PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO CONSELHO RECURSAL RECURSO Nº: XXXXX-18.2021.8.19.0202 Recorrente - RICARDO TRAJANO DA SILVA - autor Recorrido - CLARO S/A. - ré Origem: 15º Juizado Especial Cível - regional Madureira - RJ. Relator: Juiz Mauro Nicolau Junior Por unanimidade a 2ª Turma Recursal deliberou em conhecer do recurso e dar provimento nos termos do voto do juiz relator. I - Empresa de telefonia que cobra multa por quebra da cláusula de fidelidade sem que sequer comprove a existencia dessa obrigação posta em contrato. II - Afirma a ré ser devida a multa por rompimento da avença antes de expirado o prazo constante da cláusula. Contudo, o autor já era assinante da NEXTEL há mais de 5 anos tendo sido compelido a migrar para a CLARO que incorporou a empresa anterior inexistindo, assim, novo contrato e, portanto, incabível a cobrança de multa por quebra da cláusula de fidelização. II - Sentença julga improcedentes os pedidos aduzindo ser legal a multa e que a reclamação quanto a insuficiencia dos serviços de telefonia não se comprovou posto que no periodo foi demonstrado grande numero de ligações feitas e recebidas. III - A cláusula de fidelização é legal e sua cobrança regular como forma de garantir ao prestador do serviço a recuperação dos valores investidos e concedidos ao assinante tais como redução de tarifa, bônus, aparelhos de telefonia etc. IV - Não comprovado ter sido concedido qualquer beneficio ou vantagem ao consumidor a cobrança se revela abusiva e ilícita devendo o valor ser restituido em dobro. V - Lei estadual 7872/2018 que veda a inserção de clausula de fidelidade em contrados dessa natureza, considerada constitucional pelo STF. VI - Sentença que se reforma para declarar a nulidade da cláusula de fidelidade e condenar a ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 2.000,00. VII - Ônus sucumbenciais no voto. ACÓRDÃO Pretende o autor a reforma da sentença que julgou improcedentes seus pedidos para declarar indevida a multa por quebra da cláusula de fidelidade e indenização por danos morais por insuficiencia dos serviços de telefonia. A sentença se fundamentou na legalidade da cobrança da multa decorrente da cláusula contratual de fidelização e que no periodo que o autor afirma que os serviços foram prestados de forma insuficiente existe vasta utilização da linha telefônica. O recurso prospera em parte visto que, diversamente do sustentado, o autor em momento algum solicitou a portabilidade da linha da Nextel para a Claro o que lhe foi imposto por conta da incorporação de uma empresa pela outra sendo, assim, absolutamente irregular e ilicito considerar como se fosse celebrado um novo contrato quando o autor já o era ha mais de 5 anos. Insta salientar a absoluta legalidade da cláusula de fidelidade temporária, como afirmado pela ré, desde que haja comprovação de que tenha o consumidor de fato auferido algum lucro ou vantagem o que alega a ré sem, contudo, demonstrar ou comprovar minimamente. Alias, não comprova a ré sequer a existencia do contrato no qual afirma constar a cláusula de fidelização. Vê-se, assim, que sequer a ré foi capaz de apontar com exatidão e de forma comprovada quais seriam os benefícios que teriam justificado a cobrança da multa por quebra da cláusula de fidelidade tornando-a, assim, abusiva e ilegal. Assim, incumbiria à ré comprovar quais seriam os benefícios concedidos à parte autora que justificariam a manutenção do plano pelo prazo contratado como forma de recuperação do investimento que teria, em tese, sido feito. Nesse sentido a jurisprudencia como adiante se vê. APELAÇÃO CÍVEL. PRETENSÃO DECLARATÓRIA CUMULADA COM OBRIGAÇÃO DE FAZER E REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. INADIMPLEMENTO DE MULTA CONTRATUAL DECORRENTE DE INOBSERVÂNCIA DE CLÁUSULA DE FIDELIZAÇÃO CELEBRADA EM CONTRATO DE PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE TELEVISÃO VIA SATÉLITE. