APELAÇÃO CÍVEL - "AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA COM PEDIDO LIMINAR DE TUTELA DE URGÊNCIA C/C REPETIÇÃO DE INDÉBITO E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS" - SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA - RECURSO DA PARTE AUTORA. REQUERIMENTO DE JUSTIÇA GRATUITA, APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR E INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA - INTERLOCUTÓRIA PRETÉRITA, PROFERIDA NA ORIGEM, DEFERINDO OS INTENTOS ORA PRETENDIDOS - AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL - EXTENSÃO DO BENEPLÁCITO DA GRATUIDADE CONCEDIDO EM PRIMEIRO GRAU A ESTA INSTÂNCIA - IMPOSSIBILIDADE DE CONHECIMENTO DA IRRESIGNAÇÃO NOS PONTOS. Constitui-se o interesse recursal pressuposto geral de admissibilidade de todo recurso, de maneira que, para requerer a reforma da sentença, deve o apelante demonstrar o prejuízo advindo da manutenção judicial atacada. Tendo a gratuidade da justiça, a aplicabilidade da legislação protetiva consumerista e a inversão do ônus da prova sido deferidas no curso do processo em Primeiro Grau de Jurisdição, não sobeja interesse recursal que justifique a análise das temáticas nesta ocasião. DEMANDA OBJETIVANDO A DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO POR MEIO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM RESERVA DE MARGEM CONSIGNÁVEL (RMC) - ACIONADO QUE DEFENDEU A LEGALIDADE DOS DESCONTOS EFETUADOS NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DA AUTORA - ATO ILÍCITO CONFIGURADO - DEDUÇÃO A TÍTULO DE CONSIGNAÇÃO VIA CARTÃO DE CRÉDITO NUNCA ANTES UTILIZADO PELA CONSUMIDORA - PRÁTICA ABUSIVA - VASTO CONJUNTO PROBATÓRIO A DERRUIR A TESE DEFENSIVA - EXTRATOS QUE EVIDENCIAM A AUSÊNCIA DE ABATIMENTO DO MONTANTE DO MÚTUO - INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 6º , III , E 39 , V , DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - POSSIBILIDADE DE READEQUAÇÃO DA AVENÇA CONVENCIONADA PARA A MODALIDADE INICIALMENTE PRETENDIDA, QUAL SEJA, DE EMPRÉSTIMO CONSIGNADO PURO E SIMPLES - RECLAMO PROVIDO NO CAPÍTULO. A prática abusiva e ilegal de contrair modalidade de empréstimo avesso ao objeto inicialmente pactuado é conduta infensa ao direito, sobretudo quando a instituição financeira, ao difundir seu serviço, adota medida anômala ao desvirtuar o contrato de mútuo simples consignado, modulando a operação via cartão de crédito com reserva de margem. Ao regular seus negócios sob tal ótica, subverte a conduta que dá esteio as relações jurídicas, incidindo em verdadeira ofensa aos princípios da transparência e da boa fé contratual, situando o consumidor em clara desvantagem, provocando, por mais das vezes, a cobrança de valores reconhecidamente descabidos e infundados, gerando toda sorte de injusto endividamento. Na hipótese, constata-se devidamente demonstrada a consignação ilegal da reserva de margem consignável (RMC) em cartão de crédito, sequer utilizado pela demandante. Assim, em observância à pretensão expressamente externada na exordial, determina-se a readequação da contratação para a modalidade inicialmente pretendida, qual seja, de empréstimo consignado puro e simples. REPETIÇÃO DE INDÉBITO EM DOBRO - INVIABILIDADE - ENGANO JUSTIFICÁVEL ( CDC , ART. 42 )- RESTITUIÇÃO DA QUANTIA NA MODALIDADE SIMPLES - INCONFORMISMO PARCIALMENTE ACOLHIDO NO TÓPICO. Em que pese a evidente falha na prestação do serviço, o pagamento efetuado pela demandante não era de todo indevido, haja vista a existência de relação contratual entre as partes, concluindo-se por engano justificável do banco (art. 42 do Código Consumerista). DANO MORAL - ATO ILÍCITO - RELAÇÃO DE CONSUMO - INCIDÊNCIA DO ART. 14 DA LEI N. 8.078 /1990 - ABALO ANÍMICO EVIDENCIADO - DESCONTOS INDEVIDOS EFETUADOS QUE COLOCARAM EM RISCO A SUBSISTÊNCIA PESSOAL DA ACIONANTE, HAJA VISTA O ÍNFIMO VALOR PERCEBIDO A TÍTULO DE PENSÃO POR MORTE PREVIDENCIÁRIA - AGASALHAMENTO DA IRRESIGNAÇÃO NO PARTICULAR. Nas relações de consumo o fornecedor de serviços responde objetivamente na reparação de danos causados aos consumidores, nos casos de defeito ou por informações não prestadas ou inadequadas ( CDC , art. 14 ). Assim, para a configuração do dever de indenizar, necessária a prova do ato ilícito, do dano e nexo causal entre a conduta do agente