos, 10 (dez) meses e 15 (quinze) dias de reclusão e o pagamento de 124 (cento e vinte e quatro) dias-multa. 15 - Destarte, a dosimetria da pena ora apreciada não carece de reparo, visto que atendeu amplamente às imposições legais pertinentes, especialmente aos primados da razoabilidade e da proporcionalidade, não se evidenciando violação ao princípio da motivação das decisões judiciais (art. 93 , IX , da Constituição Federal ) nem às disposições dos arts. 59 e 68 do Código Penal . 16 - Desse modo, fica mantida a reprimenda totalizada em 12 (doze) anos, 05 (cinco) meses e 05 (cinco) dias de reclusão e o pagamento de 679 (seiscentos e setenta e nove) dias-multa à proporção de 1/30 do salário-mínimo vigente à época dos fatos, a ser cumprida em regime inicial fechado (art. 33 , § 2º , a, do Código Penal ). 17 - Recurso conhecido e desprovido. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos estes autos, acorda a 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer e negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto da eminente relatora. Fortaleza, . DESEMBARGADORA LÍGIA ANDRADE DE ALENCAR MAGALHÃES Relatora