TRF-1 - RECURSO CONTRA SENTENÇA DO JUIZADO CÍVEL: AGREXT XXXXX20204013500
V O T O / E M E N T A ADMINISTRATIVO. AUXÍLIO MORADIA. RESIDÊNCIA MÉDICA. ALOJAMENTO. LEI 12.510 /2011. RESPONSABILIDADE DA INSTITUIÇÃO DE SAÚDE. INSTITUIÇÃO FEDERAL, VINCULADA À UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS. ILEGITIMIDADE PASSIVA DA UNIÃO. LEGITIMIDADE PASSIVA DA UFG. RECURSO DA UNIÃO PROVIDO. RECURSO DA UFG NÃO PROVIDO. 1. Cuida-se de recursos interpostos pela UFG e pela UNIÃO contra sentença que julgou parcialmente procedente a pretensão vestibular, condenando as rés ao pagamento do auxílio-moradia à parte autora tal como estabelecido na Lei 6.932 /81, arbitrado no percentual de 30% sobre o valor bruto mensal da bolsa-auxílio, durante o período de residência médica. 2. A UFG alega ausência de interesse processual, haja vista a inexistência de pedido administrativo. No mérito, assevera que o dever de disponibilizar moradia aos médicos residentes depende de regulamentação, ainda inexistente no âmbito da instituição de ensino e, diante de ausência de previsão legal e face à submissão da administração ao principio da legalidade, é impossível se fazer o pagamento do auxílio moradia à parte autora e que na hipótese de ser entendido devido o benefício, a parte autora deverá comprovar as despesas a título de moradia. 3. A UNIÃO, por sua vez, sustenta ser parte ilegítima para a causa, pois a parte autora não possui qualquer vínculo com a Administração Pública Direta. No mérito, afirma que o auxílio-moradia ao médico residente não se trata de auxílio pecuniário, mas de concessão de moradia a ser ofertado pela instituição de saúde responsável pelo programa de residência médica e que a norma legal aplicável ao caso é expressa no sentido de que a instituição de saúde responsável pelo programa de residência médica deverá oferecer ao médico-residente moradia, conforme estabelecido em regulamento, cabendo à própria instituição estabelecer a forma como irá proporcionar a moradia aos seus residentes, mediante regulamentação específica da matéria. 4. Afasto de início, a preliminar aventada pela UFG. Segundo entendimento do STF, é dispensado o prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à pretensão da parte autora, o que no caso em tela se evidencia pela alegação da própria ré de não haver regulamentação a autorizar o pagamento da verba pleiteada. 5. A autora é médica residente matriculada no Programa de Residência Médica do Hospital das Clínicas da UFG, unidade de saúde vinculada à Universidade Federal de Goiás, tendo sido aprovada no processo seletivo aberto pelo Edital nº 01/2017 COREME - UFG, cujo vínculo foi iniciado em 02/03/2018, com previsão de término em 28/02/2021, recebendo bolsa no valor de R$ 3.340,43 (três mil trezentos e quarenta reais e quarenta e três centavos). A contraprestação (bolsa) é paga integralmente pelo Ministério da Saúde. 6. O art. 4º , § 5º , inciso III , da Lei 6.932 /81, estabelece que a instituição de saúde responsável por programas de residência médica oferecerá moradia ao médico-residente, durante todo o período de residência. Precedentes do STJ, na interpretação do art. 4º , § 5º , da Lei 6.932 /1981, impõem às instituições de saúde responsáveis por programas de residência médica o dever de oferecer aos residentes alimentação e moradia no decorrer do período de residência. Vejamos:ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. MÉDICOS-RESIDENTES. DIREITO A ALIMENTAÇÃO E ALOJAMENTO/MORADIA. INÉRCIA ADMINISTRATIVA. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO EM PECÚNIA. DIVERGÊNCIA QUE NÃO SUBSISTE. AUSÊNCIA DE CABIMENTO DOS EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. SÚMULA 168 DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. O art. 4o . da Lei 6.932 /81 assegura que as instituição de saúde responsáveis por programas de residência médica tem o dever legal de oferecer aos residentes alimentação e moradia no decorrer do período de residência. Assim existindo dispositivo legal peremptório acerca da obrigatoriedade no fornecimento de alojamento e alimentação, não pode tal vantagem submeter-se exclusivamente à discricionariedade administrativa, permitindo a intervenção do Poder Judiciário a partir do momento em que a Administração opta pela inércia não autorizada legalmente. 2. Ancorada nesses princípios, esta Corte reformou sua orientação jurisprudencial consolidando a orientação de que a simples inexistência de previsão legal para conversão de auxílios, que deveriam ser fornecidos in natura, em pecúnia não é suficiente para obstaculizar o pleito recursal. Precedente: REsp. XXXXX/RS , Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, 2T, DJe 07.03.2013. 3. Se não mais subsiste a alegada divergência jurisprudencial, revelam incabíveis os Embargos de Divergência, a teor da Súmula 168 do STJ, segundo a qual não cabem Embargos de Divergência quando a jurisprudência do Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão embargado. 