APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE DIREITO DE RESPOSTA. CABIMENTO. ABUSO NO EXERCÍCIO DA LIBERDADE DE EXPRESSÃO CARACTERIZADO. RECURSO PROVIDO. 1. Cuida-se de ação de Direito de Resposta proposta pela SINDPOL-RJ, entidade de classe sindical dos policiais civis ativos e inativos do Estado do Rio de Janeiro, proposta em face de Editora Três LTDA, em decorrência de matéria jornalística publicada na edição nº 2576, de 10.05.2019, da revista ISTOÉ, sob o título ¿Os Snipers Criminosos de Witzel¿. 2. Afirma o Autor que lhe deve ser concedido o direito de resposta, porquanto a matéria divulgada teve conteúdo calunioso, tendencioso e ofensivo aos Policiais Civis do Rio de Janeiro, imputando aos mesmos o cometimento de crimes de homicídio e extermínio ao esquadrão de elite da polícia civil, sem a prévia comprovação dos fatos por sentença criminal transitada em julgado, além de possuir conteúdo inverídico, maculando, assim, a imagem dos servidores e da própria instituição. 3. A sentença julgou improcedente o pedido e condenou a parte autora a pagar despesas processuais ( § 2º do art. 82 do NCPC ) e honorários advocatícios de 10% sobre o valor atualizado da causa (caput, § 1º e § 2º do art. 85 do CPC ). 4. A tese recursal do autor possui espeque nos seguintes argumentos: (i) a defesa não trouxe qualquer documento que comprovasse as alegações veiculadas na matéria publicada; (ii) nenhum policial do CORE responde a qualquer procedimento administrativo ou criminal pelas citadas operações, ainda assim, caso estivessem respondendo, o fato deveria estar comprovado; (iii) ninguém deve ser considerado culpado antes da sentença penal condenatória transitada em julgado; (iv) não é aceitável que uma acusação difamatória realizada por um veículo de comunicação da relevância da Revista Isto É, sem qualquer embasamento imponha a todos os integrantes de uma classe o ônus de, individualmente, comprovar sua retidão e lisura. 5. De acordo com o artigo 5º , inciso V , da Constituição Federal , é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem. 6. Prescreve, ainda, o art. 220 , da Constituição Federal , que a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta Constituição . 7. O direito de resposta tem assento constitucional (art. 5º , V , da CF/88 ) e está disciplinado na Lei nº 13.188 /2015. 8. A Lei nº 13.188 /2015 regulamentou o art. 5º , V , da CRFB , disciplinando o direito de resposta ou retificação, gratuito e proporcional ao agravo, em razão de ofensa, ainda que por equívoco de informação, contra a honra, a intimidade, a reputação, o conceito, o nome, a marca ou a imagem, seja pessoa física ou jurídica identificada ou passível de identificação, através de matéria divulgada, publicada ou transmitida por veículo de comunicação social, excetuados os comentários realizados por usuários da internet nas páginas eletrônicas dos veículos de comunicação social (artigos 1º e 2º). 9. O direito de resposta ou retificação pode ser exercido pela via administrativa, mediante solicitação ao próprio veículo de comunicação social ofensor (artigos 3º e 4º) ou pela via judicial, através da respectiva ação especial de cumprimento forçado do direito de resposta ou retificação (artigos 5º ao 11). 10. Contudo, na forma do art. 3º, da menciona lei, o direito de resposta ou retificação deve ser exercido no prazo decadencial de 60 (sessenta) dias, contado da data de cada divulgação, publicação ou transmissão da matéria ofensiva, mediante correspondência com aviso de recebimento encaminhada diretamente ao veículo de comunicação social ou, inexistindo pessoa jurídica constituída, a quem por ele responda, independentemente de quem seja o responsável intelectual pelo agravo. 11. Dessa forma, o direito de resposta ou retificação, mediante solicitação ao próprio veículo de comunicação social ofensor (fase extrajudicial), deve ser exercido no prazo decadencial de 60 dias, contados da data de cada divulgação, publicação ou transmissão da matéria ofensiva (art. 3º). 