PROCESSO Nº: XXXXX-87.2021.4.05.8100 - APELAÇÃO CÍVEL APELANTE: FRANCISCO VALDECY SOARES COELHO ADVOGADO: Nixon Marden De Castro Sales APELADO: UNIÃO FEDERAL RELATOR (A): Desembargador (a) Federal Cid Marconi Gurgel de Souza - 3ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1º GRAU): Juiz (a) Federal Jose Vidal Silva Neto EMENTA PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. ACÓRDÃO DO TCU. PRESCRIÇÃO PARA INSTAURAÇÃO DA TOMADA DE CONTAS ESPECIAL. OCORRÊNCIA. 1. Apelação interposta pelo Particular objetivando a reforma da sentença que julgou improcedentes os Embargos à Execução, nos quais aduziu a prescrição da pretensão da União Federal em executar multa relativa a acórdão lavrado pelo TCU. Honorários advocatícios fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa. 2. Requer os benefícios da justiça gratuita, e alega que ocorreu a prescrição da pretensão de ressarcimento ao Erário, tendo em vista que a apresentação da prestação de contas final ocorreu em 24/04/2006, e a instauração da Tomada de Contas Especial somente ocorreu em 14/09/2015, ou seja, mais de 9 (nove) anos após o termo inicial da prescrição. Defende a aplicação da prescrição quinquenal, por analogia ao artigo 1º do Decreto nº 20.910 /32, por inexistir previsão legal de prazo para atuação do Tribunal de Contas da União. Suscita também a nulidade da penhora realizada, argumentando que o imóvel constrito é impenhorável por se tratar pequena propriedade rural e por não constar do Auto de Penhora a nomeação de depositário do bem penhorado. Impugna a avaliação realizada pelo Oficial de Justiça. Requer a desconstituição da penhora e, subsidiariamente, a realização de nova avaliação do bem penhorado. 3. Depreende-se do processado que o ora Apelante apresentou Embargos à Execução, nos quais suscita a prescrição da constituição do Título Executivo Extrajudicial consubstanciado pelos Acórdãos n. 3769/2017 e 6064/2017 - TCU - 1ª Câmara do Tribunal de Contas da União, bem como a alegação de nulidade da respectiva obrigação. Sustenta que se passaram 9 (nove) anos entre a data limite para prestação de contas e a autuação da Tomada de Contas Especial no TCU Em razão disso, defende que está fulminado o direito estatal de exigir o ressarcimento oriundo da decisão do TCU, bem como que o prazo de prescrição do Tribunal de Contas exigir as contas é de 5 (cinco) anos, conforme entendimento do STJ. 4. É sabido que esta egrégia Turma vem se posicionando no sentido de que, na fase que precede à apuração pelo TCU, ou seja, na fase de apuração desencadeada pelo próprio Órgão convenente, diretamente ou por meio da Controladoria Geral da União, não correria o prazo prescricional, que apenas se iniciaria com o envio de relatório ao Tribunal de Contas da União. Há diversos precedentes nesse sentido. Esse entendimento comumente se embasa em precedente da 4ª Turma desta Corte, segundo o qual: "A fase interna de controle, exercido pelo TCU, não integra a contagem do prazo prescricional. O prazo para a execução se inicia após a constituição definitiva do crédito (...)". (TRF5 - Processo XXXXX-07.2019.4.05.0000 , Agravo de Instrumento, Rel. Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto Neto, 4ª Turma, julgamento: 10/03/2020). 5. Ressalte-se, contudo, que as bases desse entendimento restaram superadas pelo STF, após o julgamento do RE XXXXX/SP , julgado em 8/8/2018, em que se fixou a seguinte tese: "São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa ". Restou assentado, no referido julgamento, que a prescrição é a regra, "o texto constitucional é expresso (art. 37 , § 5º , CRFB ) ao prever que a lei estabelecerá os prazos de prescrição para ilícitos na esfera cível ou penal, aqui entendidas em sentido amplo, que gerem prejuízo ao erário e sejam praticados por qualquer agente". A exceção, ou seja, a imprescritibilidade a que se refere o texto constitucional , estaria restrita às "ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa ". Ao julgar o RE XXXXX/AL , Rel. Ministro Alexandre de Moraes, Tribunal Pleno, julgado em 20/04/2020, Tema 899 de Repercussão Geral, o STF fixou ainda a seguinte tese, em complementação: "A pretensão de ressarcimento ao erário em face de agentes públicos reconhecida em acórdão de Tribunal de Contas prescreve na forma da Lei 6.830 /1980 ( Lei de Execução Fiscal )". Logo, há que se distinguir entre a pretensão de ressarcimento fundada em título do TCU - para a qual prevalece a regra geral, de que incide o prazo prescricional a ser definido por lei - e aquelas que se fundam em sentença proferida em ação de improbidade, nas quais se reconhece a prática de ato ímprobo praticado com dolo, em relação às quais não há prescrição, conforme decidiu o STF. 6. Ao julgar o MS XXXXX/DF , Relator Ministro Roberto Barroso, Primeira Turma, julgado em 21/03/2017, o STF definiu, e vem seguindo essa linha, que, dado o seu caráter geral, "a prescrição da pretensão sancionatória do TCU é regulada integralmente pela Lei nº 9.873 /1999 - que regulamenta a prescrição relativa à ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta", uma vez que "a Lei nº 8.443 /1992 (Lei Orgânica do TCU), ao prever a competência do órgão de contas federal para aplicar multas pela prática de infrações submetidas à sua esfera de apuração (art. 58), deixou de estabelecer prazo para o exercício do poder punitivo." 