4. Agravo Regimental do ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL desprovido. (AgRg nos E REsp XXXXX/RS , Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/10/2015, DJe 22/10/2015) ADMINISTRATIVO. MÉDICO RESIDENTE. AUXÍLIO-MORADIA. LEI 6.932 /1981. TUTELA ESPECÍFICA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. ADMISSIBILIDADE. PRECEDENTE. 1. Trata-se, originariamente, de Ação Ordinária que debate a concessão de auxílio-moradia a médicos residentes. Houve denunciação da lide à União. A sentença de improcedência de ambas as pretensões foi mantida pelo Tribunal de origem. 2. Precedente do STJ, na interpretação do art. 4º , § 4º , da Lei 6.932 /1981, impõe às instituições de saúde responsáveis por programas de residência médica o dever de oferecer aos residentes alimentação e moradia no decorrer do período de residência. A impossibilidade da prestação da tutela específica autoriza medidas que assegurem o resultado prático equivalente ou a conversão em perdas e danos - CPC , art. 461 ( REsp XXXXX/RS , Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 15.6.2009) . 3. A fixação de valores do auxílio pretendido demanda investigação de elementos fático-probatórios. 4. Recurso Especial provido, determinando o retorno dos autos à origem a fim de que estabeleça valor razoável que garanta resultado prático equivalente ao que dispõe o art. 4º , § 4º , da Lei 6.932 /81. ( REsp XXXXX/RS , Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/02/2013, DJe 07/03/2013) 7. A jurisprudência dos Tribunais Federais caminha no mesmo sentido, atribuindo legitimidade passiva à instituição responsável pela residência médica:"Reconheço a legitimidade passiva da UFGSPA para figurar no polo passivo da demanda, pois é a instituição responsável pelo Programa de Residência Médica do qual a parte autora participou no período de 01/03/2015 a 28/02/2017 (1-OUT3, 1-OUT4 e 21-OUT2) e, por conseguinte, pelo pagamento do auxílio-moradia." (TRF4 - Recurso Cível: XXXXX20194047100 RS , Relator: GIOVANI BIGOLIN, Data de Julgamento: 29/01/2021, 5ª Turma Recursal do RS) ADMINISTRATIVO. FUB. PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA. MORADIA E ALIMENTAÇÃO. ART. 4º , § 5º , II e III , DA LEI Nº 6.932 /81 COM REDAÇÃO ALTERADA PELA LEI Nº 12.514 /11. DESCUMPRIMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E CONVERSÃO EM PECÚNIA. RECURSO DESPROVIDO. 1. Recurso da FUB contra sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para lhe condenar a pagar à parte autora o valor de R$ 15,00 (quinze reais) por dia de atividade e 30% (trinta por cento) do valor de sua bolsa de estudos por mês a título de moradia. Ambos desde o início do Programa de residência em 10/03/2014. 2. Alega a FUB, em suma, que o juízo a quo criou vantagem não prevista em lei, sem previsão de custeio, em desacordo com o posicionamento do STF, que veda a extensão de vantagem com fundamento na isonomia pela interpretação da Súmula nº 339 . 3 . Os incisos II e III , do § 5º , do art. 4º da lei nº 6.932 /81, com redação alterada pela lei nº 12.514 /11, prescreve que a instituição de saúde responsável por programas de residência médica oferecerá ao médico-residente, durante todo o período de residência: I- (...) II- alimentação; e III- moradia (...). 4. Não merece prosperar o recurso da FUB, o qual lança razões genéricas e dissociadas, com invocação, ad exemplum, do princípio do art. 37 da Constituição Federal (legalidade), deixando, porém, de impugnar, à luz do caso concreto e de forma específica, a fundamentação da sentença, bem como não logrou êxito em demonstrar fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor, que no caso dos autos consubstancia-se na comprovação de fornecimento da referida alimentação e moradia. 5. Ao contrário, no caso dos autos, ressuma comprovado o fato que União não forneceu a alimentação e a moradia ao autor, conforme ordenado pela legislação, neste sentido bem dispôs a sentença do juízo a quo: O artigo 4º , § 5º , II , da lei nº. 6.932 /81 garante ao médico-residente, durante todo o período, a alimentação. Tendo em vista a documentação acostada na inicial comprovando o não recebimento, corroborada com a omissão na contestação da FUB acerca do pagamento, compensação, fornecimento in natura ou qualquer forma de defesa em relação a este pedido, concluo que o autor tem razão. Aliás, a própria TNU no PEDILEF XXXXX71500280550 RS e o STJ vêm decidindo que são devidos aos residentes, alojamento e alimentação pelo Poder Público, configurando violação a direito a omissão ou recusa da instituição. Não se está aqui obrigando o Poder Público conceder gratificação ou Auxílio- alimentação. A alimentação garantida por lei federal não é