e os prejuízos causados ( CC , arts. 186 e 927 ). Tratando-se, no caso, de pessoa que percebe pensão por morte previdenciária equivalente a pouco mais de um salário mínimo (R$ 1.120,36), embora o valor descontado possa sugerir quantia ínfima, se considerada isoladamente, afigura-se significativa quando suprimida por período duradouro, a estampar, no caso, inequívoco abalo anímico, sobretudo quando neste montante agrega-se valores não entabulados. MONTANTE INDENIZATÓRIO - INEXISTÊNCIA DE CRITÉRIOS OBJETIVOS PARA A FIXAÇÃO - ANÁLISE DO CASO CONCRETO - PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE - CAPACIDADE FINANCEIRA DOS CONTENDORES - ESTABELECIMENTO DA REPARAÇÃO EM R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS) - VALOR QUE SE MOSTRA ADEQUADO DIANTE DAS PECULIARIDADES, INCIDINDO CORREÇÃO PELO INPC, A PARTIR DA PRESENTE DELIBERAÇÃO, E JUROS MORATÓRIOS DE 1% (UM POR CENTO) AO MÊS, A CONTAR DO EVENTO DANOSO (SÚMULAS 362 E 54 DO STJ, RESPECTIVAMENTE). As normas jurídicas pátrias não definiram expressamente os critérios objetivos para arbitramento do "quantum" indenizatório, sabendo-se, apenas, que "a indenização mede-se pela extensão do dano" ( CC , art. 944 ). Dessa forma, devem ser analisadas as particularidades de cada caso concreto, levando em consideração o mencionado dispositivo, as condições econômico-financeiras das partes envolvidas, os princípios da proporcionalidade e razoabilidade e o caráter pedagógico do ressarcimento. Na hipótese em análise, trata-se de pessoa cujo benefício previdenciário perfaz a cifra de pouco mais de um salário mínimo mensal, enquanto que a responsável pela reparação é instituição financeira dotada de grande poder econômico com larga atuação no mercado creditício. Sopesando tais circunstâncias, principalmente em atenção ao caráter punitivo pedagógico da condenação, entende-se adequada a fixação do "quantum" indenizatório em R$ 10.000,00 (dez mil reais), corrigidos pelo INPC, a partir do presente arbitramento, e com incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, desde o evento danoso (Súmulas 362 e 54 do STJ, respectivamente). ÔNUS SUCUMBENCIAIS - NOVO DESLINDE FORNECIDO À CONTROVÉRSIA - PARTE ACIONANTE QUE DECAIU DE PARTE MÍNIMA DA PRETENSÃO EXORDIAL - INTELIGÊNCIA DO ART. 86 , PARÁGRAFO ÚNICO , DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL - HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA - NATUREZA PREDOMINANTEMENTE CONDENATÓRIA DA DECISÃO - INVERSÃO - ARBITRAMENTO DE ACORDO COM O ART. 85, § 2º DA CODIFICAÇÃO PROCESSUAL CIVIL. A imposição do pagamento dos ônus sucumbenciais deve considerar o êxito de cada um dos contendores no litígio. No caso, constata-se que a acionante obteve êxito quase na totalidade dos pedidos deduzidos na inicial, exceto quanto à forma dobrada de repetição. Logo, vislumbrando-se o decaimento mínimo do recorrente, nos termos do art. 86 , parágrafo único , do Código de Processo Civil , há de se atribuir à parte adversa o adimplemento da totalidade dos estipêndios decorrentes de sua derrota. Para a fixação dos honorários de sucumbência, deve-se estar atento ao trabalho desempenhado, ao zelo na defesa e exposição jurídica do advogado e à natureza da demanda, de modo que a verba honorária remunere de forma apropriada o profissional, sob pena de desprestígio ao exercício de uma das funções essenciais à justiça. "In casu", considerando: a) a célere tramitação da demanda (em curso desde 25/5/2018); b) serem os autos integralmente digitais; c) o julgamento antecipado da lide; entende-se adequado o arbitramento do estipêndio patronal no percentual de 10% (dez por cento) sobre o montante indenizatório. HONORÁRIOS RECURSAIS - EXEGESE DO ART. 85, § 11, DA LEI ADJETIVA CIVIL - PROVIMENTO PARCIAL DO RECLAMO - MAJORAÇÃO CABIDA NA ESPÉCIE, EM PROL DO CAUSÍDICO DA RECORRENTE. Sob a premissa de que o estipêndio patronal sucumbencial é devido em função do trabalho realizado pelos causídicos, prevê a legislação processual civil a possibilidade de majoração dos honorários por ocasião do julgamento do recurso (art. 85, § 11). Nesse viés, na situação dos presentes autos, o parcial provimento do recurso manejado pela autora justifica a majoração dos honorários em 2% (dois por cento) sobre o valor da condenação, em favor de seu procurador.