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. MANUTENÇÃO DO DECISUM. 1 . Consoante remansosa jurisprudência no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, a cláusula de fidelização em contrato de serviços de telecomunicação revela-se lícita, tendo em vista os benefícios concedidos pelas operadoras aos assinantes que optam por tal pacto e a necessária estipulação de prazo mínimo para a recuperação do investimento realizado. 2. Nessa perspectiva, o afastamento da multa por descumprimento do prazo de fidelidade previsto no contrato celebrado entre o consumidor e a prestadora dos serviços somente se justifica quando demonstrado que a rescisão contratual se deu por inadimplemento atribuído a esta. 3. No caso concreto, as alegações genéricas da autora não restaram minimamente comprovadas nos autos, ônus que lhe incumbia, nos termos do art. 373 , I , do CPC . 4. A autora recorrente não trouxe aos autos qualquer comprovação de falha no serviço contratado ou mesmo de que tenha manifestado sua insatisfação com o serviço, junto à demandada, antes de proceder à rescisão unilateral do contrato, revelando-se devida a incidência da multa rescisória, em razão da cláusula de fidelidade. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO. ( AC XXXXX-66.2018.8.19.0008 , Des. MAURO PEREIRA MARTINS - Julgamento: 15/03/2021, 13ª CC) APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULA C/C INDENIZATÓRIA. SERVIÇO DE TELEFONIA MÓVEL, INTERNET, CANAL POR ASSINATURA. ALEGAÇÃO DE COBRANÇAS INDEVIDAS NA CONTA. CANCELAMENTO. COBRANÇA DE MULTA POR FIDELIZAÇÃO. ALEGAÇÃO AUTORAL DE COBRANÇA INDEVIDA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. APELO AUTORAL. A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA É FIRME NO SENTIDO DA LEGITIMIDADE DA CLÁUSULA DE FIDELIZAÇÃO,"NA MEDIDA EM QUE SE TRATA DE CONDIÇÃO QUE FICA AO ALVEDRIO DO ASSINANTE, O QUAL RECEBE BENEFÍCIOS POR TAL FIDELIZAÇÃO, BEM COMO POR SER UMA NECESSIDADE DE ASSEGURAR ÀS OPERADORAS DE TELEFONIA UM PERÍODO PARA RECUPERAR O INVESTIMENTO REALIZADO COM A CONCESSÃO DE TARIFAS INFERIORES, BÔNUS, FORNECIMENTO DE APARELHOS E OUTRAS PROMOÇÕES." IMPOSIÇÃO DE PRAZO DE FIDELIDADE QUE SE REVELA LÍCITA, PORQUANTO SUA PRÁTICA É PREVISTA PELA PRÓPRIA ANATEL, EM SUA NORMA GERAL DE TELECOMUNICAÇÕES Nº 23/1.996 E NA RESOLUÇÃO Nº 477/2.007. PARTE AUTORA QUE NÃO LOGROU ÊXITO EM DEMONSTRAR O DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL POR PARTE DA RÉ, TAMPOUCO A OCORRÊNCIA DA FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO, ÔNUS QUE LHE CABIA, NA FORMA DO ART. 373 , I DO CPC . Nessa esteira de raciocínio, diante do conjunto probatório carreado aos autos, forçoso concluir, que a parte Autora não se desincumbiu de provar o fato constitutivo do seu direito, art. 373 , inciso I , do CPC e que não houve falha na prestação do serviço. Dano moral não demonstrado. Assim, correta a sentença de improcedência. Recurso a que se nega provimento. ( AC XXXXX-88.2016.8.19.0002 , Des. CHERUBIN HELCIAS SCHWARTZ JÚNIOR - Julgamento: 09/02/2021, 12ª CC) Dessa forma o que se conclui é que a cobrança se revela abusiva na medida em que não demonstrou a ré haver de fato concedido qualquer tipo de beneficio ao assinante como forma de tornar lícita a exigencia de manutenção durante o período fixado como de "fidelidade" devendo o valor cobrado, assim, ser restituido em dobro. Não fosse suficiente a lei estadual n. 7.872 de 02 de março de 2018, em seu artigo 1º, proibiu a inserção de cláusula de fidelização: Art. 1º - Fica proibida no âmbito estadual a