APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO MÉDICO-HOSPITALAR. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MÉDICO CODEMANDADO CONFIGURADA. Conforme entendimento firmado pela maioria, é parte legítima o servidor público para responder à lide fundada na responsabilidade civil do Estado (art. 37 , § 6º , CF ), cabendo ao lesado a avaliação quanto ao ajuizamento, ou não, da demanda em face do facultativo, sobretudo quando o médico responde ao pedido e produz provas no decorrer do feito. CAUSA PETENDI. COMPREENSÃO À LUZ DA INSTRUMENTALIDADE DO PROCESSO. PRESTAÇÃO JURISDICIONAL JUSTA E EFETIVA. FORMALISMO PROCESSUAL QUE CEDE ESPAÇO AO DIREITO MATERIAL. Considerando o caráter instrumental do processo, não se verifica óbice para o exame do pedido tomando como causa efetiva a paralisia cerebral mista contraída durante a permanência do autor na UTI Neonatal (núcleo da causa de pedir), independentemente da circunstância técnica indicada pelo autor na inicial que atribuiu o evento ao equivocado procedimento do corpo clínico (utilização de medicamento que teria causado crise respiratória e parada cardiáca). Isso porque os demandados se defenderam do fato principal ou essencial, no caso a paralisia cerebral contraída enquanto internado no hospital demandado, ainda que derivada de outra circunstância, ou seja, a infecção adquirida em ambiente de unidade de tratamento intensiva, elemento de prova, aliás, trazido pelos próprios... réus. Ademais, houve ampla abordagem da questão na perícia médica realizada e na prova oral produzida, bem como na própria sentença recorrida. Circunstâncias que afastam qualquer alegação de ofensa a princípios da ampla defesa e do contraditório. ERRO MÉDICO E FALHA DE ENFERMAGEM ALEGADOS NA INICIAL QUE NÃO RESTARAM EVIDENCIADOS NOS AUTOS. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA MANTIDA EM RELAÇÃO AO MÉDICO CODEMANDADO. Restou comprovado, por meio da prova pericial e testemunhal produzida, que não houve erro de procedimento em qualquer das atividades desenvolvida pelo médico ou pelo corpo de enfermagem que originasse a doença que acometeu o demandante, especialmente quanto à medicação prescrita que obedeceu rigorosamente aos preceitos da ciência médica, notadamente o tipo de medicação adequada ao quadro de saúde do paciente e sua maneira de aplicação. DANO NEUROLÓGICO AO RECÉM-NASCIDO. PARALISIA CEREBRAL DECORRENTE DE BACTEREMIA CONTRAÍDA EM UTI-NEONATAL. NEXO CAUSAL CARACTERIZADO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS. PENSIONAMENTO. O conjunto probatório dos autos revelou que houve um quadro de bacteriemia no autor durante o seu tratamento em Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal. A contaminação do menor emanou do cateter utilizado no recém-nascido, cujo exame de cultura apontou presença de staphylococcus epidermidis na ponta do material usado pelos funcionários do hospital. Foi evidenciado também que o vetor da doença q... nosocomial, tendo como característica hospedagem em elemento utilizado no tratamento endovenoso - cateter - exatamente aquele em que foi localizada a bactéria que infectou o autor e lhe causou paralisia cerebral. Responsabilidade do nosocômio que decorre do defeito na manutenção, conservação e higienização do material utilizado durante a prestação do serviço de saúde, bem como ao dever de informação aos familiares do paciente. Os danos morais, in casu, são evidentes e decorrem das próprias sequelas de ordem física e mental irreversíveis e também da situação de dependência perante terceiros que o demandante terá que se submeter por toda sua vida devido à falha do serviço hospitalar, sendo, portanto, presumíveis. Valor da condenação fixado em R$ 100.000,00, de acordo com as peculiaridades do caso concreto, bem como observados os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, além da natureza jurídica da condenação e dos parâmetros adotados por esta Corte em casos semelhantes ao dos autos. Pensionamento mensal e vitalício devido ao autor em decorrência do seu grau de incapacidade ao exercício laboral. Constituição de capital substituída pela inclusão do autor na folha de pagamento da ré. Art. art. 475-Q , § 2º , do CPC/1973 , atual art. 533, § 2º, do CPC2015. DANOS MATERIAIS. NÃO COMPROVAÇÃO. Os danos materiais devem ser comprovados, sendo que a prova incumbia à parte autora nos termos do art. 333 , I , do CPC/1973 . Caso em que o... demandante sempre ocorreu por meio do Sistema Único de Saúde, não havendo, nos autos, qualquer adminículo probatório de dispêndio econômico pela vítima, de sorte que inviável o ressarcimento pretendido, a título de dano emergente. ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA GRATUITA AO HOSPITAL DEMANDADO. PESSOA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. O deferimento do benefício da assistência gratuita à pessoa jurídica é admissível em casos excepcionalíssimos. Hipótese dos autos em que a pessoa jurídica exerce atividade sem fins lucrativos e dirigido à prestação de saúde às pessoas carentes cuja condição autoriza o deferimento do beneplácito perseguido. Precedentes jurisprudenciais do STJ e do TJRS. POR MAIORIA, AFASTARAM A PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA SUSCITADA DE OFÍCIO EM VOTO DIVERGENTE, VENCIDOS OS DESEMBARGADORES TASSO CAUBI SOARES DELABARY E CARLOS EDUARDO RICHINITTI. NO MÉRITO, POR MAIORIA, PROVERAM PARCIALMENTE O RECURSO PARA JULGAR PROCEDENTE O PEDIDO, VENCIDO O DESEMBARGADOR RELATOR. ( Apelação Cível Nº 70067766535, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Julgado em 29/06/2016).