EMENTA: RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. EMPRESA AÉREA. ALTERAÇÃO DO CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO. VOO ANTECIPADO. INFORMAÇÃO PRESTADAS EM MENOS DE 72 HORAS. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA AO CONSUMIDOR. DANO MATERIAL COMPROVADO. DANO MORAL CONFIGURADO. ARBITRAR VALOR. OBSERVÂNCIA DOS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. SENTENÇA REFORMADA. 1. Cumpre observar, que a matéria discutida constitui relação de consumo e, devido à hipossuficiência do (a) consumidor (a), necessário se faz a inversão do ônus da prova (art. 6º , inciso VIII , do Código de Defesa do Consumidor ), assim como, os artigos 6º, inciso VI, do referido Código prevê como direito básico do consumidor, a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, independentemente da existência de culpa, causados por defeitos relativos à prestação dos serviços. 2. Em resumo dos fatos, consta que a parte Recorrente adquiriu bilhete aéreo da empresa Recorrida para voo na data de 14/06/2017, no trecho entre Cuiabá/MT a Barra do Graças/MT, com embarque previsto para as 12h30min, contudo, o voo foi antecipado para o mesmo dia às 09h30min, impossibilitando o seu embarque. Aduz que esteve na cidade de Cuiabá/MT para participar do evento XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Centro-Oeste ? Intercom 2017, Cuiabá, que se realizaria nos dias 12 a 14 de junho de 2017, onde apresentaria artigo científico de forma oral, o qual seria submetido a avaliação de mediador. Acrescentou que a antecipação do voo lhe causou intensos prejuízos, já que não conseguiu embarcar para o destino programado, pois sua apresentação se daria no dia 14/06/2017 no período da manhã, sem possibilidade de alteração da programação previamente definida no evento. Relata ainda que havia programado o retorno para a cidade de Barra do Garças/MT, pois encontraria seu esposo em viagem familiar no feriado de Corpus Christi, e posteriormente retornaria a Goiânia em sua companhia, onde reside, de automóvel. Verbera que após tentar de todas as formas negociar com a parte Recorrida para que a realocasse em outro voo, obteve resposta que só haveria outro voo após cinco dias, tornando impossível aguardar naquela urbe, diante dos compromissos agendados. Fala que somente conseguiu a devolução da quantia, o que ocorreu após dois meses, em total discordância com determinação contida na Resolução 400 da Anac . Narra que teve que adquirir outro bilhete aéreo no valor de R$ 731,01 (setecentos e trinta e um reais e um centavo), com direção à Goiânia/GO e de lá seguir de carro para o destino que pretendia anteriormente. Argumenta que a parte Recorrida não seguiu as normas delimitadas para sua atuação, havendo descaso de sua parte na resolução das situações narradas, e que sofreu dano de ordem material e moral, os quais requer a efetiva reparação. 3. Cabe salientar, por oportuno, que para que surja o dever de indenizar, basta a constatação do dano sofrido pelo consumidor e o nexo causal existente entre ele e a conduta do fornecedor. 4. Insta salientar, por oportuno, que a teoria do risco do negócio ou atividade é a base da responsabilidade objetiva do Código de Defesa do Consumidor , devendo proteger a parte mais frágil da relação jurídica, o consumidor. Isso porque, como se sabe, a segurança dos serviços prestados constitui típico risco do empreendimento desenvolvido pela parte Recorrente, não podendo ser transferido a terceiros. 5. Cabe mencionar que, a responsabilidade do fornecedor do serviço e/ou produto é objetiva, sendo responsável pelos danos causados aos consumidores, independentemente de culpa. Conforme o § 3º do referido artigo 14 , do Código de Defesa do Consumidor , o fornecedor de serviço somente não será responsabilizado se provar ?que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste? ou ?a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro?. 6. Frisa-se, que a isenção da responsabilidade pela culpa exclusiva de terceiro, prevista no artigo 14 , § 3º , inciso II , do Código de Defesa do Consumidor (culpa exclusiva de terceiro), deve ser devidamente comprovada pelo fornecedor do serviço, demonstrando que tomou as cautelas devidas e necessárias para impedir ou dificultar a ocorrência de danos ao consumidor. 7. O contrato de transporte constitui obrigação de resultado. Não basta que o transportador leve o transportado ao destino contratado, é necessário que o faça nos termos avençados (dia, horário, local de embarque e desembarque, acomodações, aeronave, etc.). Ademais, além das providências mínimas previstas pela ANAC , é preciso ter em mente que a escolha pela modalidade aérea de transporte se relaciona justamente à rapidez prometida. Assim, a pontualidade é parte central do contrato de transporte estabelecido entre as partes. 