12. Conclui-se, desse modo, que o direito de resposta é uma garantia fundamental, por meio da qual o ofendido, por intermédio de matéria divulgada em veículo de comunicação social poderá, de forma gratuita, rechaçar ou corrigir a afirmação que foi veiculada, no mesmo horário, modo e duração do agravo praticado. 13. Bem de ver que o direito à liberdade de imprensa não é absoluto, devendo se conformar com outros direitos fundamentais também contidos em nível constitucional, e ser exercido de acordo com a ética, sob pena de caracterizar-se abusivo. 14. Assim, a liberdade de imprensa, que é uma espécie do gênero "liberdade de expressão", deve respeitar os limites impostos pelos demais dispositivos da Constituição Federal , sendo certo que a proteção aos direitos da personalidade é assegurada a todos os indivíduos. 15. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça já firmou sua orientação acerca dos parâmetros para aferir o exercício abusivo da liberdade de imprensa, os quais devem pautar-se em três pilares, quais sejam: (i) dever de veracidade, (ii) dever de pertinência e (iii) dever geral de cuidado. ( AgInt no REsp XXXXX/SP , Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 11/05/2021, DJe 14/05/2021) 16. A informação além verídica, deve ser de interesse da coletividade, ou seja, deve existir interesse público na notícia ou crítica veiculada na mídia. 17. O conteúdo divulgado na matéria veiculada não pode ainda afrontar os direitos da personalidade. 18. Por sua vez, o dever geral de cuidado consiste na vedação da veiculação de crítica jornalística com intuito de difamar, injuriar ou caluniar a pessoa (animus injuriandi vel diffamandi). 19. Assentadas tais premissas, o exercício do direito à liberdade de imprensa somente será considerado exercício regular do direito de informar, se a notícia veiculada for verdadeira, de interesse público e não afrontar os direitos da personalidade do noticiado. 20. No caso, patente a resistência do órgão de comunicação em atender ao pedido de direito de resposta, caracterizando à pretensão resistida e, por conseguinte, o interesse jurídico ao ajuizamento da presente ação judicial. 21. Não há que se falar em inépcia da petição inicial, tendo em vista que a parte autora cumpriu com os requisitos elencados na legislação especial, a qual possui rito próprio, instruindo a demanda com a prova do agravo (matéria ofensiva), prova de que houve pedido de resposta não atendido e o texto da resposta a ser publicado. 22. De fato, a reportagem publicada não se limitou a manter a população informada acerca de fatos envolvendo a política de segurança pública do então governador Wilson Witzel, notadamente no que concerne à utilização de snipers em operações policiais em áreas de comunidade do Estado ou de informações disponibilizadas em fontes oficiais. 23. O abuso do dever de informar decorre da utilização da linguagem escrita que não se restringiu a tecer críticas à política de segurança pública ou a forma/procedimento adotado pela Polícia Civil nas operações realizadas por helicópteros nas comunidades do Estado do Rio de Janeiro, mas atribuiu aos atiradores especializados da Polícia Civil a pecha de criminosos. 24. Não subsiste dúvida de que o título da matéria ¿Os Snipers Criminosos de Witzel¿ foi elaborado com a finalidade de cooptar leitores e, seu emprego, assim como os termos utilizados na notícia, assumem uma postura caluniosa e injuriosa, maculando a classe profissional da Polícia Civil em um todo, inclusive lhes imputando práticas de atos ilícitos. 25. Não se perde de vista que o direito de resposta não pode ser concebido apenas como um direito do ofendido de se manifestar, mas de a coletividade ter acesso à contraposição de argumentos, sob uma outra perspectiva, permitindo que se forme um juízo de convicção sobre os fatos noticiados. 26. O STF já firmou sua orientação acerca das múltiplas funções que se mostram inerentes ao direito de resposta, notadamente como instrumento de pluralismo informativo. 27. Diante de tais considerações, resta caracterizada, no caso, a extrapolação do exercício regular do direito de informar, configurando sua abusividade e possibilitando ao ofendido exercer o seu direito de resposta. 28. Recurso provido.