RECURSO INOMINADO DO ENTE PÚBLICO ESTADUAL. JUIZADO ESPECIAL DA FAZENDA PÚBLICA. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO À SAÚDE. PACIENTE NECESSITA USAR FRALDAS HUGGENS SUPREME CARE, TAMANHO XXG -INFANTIL, 300 FRALDAS POR MÊS, POR TEMPO INDETERMINADO. ESPINHA BÍFIDA (CID: Q 05). INSURGÊNCIA RECURSAL LIMITADA A ALEGAÇÃO DE DIRECIONAMENTO DA CONDENAÇÃO PARA O MUNICÍPIO. DEMAIS CAPÍTULOS DA SENTENÇA ABARCADOS PELO MANTO DA COISA JULGADA. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. Recurso adequado, tempestivo e preparo dispensado, na forma do artigo 1.007 , § 1º do CPC . 2. Alega a parte recorrente que a obrigação de fazer reconhecida nos autos deve ser direcionada ao ente municipal de acordo com a nota técnica adunada às fls. 77/80. 3. Pois bem, restou patente nos autos o direito da autora em receber o insumo pleiteado, haja vista estar acometida da enfermidade espinha bífida (CID: Q 05), conforme fazem prova os documentos de fls. 18 (relatório médico), fls. 14/15 (requerimento administrativo), fls. 20/23 (orçamento) e fls. 118 (relatório médico informando da imprescindibilidade do uso do insumo nos moldes como requerido por ter se verificado a existência de alergia). 4. Apesar de toda argumentação lançada no recurso, entendo que melhor sorte não assiste ao Estado. 5. A Constituição de 1988 , em seu artigo 196 , afirmou que a saúde é direito de todos e dever do Estado, a qual será garantida mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Tal dispositivo define, além do direito fundamental à saúde, a existência do dever solidário de prestação de saúde por parte dos entes públicos. Nesse sentido: Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Art. 198. As ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com as seguintes diretrizes: I - descentralização, com direção única em cada esfera de governo; II - atendimento integral, com prioridade para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; III - participação da comunidade. § 1º. O sistema único de saúde será financiado, nos termos do art. 195, com recursos do orçamento da seguridade social, da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, além de outras fontes. § 2º A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 29 , de 2000). 6. Outrossim, o artigo 23 , inciso II da CF/88 aduz ser de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, cuidar da saúde e assistência pública. 7. Ainda, como bem já prelecionou o Pretório Excelso, “em matéria de saúde pública, a responsabilidade dos entes da Federação deve ser efetivamente solidária, uma vez que a Constituição incorpora o princípio da lealdade à Federação por parte da União, dos Estados e Municípios no cumprimento de suas tarefas comuns. De toda forma, parece certo que, quanto ao desenvolvimento prático desse tipo de responsabilidade solidária, deve ser construído um modelo de cooperação e de coordenação de ações conjuntas por parte dos entes federativos”. 8. Desta feita, havendo solidariedade entre os entes públicos, todos esses integram o Sistema Único de Saúde e possuem responsabilidade solidária pelos serviços e ações na área da saúde. E mais, o polo passivo da demanda pode ser ocupado por qualquer um deles, isolada ou conjuntamente. 9. Neste ponto, insta salientar, ainda, que, tendo em vista que a solidariedade dos entes públicos no que concerne a efetivação do direito à saúde é extraída da Constituição Federal de 1988, não há como concluir interpretação diferente a partir da leitura da Lei n.º 8.080 /90. 10. Assim sendo, uma vez que a responsabilidade entre os entes federativos para a efetivação do direito à saúde é solidária e a reclamante postulou em desfavor do Estado de Sergipe e do município, não há que se falar em direcionamento da obrigação a apenas um ente. 11. Corroborando esse entendimento, já afirmou o Tribunal de Justiça de Sergipe: AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO ORDINÁRIA – TUTELA PROVISÓRIA – EXAME DE RESSONÂNCIA MAGNÉTICA – PRELIMINAR DE PERDA SUPERVENIENTE DO OBJETO ANTE A REALIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO PRETENDIDO – IRREVERSIBILIDADE – INACOLHIMENTO –ARGUIÇÃO DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM DO ESTADO DE SERGIPE QUE FOI DEVOLVIDA NO RECURSO– DEFINIÇÃO QUE SE IMPÕE - DIREITO À SAÚDE - SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES PÚBLICOS - PRECEDENTES DO TJSE - PROCEDIMENTO COBERTO PELO SUS - RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA – MANIFESTAÇÃO DO NAT –URGÊNCIA DA MEDIDA, CALCADA NO PERIGO DE DANO OU RISCO AO RESULTADO ÚTIL DO PROCESSO – PRESENÇA DOS REQUISITOS DO ART. 300 , DO NCPC – MANUTENÇÃO. I -Na hipótese dos autos o pedido de reforma final