8. Dessa maneira, o transportador aéreo deve reparar eventuais danos sofridos pelo consumidor em virtude da má prestação dos serviços oferecidos, independentemente da culpa, considerando sua responsabilidade de forma objetiva. No fortuito interno a responsabilidade do fornecedor advém do risco assumido por este ao exercer a atividade comercial, pois os danos decorrem do risco do empreendimento. 9. O art. 12 e seus §§ e incisos, da Resolução nº 400/16 da ANAC , estabelece o seguinte: ?Art. 12. As alterações realizadas de forma programada pelo transportador, em especial quanto ao horário e itinerário originalmente contratados, deverão ser informadas aos passageiros com antecedência mínima de 72 (setenta e duas) horas. § 1º O transportador deverá oferecer as alternativas de reacomodação e reembolso integral, devendo a escolha ser do passageiro, nos casos de: I ? informação da alteração ser prestada em prazo inferior ao do caput deste artigo; e II ? alteração do horário de partida ou de chegada ser superior a 30 (trinta) minutos nos voos domésticos e a 1 (uma) hora nos voos internacionais em relação ao horário originalmente contratado, se o passageiro não concordar com o horário após a alteração. § 2º Caso o passageiro compareça ao aeroporto em decorrência de falha na prestação da informação, o transportador deverá oferecer assistência material, bem como as seguintes alternativas à escolha do passageiro: I ? reacomodação; II ? reembolso integral; e III ? execução do serviço por outra modalidade de transporte.? 10. Analisando o conjunto probatório, verifica-se que a companhia aérea não informou a parte Recorrente acerca da alteração do horário do voo, sendo que a consumidora só foi ter ciência da antecipação do voo quando foi realizar o check in, quando percebeu que a companhia aérea antecipou o embarque em 3 (três) horas do anteriormente previsto, ou seja, sem qualquer justificativa ou aviso prévio.12. Denota-se que tal fato acarretou surpresa na parte Recorrente, uma vez que não teria como embarcar com a alteração no horário do voo, em razão da apresentação oral prevista para ser realizada no mesmo dia, no período matutino.13. Em oposição ao argumento utilizado pelo juiz a quo, entendo a opção de reacomodação ou reembolso integral cabia ao passageiro, conforme o § 1º, inciso I, do art. 12 da Resolução nº 400/16 da ANAC , e não a companhia aérea como fundamentou o juiz. No caso em apreço, a empresa Recorrida não possibilitou a reacomodação, dando como única opção outro voo com embarque previsto para 5 (cinco) dias após o ocorrido, oportunidade em que poderia ainda reacomodar a Recorrente em um voo para Goiânia, conforme sugerido pela consumidora, contudo, a mesma recusou de forma injustificada e deu como única opção a devolução do valor.14. Impende ressaltar, que o art. 28 e seus incisos, da Resolução nº 400/16 da ANAC , prevê que a reacomodação será gratuita, não se sobreporá aos contratos de transporte já firmados e terá precedência em relação à celebração de novos contratos de transporte, devendo ser feita, à escolha do passageiro, em voo próprio ou de terceiro para o mesmo destino, na primeira oportunidade ou em voo próprio do transportador a ser realizado em data e horário de conveniência do passageiro.15. Consideradas tais circunstâncias, não há como ser afastado o dever de reparação dos danos oriundos da falha na prestação do serviço de transporte aéreo, porquanto, não restou configurada qualquer excludente de sua responsabilidade no caso em comento. 16. Consoante o disposto no art. 402 do Código Civil , os danos materiais abrangem o que a vítima efetivamente perdeu, o que razoavelmente deixou de lucrar, ou seja, os prejuízos materiais, abrangem os danos emergentes e os lucros cessantes. Para que seja devido a indenização por danos materiais, há necessidade de prova específica concernente ao prejuízo material sofrido pelo consumidor, uma vez que não pode se presumir a ocorrência de danos materiais.15. Os danos materiais, decorrentes da necessidade de aquisição de novos bilhetes aéreos, restaram comprovados nos autos, conforme documentos carreados com a petição inicial (evento nº 01, arquivo 05), sendo certo que deverá ser reparado o prejuízo que efetivamente perdeu e comprovou nos autos, qual seja, o valor de R$ 731,01 (setecentos e trinta e um reais e um centavo).12. Depreende-se que é indiscutível a responsabilidade da parte Recorrida pela prestação defeituosa do serviço, bem como pelos transtornos experimentados pela consumidora que dão ensejo ao dano moral, ao qual, diante de sua gravidade, ultrapassam o mero aborrecimento ou dissabor, gerando, assim, o dever de indenizar.13. Nesse sentido é o entendimento do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás: ?APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. PACOTE DE VIAGEM. