PROCESSO Nº: XXXXX-71.2019.4.05.8100 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: FRANCISCO JOSE PEREIRA DA SILVA REPRESENTANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO APELADO: INSTITUTO BRAS DO MEIO AMBIEN E DOS REC NAT RENOVAVEIS - IBAMA RELATOR (A): Desembargador (a) Federal Cid Marconi Gurgel de Souza - 3ª Turma MAGISTRADO CONVOCADO: Desembargador (a) Federal Leonardo Augusto Nunes Coutinho JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1º GRAU): Juiz (a) Federal Jose Vidal Silva Neto EMENTA ADMINISTRATIVO. AVE SILVESTRE. MANUTENÇÃO EM CATIVEIRO SEM AUTORIZAÇÃO DO IBAMA. AUTO DE INFRAÇÃO. MULTA SIMPLES. ANIMAL QUE NÃO CONSTA NA LISTA DE AMEAÇADOS DE EXTINÇÃO. SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE ECONÔMICA DO AUTOR. PRIMARIEDADE NA PRÁTICA DE INFRAÇÃO AMBIENTAL. APLICAÇÃO DO DISPOSTO NO ART. 24 , § 4º, DO DECRETO 6518 /08. ANULAÇÃO DA MULTA IMPOSTA. 1. Apelação interposta pelo Autor em face de sentença que julgou improcedentes os pedidos, quais sejam, o de anulação do Auto de Infração nº 9047889, e ou, subsidiariamente, a redução da multa aplicada ou, ainda, a conversão da multa em serviços de preservação, melhoria e recuperação da qualidade do meio ambiente. O Autor ainda foi condenado no pagamento de honorários sucumbenciais fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa, observado, no entanto, o disposto no art. 98 , § 3º , do CPC . 2. Resta evidente, ao compulsar os autos, que a pena de multa simples, no patamar de R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), fixada ao Autor, é desarrazoada e desproporcional, além de não ter sido fixada dentro dos parâmetros legais, o que legitima a atuação do Poder Judiciário. O Autor foi autuado com base nos seguintes dispositivos legais: arts. 70 , § 1º , 72 , II e IV , da Lei n. 9.605 /98; arts. 3º , II e IV e 24 , I e II e § 3º , III , do Decreto 6.514 /08. 3. De acordo com o art. 24 , II , c/c o § 3º , III , do Decreto 6.514 /08, a multa é estabelecida em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) "por indivíduo de espécie constante de listas oficiais de fauna brasileira ameaçada de extinção, inclusive da Convenção de Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção - CITES" para quem guarda ou tem em cativeiro espécime da fauna silvestre sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade ambiental competente. Ocorre que os animais que o Demandante mantinha em sua residência (Periquito da Caatinga - Aratinga Cactorum; Tuim - Forpus Xanthopterygius e Golinho - Sporophila Albogularis), apesar de serem da fauna silvestre e de não haver licença ou autorização para tal, não se enquadram como "em extinção", pois não estão elencados no Apêndice I, da listagem da CITES (Convention on International e Trade in Endangered Species of Wild Fauna and Flora), que listou as espécimes ameaças de extinção, mas sim no Apêndice II, que elencou as espécies que não estão necessariamente ameaçadas de extinção, mas que podem se tornar (https://cites.org/esp/node/21738 e https://cites.org/eng/node/19713). O próprio IBAMA reconheceu esse fato na decisão administrativa em Primeira Instância. No entanto, mesmo enquadrando tais aves no Apêndice II da lista da CITES, aplicou a multa direcionada aos animais ameaçados de extinção (Apêndice I). 4. A multa não poderia ter sido fixada com base no inciso II, do art. 24, mas sim com esteio no inciso I, do mesmo dispositivo legal, que prevê multa de R$ 500,00 (quinhentos reais) por indivíduo de espécie não constante de listas oficiais de risco ou ameaça de extinção. Mesmo o montante de R$ 5.500,00 (cinco mil e quinhentos reais), ao qual a autoridade administrativa chegou após a redução do valor inicialmente imposto (R$ 26.000,00 - vinte e seis mil reais), é excessivo e ilegal diante da condição das aves apreendidas de, apesar de poderem se tornar, ainda não estão ameaçadas de extinção. 5. Se tal não bastasse, o art. 6º , da Lei nº 9.605 /98 estabeleceu os critérios a serem observados pela autoridade competente para a imposição e gradação da penalidade. São eles: "I - a gravidade do fato, tendo em vista os motivos da infração e suas conseqüências para a saúde pública e para o meio ambiente; II - os antecedentes do infrator quanto ao cumprimento da legislação de interesse ambiental; III - a situação econômica do infrator, no caso de multa". Por sua vez, o art. 24 , § 4º , do Decreto nº 6.514 /08 previu a seguinte hipótese: "§ 4o No caso de guarda doméstica de espécime silvestre não considerada ameaçada de extinção, pode a autoridade competente, considerando as circunstâncias, deixar de aplicar a multa, em analogia ao disposto no § 2o do art. 29 da Lei no 9.605 , de 1998." 6. No caso em comento, há provas suficientes da situação de vulnerabilidade econômica do Demandante. O Laudo Social elaborado por Assistente Social da DPU demonstra não só a hipossuficiência do Autor e de sua família como também o histórico de trabalho em atividades de baixa remuneração, sem exigência de qualificação técnica, além do fato de não ser alfabetizado e de estar acometido de enfermidades que dificultam seu retorno ao mercado de trabalho. A composição da renda familiar está restrita ao valor da bolsa família recebido pela esposa do Requerente, que corresponde a R$ 81,00 (oitenta e um reais). Também não foi provada a finalidade comercial na guarda dos animais nem há indícios de maus tratos, bem como restou devidamente reconhecida pela Administração a primariedade do autuado em relação ao cometimento de infrações ambientais. 7. Considerando que a multa arbitrada pela autoridade administrativa está em dissonância com infração ambiental praticada, bem como a situação de vulnerabilidade econômica do Autor, além de inexistir prova do fim comercial das aves ou de maus tratos, deve ser a ele aplicado o disposto no art. art. 24 , § 4º , do Decreto nº 6.514 /08. 8. Apelação provida para anular a multa imputada ao Autor por meio do Auto de Infração em comento. Inversão do ônus da sucumbência. ff