da decisão interlocutória agravada não requer o indeferimento do exame, mas a exclusão da responsabilidade do Estado de Sergipe pelo custeio, subsistindo o interesse recursal do Agravante, que impõe o conhecimento do Agravo de Instrumento pelo mérito. II - Os entes da federação integram o Sistema Único de Saúde e todos possuem responsabilidade solidária pelos serviços e ações na área da saúde. E como a responsabilidade é solidária e o autor postulou do Estado de Sergipe e do Município de Aracaju a realização do tratamento, portanto, não há que se falar em ilegitimidade do agravante. II – Deve ser concedida a tutela de urgência quando houverem nos autos elementos que evidenciam a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, dispensando-se a caução por ser a parte economicamente hipossuficiente, quando houver possibilidade de reversão da medida. III – Tutela antecipada concedida, para determinar que os requeridos (ESTADO DE SERGIPE E MUNICÍPIO DE ARACAJU) forneçam, de forma urgente, o exame de RESSONÂNCIA MAGNÉTICA DE COLUNA LOMBO SACRA, indicado em relatório médico anexado aos autos, sendo as despesas arcadas pelos requeridos, tendo em vista a necessidade do autor, sob pena de causar-lhe prejuízo irreparável à saúde. Recurso conhecido e improvido. Decisão unânime. (Agravo de Instrumento nº 201700824705 nº único XXXXX-29.2017.8.25.0000 - 2ª CÂMARA CÍVEL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator (a): Alberto Romeu Gouveia Leite - Julgado em 05/02/2018). Grifo nosso. 12. O Superior Tribunal de Justiça também já decidiu no mesmo sentido: PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. SAÚDE. PRESTAÇÃO DE MEDICAMENTOS. LEGITIMIDADE PASSIVA. SOLIDARIEDADE ENTRE OS MEMBROS FEDERATIVOS. 1. É solidária a responsabilidade da União, dos Estados-membros e dos Municípios em ação que objetiva a garantia do acesso a tratamento de saúde, razão pela qual o polo passivo da demanda pode ser ocupado por qualquer um deles, isolada ou conjuntamente. 2. Matéria pacificada pelo STF no julgamento do RE 855.178 - RG/SE, Rel. Ministro Luiz Fux, DJe 16/3/2015, sob o rito da repercussão geral. 3. Recurso especial provido. ( REsp XXXXX/RS , Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 17/08/2017, DJe 23/08/2017). Grifo nosso. PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE - SUS. SOLIDARIEDADE ENTRE OS ENTES FEDERATIVOS. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO QUE NÃO CONSTA NA LISTA DO SUS. EFICÁCIA DO MEDICAMENTO. CONCLUSÃO DO ACÓRDÃO. FATOS E PROVAS. JUÍZO DE VALOR. REVISÃO. SÚMULA 7 /STJ. 1. Constata-se que não se configura a ofensa ao art. 1.022 do CPC/2015 , uma vez que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada. 2. A jurisprudência encontra-se pacificada no sentido de que existe solidariedade entre os entes federativos para as ações que buscam acesso a medicamentos para tratamento de saúde, motivo pelo qual qualquer deles possui legitimidade passiva. 3. O STJ admite o fornecimento de medicamentos não incorporados ao SUS mediante Protocolos Clínicos, quando as instâncias ordinárias verificam a necessidade do tratamento prescrito. ( AgRg no AREsp XXXXX/PE , Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 18/11/2016; STJ, AgRg no AREsp XXXXX/SC , Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 21/8/2015). 4. Rever o entendimento do Tribunal a quo acerca da necessidade do medicamento prescrito ao tratamento da parte recorrida é tarefa que demanda revolvimento fático-probatório, o que é vedado no âmbito do Recurso Especial (Súmula 7 /STJ). 5. Recurso Especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido. ( REsp XXXXX/PE , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 25/04/2017, DJe 05/05/2017). Grifo nosso. 13. Assim, sem maiores digressões, tendo em vista que os entes da federação, integrantes do Sistema Único de Saúde, são solidariamente responsáveis pela efetivação do direito à saúde, entendo que a demanda fora corretamente proposta, inclusive com a condenação de ambos os entes federados. 14. Ante o exposto, deve o presente recurso inominado ser CONHECIDO e DESPROVIDO, mantendo-se a sentença incólume em todos os seus termos, inclusive consectários legais, conforme o artigo 46 , parte final, da Lei 9.099 /95. 15. Sem condenação ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, conforme art. 55 , segunda parte da Lei 9.099 /95, subsidiariamente aplicado ao rito do Juizado da Fazenda Pública, por força do art. 27 da Lei 12.153 /2009 c/c art. 85 , § 3º , inciso I , do CPC . ams (Recurso Inominado Nº 202001007606 Nº único: XXXXX-82.2019.8.25.0001 - 2ª TURMA RECURSAL, Tribunal de Justiça de Sergipe - Relator (a): Livia Santos Ribeiro - Julgado em 29/10/2020)