monetária, e sim, in natura, disponibilizada por refeições no próprio estabelecimento da instituição. Assim, afasto liminarmente qualquer alegação de violação ao Princípio da Legalidade, pois o Judiciário só está garantindo o que a lei desde 2011 determinou às instituições de saúde. Porém, vez descumprida a obrigação de fazer, a mesma deverá ser convertida em pecúnia em valor razoável que garanta um resultado prático equivalente. Pede o autor, o importe de R$15,00 por dia. Tal valor é razoável e garante o resultado prático equivalente da omissão do Poder Público em conceder alimentação aos residentes. Em relação ao Auxílio-moradia, o artigo 4º , § 5º , III , da lei nº. 6.932 /81 garante ao médico-residente, durante todo o período, conforme estabelecido em regulamento. Os recibos de pagamentos encartados com a petição inicial comprovam que não houve pagamento ou concessão de moradia ao residente. Na mesma esteira das decisões uniformizantes da TNU e do STJ, entendo que a moradia é devida. Apesar da ressalva legal que a moradia será concedida conforme o regulamento, é certo que o beneficiário não pode ficar a mercê da instituição para poder pleitear seu direito. Não se trata de norma de eficácia limitada ou contida, e sim de resguardo de aplicação a regulamento interno. Aliás, a moradia foi incluída na legislação em 2011. A contestação não trouxe qualquer Regulamento para este direito, sendo irrazoável acreditar que após 6 (seis) anos de imposição sequer houve movimentação para o cumprimento da lei. Pior ainda a situação, quando demonstrado que outros Hospitais, da mesma Região do DF, demandados pela mesma Secretaria, com estrutura e concursos idênticos pagam a seus residentes auxílio e a FUB se omite em tal obrigação. Conforme ressaltei anteriormente, não se está obrigando a Fundação autarquica conceder Auxílio-moradia, que seria de fato, valor pecuniário. E sim, somente, conceder moradia aos residentes, na esteira do que o regulamente, presente ou futuro, determinar. Diferente do alegado em contestação, não se está criando direito, infringindo a legalidade ou normas financeiras, está garantindo que a FUB realize (obrigação de fazer) o que a lei determinou. A substituição da moradia por valor pecuniário é decorrente do descumprimento da obrigação de fazer e garantia do resultado prático equivalente. Aliás, em nada altera as regras previstas na lei nº. 8.112 /90, pois são regimes jurídicos diversos, sendo que a causa de pedir em epígrafe, é regida por legislação específica, não seguindo as regras da lei geral do funcionalismo federal. Em defesa, a FUB aduz que a moradia visa atender alunos carentes ou que não possuem residencia na cidade. Pois bem, se tal preceito é verdadeiro, por qual motivo não juntou o regulamento para este fim. O Regulamento pode criar condições ou regras para o desfruto do benefício, eis que discutido e planejado, na presença de um Conselho. Vez inexistente, não pode, por ausência de previsão legal (sentido lato), suprimir direitos. (...) Pede o autor, o importe de 30% da bolsa de estudos. Tal valor é razoável e garante o resultado prático equivalente da omissão do Poder Público, pois é idêntico ao recebido pelos outros residentes nos Hospitais de Brasília. 6. Pelo exposto, não tendo sido fornecida a alimentação e a moradia ao Autor, o pagamento da indenização é medida que se impõe. 7. Recurso desprovido. 8. Honorários advocatícios devidos pela parte recorrente, fixados em 10% (dez por cento) do valor da condenação.(AGREXT XXXXX-67.2015.4.01.3400 , ALEXANDRE VIDIGAL DE OLIVEIRA, TRF1 - TERCEIRA TURMA RECURSAL - DF, Diário Eletrônico Publicação 06/04/2018.) 8. Acrescente-se, ainda, que eventual financiamento de bolsas de residência médica pelo Ministério da Educação e Cultura não tem o condão de tornar o ente federal igualmente responsável pelo custeio do auxílio-moradia, porquanto a Lei é expressa ao atribuir a responsabilidade à instituição responsável pelo programa de residência médica. Nada mais natural que a instituição responsável por ministrar a residência médica seja aquela a quem a norma atribua o dever de fornecer alojamento aos estudantes médicos ou, caso não o faça, efetue a necessária compensação pecuniária. 9. Dessa forma, reconheço a ilegitimidade da União para figurar no polo passivo da lide e a legitimidade passiva da Universidade Federal de Goiás, que deve ser condenada ao pagamento das verbas pretendidas no presente feito. 10. Recurso da UNIÃO a que se dá provimento. Recurso da UFG a que se nega provimento. Sentença reformada, apenas para reconhecer a ilegitimidade passiva da UNIÃO e determinar sua exclusão do polo passivo. Os demais termos da sentença permanecem inalterados. 11. Condeno a UFG ao pagamento de honorários advocatícios, ora fixados em 10% do valor da condenação (art. 85 , § 3º , inciso I , e § 11 , do CPC ).