TJ-CE - Agravo de Instrumento: AI XXXXX20218060000 CE XXXXX-08.2021.8.06.0000
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANO MORAL. IRRESIGNAÇÃO CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DEFERIU A MEDIDA LIMINAR REQUERIDA PELO AUTOR. FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. UNIDADE USUÁRIA CADASTRADA COMO CLIENTE VITAL. CONSUMIDOR PORTADOR DE ENFERMIDADE GRAVE. USO DE APARELHOS QUE NÃO DISPENSAM A UTILIZAÇÃO DE ENERGIA ELÉTRICA. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. REQUISITOS DO ART. 300 DO CPC . PREENCHIDOS. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. DECISÃO MANTIDA. 1. Insurge-se a agravante/ré contra a decisão interlocutória do juízo de origem que deferiu a medida liminar requestada pelo agravado/autor, determinando que a ENEL se abstenha de efetuar a interrupção do fornecimento de energia elétrica na residência do promovente, até o deslinde da ação. 2. Compulsando os fólios, vislumbra-se carta elaborada pela companhia agravante, destinada ao consumidor, informando-lhe que a unidade consumidora está cadastrada com a informação da existência de pessoa que utiliza equipamento vital à preservação da vida humana e dependente de energia elétrica, notificando o promovente de que seu pedido de cadastramento como cliente vital foi deferido. 3. Nas razões do presente Agravo de Instrumento, a própria promovida afirma a impossibilidade de corte no fornecimento de energia em unidades com consumidor eletrodependente, ainda que em razão de inadimplemento. 4. Ademais, há comprovação nos autos do atual estado de saúde do demandante, através de relatório médico que atesta que o paciente é portador de "miocardiopatiadilatada que refere dispnéia aos esforços", havendo diagnóstico de insuficiência cardíaca congestiva. Ainda, repousam nos fólios documentos e fotografias que demonstram que o agravado faz uso de equipamentos elétricos para auxílio da respiração. Destarte, a probabilidade do direito do autor revela-se demonstrada no caderno processual. 5. No que tange ao perigo de dano, este se evidencia a partir da essencialidade do serviço público de fornecimento de energia, mormente no presente caso, que trata de cliente que faz uso de aparelhos que não prescindem de energia elétrica para funcionamento. 6. Na espécie, o perigo na demora resta patente, vez que, caso seja suprimido o serviço na residência do autor, este pode ter seu quadro clínico agravado ou até mesmo correr risco de morte. Assim, devem ser privilegiados o direito à saúde e à vida em detrimento do direito da concessionária em receber, nesse momento, a contraprestação pelo serviço prestado. 7. Segundo o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, "a interrupção da prestação, ainda que decorrente de inadimplemento, só é legítima se não afetar o direito à saúde e à integridade física do usuário. Seria inversão da ordem constitucional conferir maior proteção ao direito de crédito da concessionária que aos direitos fundamentais à saúde e à integridade física do consumidor" (ex vi REsp XXXXX/RS ). 8. Outrossim, não se pode olvidar a boa-fé do requerente, quando, na exordial dos autos principais, reconhece o débito, não questiona sua legitimidade e demonstra interesse em quitar a dívida, razão pela qual ingressou em juízo almejando o parcelamento do montante, à míngua de condições financeiras para o pagamento à vista. A propósito, o promovente não inclui em seus pedidos a abstenção da requerida em incluir seu nome nos cadastros de inadimplentes ou a retirada de apontamentos, mas tão somente o impedimento do corte de energia, a fim de resguardar sua vida e sua saúde, de sorte que restam à ENEL outros meios de cobrança do débito, razão pela qual também não vislumbro o perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão. 9. Recurso conhecido e improvido. Decisão interlocutória mantida. ACÓRDÃO: ACORDAM os Desembargadores integrantes da 2ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, unanimemente, em conhecer e negar provimento ao Agravo de Instrumento interposto, nos termos do voto da e. Relatora.