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA E SOLIDARIA ENTRE A AGÊNCIA DE VIAGENS E A COMPANHIA AÉREA. PERDA DA VIAGEM POR AUSÊNCIA DE INFORMAÇÃO SOBRE A ANTECIPAÇÃO DO HORÁRIO DE VOO. DANO MORAL CONFIGURADO. QUANTUM INDENIZATÓRIO. RAZOABILIDADE E PROPORCIONALIDADE OBSERVADO. DANOS MATERIAIS. COMPROVADOS. HONORÁRIOS RECURSAIS. MAJORADOS. 1. É ônus do fornecedor de serviços provar a ocorrência de causa excludente de sua responsabilidade, como a inexistência de defeito do serviço prestado, ou a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro. 2. A agência de turismo e a companhia aérea respondem solidariamente, nos termos do artigo 14 e seguintes do Código de Defesa do Consumidor , pelos defeitos na prestação dos serviços contratados. 3. O defeito no modo da prestação do serviço, consubstanciado tanto pela ausência de informações ao consumidor sobre a antecipação do horário do seu voo, como pela falta de soluções ao problema provocado, que inviabilizar a realização da viagem contratada, configura dano moral indenizável. 4. Uma vez comprovado o pagamento, não há se falar em ausência do dever de reparação dos danos materiais sofridos, em respeito a regra insculpida no artigo 944 do Código Civil . 5. A verba indenizatória do dano moral somente será modificada se não atendidos pela sentença os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade na fixação do valor da condenação, o que não se observa no presente caso. 6. Evidenciada a sucumbência recursal, é imperiosa a majoração dos honorários advocatícios de sucumbência anteriormente fixados, consoante previsão do artigo 85 , § 11 , do Código de Processo Civil . 7. APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDA, MAS DESPROVIDA.? (TJ-GO ? Apelação ( CPC ): XXXXX20188090051 , Relator: ELIZABETH MARIA DA SILVA , Data de Julgamento: 10/02/2020, 4ª Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 10/02/2020).14. Nesse compasso, perfeitamente configurados os requisitos da responsabilidade civil e, por consequência, o dever de reparação pela parte Recorrida, cabível a indenização pelos danos morais sofridos pela parte Recorrente.15. É cediço que na indenização por danos morais, o conceito de ressarcimento abrange duas forças: uma de caráter punitivo, visando castigar o causador do dano, pela ofensa que praticou; outra, de caráter compensatório, que proporcionará à vítima algum bem em contrapartida ao mal sofrido.16. Impende ressaltar, que o valor da indenização por dano moral deve ser arbitrado levando-se em conta, sempre, os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Sua reavaliação, portanto, somente é possível quando verificada a exorbitância ou o caráter irrisório da importância, em flagrante ofensa aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.17. Portanto, arbitro o valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), uma vez que entendo que este valor arbitrado pelo dano moral, atenderá o parâmetro da extensão do abalo sofrido pela lesada, bem como a finalidade repressiva ao ofensor, sem, contudo, configurar fonte de enriquecimento ilícito, atendidos os critérios da razoabilidade e proporcionalidade.18. Quanto a incidência de juros moratórios do dano material e dano moral, deverão incidir a partir da citação válida (art. 405 do Código Civil e art. 240 do Código de Processo Civil ), por tratar-se de responsabilidade contratual. Por outro lado, a incidência da correção monetária do dano material, deverá incidir a partir da data do efetivo prejuízo (Súmula 43 do STJ), qual seja, data do desembolso efetuado. Além disso, a incidência da correção monetária do dano moral, deverá incidir desde a data do arbitramento (Súmula 362 do STJ), qual seja, a data deste acórdão.19. Ante o exposto, CONHEÇO do recurso interposto e DOU-LHE PARCIAL PROVIMENTO, reformando a sentença proferida, no sentido JULGAR PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados na inicial, e consequentemente, extinguir o processo com resolução do mérito, com fulcro no art. 487 , inciso I , do Código de Processo Civil , para condenar a parte Recorrida ao pagamento de R$ 731,01 (setecentos e trinta e um reais e um centavo) a título de indenização por danos materiais, devendo ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir data do desembolso efetuado e com incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação válida, bem como ao pagamento de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) a título de indenização por danos morais, devendo ser corrigido monetariamente pelo INPC a partir deste acórdão e com incidência de juros de mora de 1% (um por cento) ao mês, a partir da citação válida.20. Deixo de condenar a parte Recorrente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, com fulcro no art. 55 , caput, da Lei n. 9.099 /95.