PROCESSO CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÕES E REMESSA OFICIAL. AÇÃO DE RITO ORDINÁRIO. PESQUISA E DESENVOLVIMENTO DE INOVAÇÃO TECNOLÓGICOS (P&D). INCENTIVO FISCAL PREVISTO NO ART. 19 DA LEI Nº 11.196 /2005. VEDAÇÃO AO APROVEITAMENTO DO INCENTIVO FISCAL PELO § 9º DO ART. 4º DA IN/RFB Nº 1.187/2011. DISPÊNDIOS COM P&D. CONTRATADO OU SOB ENCOMENDA À OUTRA PESSOA JURÍDICA. RESTRIÇÃO ILEGAL E INCONSTITUCIONAL. I. A sentença recorrida foi proferida e publicada na vigência do CPC/73 e, assim, devem ser observados os requisitos de admissibilidade no revogado Codex, bem como o entendimento jurisprudencial sobre estes. Enunciado Administrativo nº 2 do C. STJ. II. Discute-se nesta demanda a vedação prevista no § 9º do art. 4º da IN/RFB nº 1.187/2011 quanto ao aproveitamento do incentivo fiscal previsto no art. 19 da Lei nº 11.196 /2005, no que se refere à dedução das importâncias empregadas ou transferidas a outra pessoa jurídica para a realização de pesquisa e desenvolvimento de inovação tecnológicos (P&D), sob encomenda ou contratada. III. O incentivo fiscal previsto no art. 19 da Lei nº 11.196 /2005 se traduz na exclusão pela pessoa jurídica do lucro líquido, a partir do ano-calendário de 2006, na determinação do lucro real (base de cálculo do IRPJ) e da base de cálculo da CSLL, do valor correspondente a até 60% da soma dos dispêndios realizados no período de apuração com pesquisa tecnológica e desenvolvimento de inovação tecnológica, classificáveis como despesa pela legislação do IRPJ, na forma do inc. I do caput do art. 17 da Lei nº 11.196 /2005. IV. Numa interpretação teleológica, infere-se que o art. 19 da Lei nº 11.196 /2005 prevê duas hipóteses de aproveitamento do incentivo fiscal relativas às importâncias dispendidas pela pessoa jurídica com P&D: (a) a primeira referente aos dispêndios classificáveis como despesas operacionais pela legislação do IRPJ - inc. I do art. 17 ; e (b) a segunda cuida especificamente dos dispêndios oriundos da contratação de universidade, instituição de pesquisa ou inventor independente para a consecução das atividades de P&D, exigindo que o contratante fique com a responsabilidade, o risco empresarial, a gestão e o controle da utilização dos resultados de tais dispêndios - § 2º do art. 17. Por sua vez, o art. 18 da Lei nº 11.196 /2005 estabelece uma terceira hipótese de incentivo fiscal, a qual é destinada aos valores transferidos às microempresas e empresas de pequeno porte para a execução de atividade de P&D. V. Não se extrai da Lei nº 11.196 /2005 qualquer vedação ao aproveitamento do incentivo previsto no seu art. 19 quanto aos valores pagos à outra pessoa jurídica contratada ou "terceirizada" para a consecução das atividades de P&D. Deveras, o que se verifica é a existência de tratamento específico quanto à contratação de universidade, instituição de pesquisa ou inventor independente para a consecução de atividades de P&D (§ 2º do art. 17) e, ainda, referente às importâncias transferidas às microempresas ou empresas de pequeno porte para o mesmo fim (art. 18). Ademais, temos que a própria Lei nº 11.196 /2005 dispõe expressamente no art. 22 , II , sobre a possibilidade de contratação de terceiros para a execução das atividades de P&D, exigindo apenas que a pessoa jurídica contratada seja residente ou domiciliada no país. VI. A IN/RFB nº 1.197/2011 ao estabelecer no § 9º do art. 4º a vedação ao uso do incentivo fiscal previsto no art. 19 da Lei nº 11.196 /2005 quanto às importâncias empregadas ou transferidas a outra pessoa jurídica sob encomenda ou contratadas, sem que houvesse previsão em lei, acabou por desbordar dos seus limites, inovando no mundo jurídico, revelando-se, assim, distanciada de sua função regulamentadora, em flagrante ofensa ao princípio da legalidade (arts. 150, I, da CF e 97, II e § 1º do CTN ). A violação ao princípio da legalidade se revela ainda à luz do § 6º do art. 150 da CF. VI. A Instrução Normativa em voga afronta também o art. 111 do CTN , diante da interpretação extensiva dada pela Receita Federal do Brasil à Lei nº 11.196 /2006, ao criar vedação inexistente na lei. Nesse sentido, o C. STJ, no julgamento do REsp nº 1.116.620/BA, sob a sistemática dos recursos repetitivos, firmou entendimento pela impossibilidade de interpretação das normas de isenção de forma analógica ou extensiva, sendo descabido ampliar ou restringir o benefício à situação que não se enquadre no texto expresso da lei, nos termos do inc. II do art. 111 do CTN . Além disso, incidiu também em afronta ao art. 146 do CTN , quando alterou critério do Fisco na interpretação da Lei nº 11.196 /2005, assim como ao próprio art. 19 da Lei nº 11.196 /2005 e ao Dec. nº 5.798 /2006 (regulamentador). VII. A autora "Natura Cosméticos", cuja atividade principal é a comercialização de produtos cosméticos e de higiene pessoal, atende o requisito legal para a fruição do incentivo do art. 19 da Lei nº 11.196 /2005, qual seja, que os dispêndios com P&D sejam classificáveis como despesas operacionais pela legislação do IRPJ (atividades necessárias da empresa - art. 47 , §§ 1º e 2º , da Lei nº 4.506 /1964, reproduzido no art. 299 do RIR/99), além de que a caracterização de despesas com P&D como operacionais é presumida por lei (art. 53 da Lei nº 4.506 /64, reproduzido no art. 53 do RIR/99). Atende ainda aos demais requisitos formais e procedimentais, consubstanciados na comprovação da regularidade fiscal (arts. 23 da Lei nº 11.196 /2006 e 12 do Dec. nº 5.798 /2006) e na prestação de informações ao Ministério da Ciência e Tecnologia sobre os programas de P&D (arts. 17 , § 7º , da Lei nº 11.196 /2005 e 14 do Dec. nº 5.798 /2006) e, ainda, comprovou os dispêndios realizados com P&D e a gestão e controle de tais atividades. VIII. É medida de rigor reformar a r. sentença e julgar procedente o pedido principal, a fim de afastar o § 9º do artigo 4º da IN/RFB de nº 1.187 /2006, reconhecendo à autora "Natura Cosméticos" o direito ao incentivo fiscal previsto no artigo 19 da Lei nº 11.196 /2006 no tocante às importâncias pagas à litisconsorte "Natura Inovação" para a execução de atividades de P&D. VII. Afastada a sucumbência recíproca, com a condenação da União Federal ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios, arbitrados em 5% do valor atualizado da causa da causa na forma da Res. CJF nº 143/2010, considerados os parâmetros de grau de zelo do profissional, lugar da prestação do serviço, natureza e importância da causa e tempo exigido, assim como os princípios da equidade, proporcionalidade e razoabilidade (art. 20 , §§ 3º e 4º , do CPC/1973 ), mostrando-se razoável o percentual fixado, em razão do valor atribuído à causa de R$ 1.285.000,00 (maio/2012), o que não se afigura excessivo e tampouco irrisório. VIII. Apelação da União Federal e remessa oficial desprovidas. Apelação das autoras provida.