7. Nesse mesmo sentido, destaca-se: "A prescrição da pretensão punitiva do TCU é regulada pela Lei 9.873 /1999, descabendo a aplicação do prazo decenal previsto na legislação civil (art. 205 do Código Civil ). Ao revés, incide o prazo quinquenal previsto na Lei 9.873 /1999 ( MS 32201 , Rel. Min. Roberto Barroso, Primeira Turma, DJe 7/8/2017; MS 35.512 -AgR, Rel. Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe 21/6/2019)". (STF - MS 35.940 , Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, julgado em 16/06/2020, Processo Eletrônico DJe-176 divulg XXXXX-07-2020 public XXXXX-07-2020). Parte-se, portanto, da premissa de que a Lei n. 9.873 /99 regula inteiramente a prescrição da ação punitiva do Poder Público em face de atos ilícitos praticados pelos gestores públicos, nos termos dos citados precedentes da Suprema Corte e, com o ajuizamento da respectiva Execução Fiscal, a prescrição passa a ser regulada pela Lei n. 6.830 /80, conforme assentado na tese fixada no Tema 899 do STF. 8. O art. 1º da Lei n. 9.873 /99 dispõe que "Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado". O art. 2º da referida norma também estabelece as hipóteses de interrupção do referido prazo, sendo eles: a) "notificação ou citação do indiciado ou acusado, inclusive por meio de edital"; b) "qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato"; c) "pela decisão condenatória recorrível"; e d) "qualquer ato inequívoco que importe em manifestação expressa de tentativa de solução conciliatória no âmbito interno da administração pública federal". Também merece destaque a disposição do § 1º da Lei 9.873 /99, segundo o qual "Incide a prescrição no procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho". 9. Do exame sistemático dos referidos dispositivos, concluo que não há, na Lei n. 9.873 /99, norma autorizando a conclusão de que, sendo a ação punitiva do Estado formada de duas fases, uma interna e outra externa, o prazo prescricional incidiria separadamente nessas duas hipóteses. O prazo prescricional é um só, que se conta a partir do fato ou da sua cessação, em se cuidando de infração permanente ou continuada. 10. De acordo com o relatório do Acórdão ora executado o Convênio em questão teve sua vigência no período de 27/12/2002 a 10/06/2006. Em 24/04/2006, antes do termo final, o então prefeito de Novo Oriente Francisco Valdecy Soares Coelho encaminhou ao Ministério da Integração Nacional a documentação que trata da prestação de contas dos recursos recebidos do citado Convênio. A partir do recebimento da documentação objetivando a prestação de contas dos valores referentes ao convênio acima citado a Administração inicia a fase interna do controle de contas realizada pelo órgão concedente. Em 12/05/2006 o MI emitiu Relatório de Vistoria técnica com várias observações, dentre as quais a de que, em relação ao açude de Morada Nova, embora concluído, a obra não teria atendido integralmente a todos os quesitos para sua aceitação definitiva. A Prefeitura deveria ser comunicada quanto às pendências apontadas. Ainda em 12/05/2006, o engenheiro Francisco Antonio Mota da Secretaria de Infraestrutura Hídrica do Ministério mandou mensagem por fax ao então Prefeito Francisco Valdecy Soares Coelho avisando-lhe que em Vistoria realizada no açude Morada Nova e passagem molhada na localidade de Inhamuns, obras objeto do Convênio 804/2002, constatou-se que não foram executados os serviços relacionados aos itens 3.1 - extração e carga de pedra, e 3.2 - enrocamento de pedra jogada, constando de colocação e espalhamento. Verificou-se também que não foi construído o cordão de fixação e que o sangradouro não estava com 86,00m de largura conforme projetado. A partir da constatação das irregularidades acima noticiadas, verifica-se que, desde maio 2006 até 14.09.2015, data da instauração da Tomada de Contas Especial no Ministério da Integração Nacional (v. Histórico do doc. da Secretaria Geral de Controle Externo do TCU - itens 2 a 30, fls. 498/502 do PDF), ocorreu o trâmite regular do Processo Administrativo, para averiguação das contas prestadas. Nesse período foram realizadas Vistorias in loco, emitidas notas técnicas, pareceres, expedidas diversas notificações, muitas das quais, objetivando oportunizar aos responsáveis a correção das impropriedades verificadas, em face dos riscos que a obra representava à população e ao meio ambiente. O Relatório de Tomada de Contas Especial foi enviado ao Tribunal de Contas da União, em 26/07/2016, com a citação do embargado em 22/09/2016, e julgamento proferido em 09/05/2017, integrado pelo Acórdão nº 6064/2017, proferido em 04/07/2017, com o ajuizamento da presente execução em 29/05/2018. 11. Assim, é forçoso reconhecer que, em relação à referida Empresa, transcorreu o prazo prescricional para o exercício da ação punitiva estatal, daí porque não poderia o Acórdão do TCU imputar à referida pessoa jurídica débitos decorrentes de irregularidade do Convênio em questão. 12. Prejudicadas as alegações relativas à nulidade da penhora, que deve ser cancelada, ante a decretação da prescrição da dívida. 13. Apelação provida para reconhecer a prescrição da pretensão executória da União Federal. Invertido o ônus da sucumbência. dfp