inserção de cláusulas que exijam a fidelização nos contratos prestação de serviços, sob pena de cobrança de multa quando do encerramento do vínculo contratual pelo consumidor no curso do prazo fixado. A constitucionalidade da norma legal foi objeto de apreciação pelo Egrégio Supremo Tribunal Federal que a referendou, confira-se: EMENTA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI Nº 7.872 /2018 DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. FIXAÇÃO DE OBRIGAÇÕES A PRESTADORAS DE SERVIÇOS PÚBLICOS. CLÁUSULA DE PROIBIÇÃO DE FIDELIZAÇÃO. PRELIMINAR. LEGITIMIDADE ATIVA CONFIGURADA. MÉRITO. ALEGADA USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA PRIVATIVA DA UNIÃO PARA LEGISLAR SOBRE EXPLORAÇÃO DE SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES. AFRONTA AOS ARTS. 1º , 21 , IX , 22 , IV , E 175 DA CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA . INOCORRÊNCIA. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE EM MATÉRIA CONSUMERISTA. PRECEDENTES. 1. Legitimidade ativa da Associação Brasileira de Prestadoras de Serviço Telefônico Fixo Comutado (ABRAFIX) e da Associação Nacional das Operadoras Celulares (ACEL). 2. A fidelização contratual consiste em contrapartida exigida do consumidor, em razão de benefícios oferecidos pela prestadora na formação do contrato de prestação de serviços, todavia, não se confunde com esse. A cláusula de fidelidade contratual é autônoma e agregativa ao contrato de prestação de serviço, inserindo-se no espaço comercial das prestadoras, e não no campo regulatório das atividades de caráter público. 3. O objeto da norma estadual impugnada em nada interfere no regime de exploração ou na estrutura remuneratória da prestação dos serviços, tampouco os de telefonia - espécie do gênero telecomunicação, cujo regramento compete, nos termos dos arts. 21 , XI , e 22 , IV , da Carta da Republica , à União, que disciplina a matéria nos arts. 19 , VII , 93 , VII , 103 a 109 e 120 , III , da Lei nº 9.472 /1997. Visando à proteção dos usuários dos serviços na condição de consumidores, cuida isto sim, de relação jurídica tipicamente consumerista, ainda que realizada paralelamente a contrato de prestação de serviço. 4. Implementada norma de proteção ao consumidor que, rigorosamente contida nos limites do art. 24 , V , da Carta Política , em nada interfere no regime de exploração, na estrutura remuneratória da prestação dos serviços ou no equilíbrio dos contratos administrativos, inocorrente usurpação da competência legislativa privativa da União, e, consequentemente, afronta aos arts. 1º , 21 , IX , 22 , IV , e 175 da Constituição da Republica . Precedentes. 5. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente. ( ADI 5963 , Relator (a): ROSA WEBER, Tribunal Pleno, julgado em 29/06/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-232 DIVULG XXXXX-09-2020 PUBLIC XXXXX-09-2020) Resta por fim caracterizado o dano moral em razao das cobranças incessantes e repetidas, a despeito de todas as reclamações levadas a efeito pelo autor conforme protocolos mencionados na petição inicial se revelando razoável a fixação da indenização no valor de R$ 2.000,00. Por esses motivos o VOTO é no sentido de ser conhecido o recurso e a ele ser dado provimento para reformar a sentença e julgar procedente em parte o pedido contido na peça preambular para determinar a inexistencia da dívida referente a "multa de fidelidade" no valor de R$ 168,32 e condenar a ré ao pagamento do valor de R$ 2.000,00 a título de indenização por danos morais com correção monetária dessa data e juros de 1% ao mês a contar da citação. Sem ônus sucumbenciais nos termos do artigo 55 da lei 9.099 /95. Rio de janeiro, 11 de maio de 2022. MAURO NICOLAU JUNIOR Juiz Relator