TJ-GO - XXXXX20148090164
EMENTA: APELAÇÃO CRIMINAL. AÇÃO PENAL PRIVADA. CRIMES DE DIFAMAÇÃO E INJÚRIA. TEORIA DA PROTEÇÃO DÉBIL DO HOMEM PÚBLICO. LIBERDADE DE EXPRESSÃO E MANIFESTAÇÃO DO PENSAMENTO. AUSÊNCIA DE ANIMUS DIFAMANDI E INJURIANDI. SENTENÇA MANTIDA. 1. DA ADMISSIBILIDADE. 1.1. Recurso próprio e tempestivo, motivo pelo qual merece ser conhecido. 2. DOS FATOS E DO DIREITO. 2 .1. Cuida-se de ação penal privada, por meio da qual imputa-se ao apelado a prática dos crimes de difamação e injúria (arts. 139 e 140 , ambos do Código Penal ), com a seguinte dinâmica: ?que o querelado difamou e injuriou a querelante através da afixação de adesivo no vidro traseiro do veículo fiat/pálio, cor vermelha, placa JHF- 8097, de sua propriedade, com os seguintes dizeres: ?OCIDENTAL É 100, 100 ÁGUA, 100 LUZ, 100 ASFALTO, ÊITA PREFEITA 100 VERGONHA??; a sentença julgou improcedente o pedido inicial, para absolver o querelado nos termos do art. 386 , III , do Código de Processo Penal ; na apelação, apelante aduziu que os adesivos visaram atingir sua dignidade, já que o apelado tinha conhecimento de que o município não é o responsável por questões relacionadas ao abastecimento de água e rede de energia elétrica, e que por isso, o fato não pode ser compreendido como normais ou naturais, conforme concluiu a sentença, vez que presente o dolo específico na conduta (animus difamandi). Quanto ao crime de injúria, sustentou que a conduta do querelado visou atingir sua honra e denigrir sua imagem, vez que as frases dos adesivos são de baixo calão, com o nítido propósito de injuriá-la, tanto que a deixou abalada, e pugnou pela reforma da sentença. 2 .2. No caso sub judice, restou apurado na audiência de instrução e julgamento que o apelado afixou em seu veículo adesivos com o intuito de externar sua irresignação com a gestão da apelante (que a época era prefeita da cidade Ocidental-GO) e, com esse propósito, elaborou as frases que adesivou: ?OCIDENTAL É 100, 100 ÁGUA, 100 LUZ, 100 ASFALTO, ÊITA PREFEITA 100 VERGONHA?. Nesse ponto, cumpre esclarecer se o sentimento externado está na linha da liberdade de expressão e manifestação do pensamento garantidos constitucionalmente ? liberdade com responsabilidade ?, ou se o ajuizamento do feito configura censura à liberdade do pensamento. 2 .3. Na espécie, são duas as imputações de crime que pesam contra o apelado, difamação do art. 139 , e injúria do 140, c/c art. 141 , incs. II e III (causa de aumento de pena), c/c art. 69 , todos do CP . É cediço que as duas modalidades criminosas requerem a presença do elemento subjetivo específico do tipo (animus diffamandi vel injuriandi). Nessa diretriz é o magistério de Cléber Masson : ?é unânime a doutrina ao afirmar que não basta praticar a conduta descrita pelo tipo penal de cada um dos crimes contra a honra. É necessário, além do dolo, um especial fim de agir (teoria finalista = elemento subjetivo do tipo ou elemento subjetivo do injusto; teoria clássica = dolo específico), considerada a intenção de macular a honra alheia. É o que se convencionou chamar de animus diffamandi vel injuriandi? (Direito Penal Esquematizado. Parte Especial. Vol. 2. 5ª Edição. Editora Método Gen. São Paulo ). 2 .4. O conjunto probatório revela que o apelado limitou-se a externar, com tom de crítica, e por meio da adesivação do seu veículo, as impressões que tem da gestão municipal (animus criticandi), tanto que a frase imputada de delituosa faz referência ao cargo da agente político criticada (prefeita), e não à pessoa da querelante, ora apelante, máxime porque antecedida de indicação de omissões de atos de governo que justificam as críticas, de modo que é aplicável, in casu, a teoria da proteção débil do homem público, amparada por construção doutrinária e jurisprudencial. Confira-se, nesse sentido, excertos dos seguintes precedentes: ?A ?teoria da proteção débil do homem público? estabelece que as pessoas ocupantes de atividades públicas fazem jus à proteção à honra de forma atenuada e em menor latitude que as demais pessoas, pois estão mais sujeitas a um controle rígido da sociedade, pela natureza da atividade que livremente escolheram. A veiculação de opiniões contrárias, mesmo que consubstanciadas em severas críticas às propostas e atos de governo não configura conduta apta ser sancionada pelo aparato Estatal. Não demonstrada a divulgação de mensagem capaz de violar a honra e dignidade do candidato, imperiosa é a improcedência da demanda ajuizada? (TRE-GO - RE: 10378 GO IANIRA - GO, Relator: FABIANO ABEL DE ARAGÃO FERNANDES , Data de Julgamento: 28/08/2017, Data de Publicação: DJ - Diário de justiça, Tomo 162, Data 06/09/2017, Página 23/27). O TJGO adota idêntico entendimento: ?De acordo com a Teoria da Proteção Débil do Homem Público, a tutela da honra do ocupante de cargo público deve ser abrandada devido a natureza das suas atividades, estando o agente político mais suscetível de eventuais críticas a seus posicionamentos e posturas profissionais, críticas essas que visam o aperfeiçoamento da função pública ocupada e legitimação da forma democrática de governo? ( APELAÇÃO CRIMINAL XXXXX-18.2014.8.09.0029 , Rel. DES. CARMECY ROSA MARIA A. DE OLIVEIRA , 2A CÂMARA CRIMINAL, julgado em 21/07/2016, DJe 2079 de 01/08/2016. 2 .5. Resulta evidente, portanto, que devido a apelante ser prefeita da Cidade Ocidental-GO, da qual o apelado é munícipe, está sujeita a críticas e opiniões contrárias a seus atos de gestão praticados no exercício das funções que lhe foram confiadas e, tendo o apelado se limitado a criticá-la em sua atuação funcional, sem a intenção de ofendê-la em sua honra objetiva e/ou subjetiva, forçoso reconhecer que seu comportamento não ultrapassou os limites da liberdade de expressão e manifestação do pensamento, insculpidos no art. 5º, incisos IV e IX, da CF/88, inexistente, por conseguinte, o animus diffamandi vel injuriandi, de modo que a sentença absolutória não merece qualquer censura. 3. DO DISPOSITIVO. 3 .1. Recurso conhecido e desprovido para manter inalterada a sentença combatida. 3 .2. Custas, ex lege, pela apelante.