TJ-RJ - APELAÇÃO: APL XXXXX20138190007 RIO DE JANEIRO BARRA MANSA 1 VARA CIVEL
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO SUBJETIVO À EDUCAÇÃO. ALUNO REGULARMENTE MATRICULADO NA REDE MUNICIPAL DE ENSINO, PORTADOR DE NECESSIDADES ESPECIAIS. INDISPENSABILIDADE DE ACOMPANHAMENTO POR PROFISSIONAL CAPAZ DE AUXILIÁ-LO NO PROCESSO DE APRENDIZAGEM. DESPROVIMENTO DO RECURSO. 1. Cuida-se de ação de preceito cominatório cumulada com indenizatória, em que pretende o autor, menor portador de autismo na forma de síndrome de asperger, à disponibilização pelos réus de acompanhante durante o ano letivo na rede municipal de ensino em que está matriculado, de forma a lhe auxiliar no processo de aprendizagem e, por conseguinte, permitir o desenvolvimento de suas potencialidades. 2. A sentença julgou parcialmente procedente o pedido formulado em face do Município de Barra Mansa para, confirmando a decisão antecipatória, determinar que os réus providenciem acompanhante para o autor, durante toda a vida escolar do mesmo, diariamente, durante o período em que estiver matriculado na instituição de ensino. 3. A Constituição Federal (art. 227) dispõe que é dever da família, da sociedade e do Estado, assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito a educação, além de colocá-los a salvo de qualquer discriminação. 4. De acordo com a Lei nº 8069 /90 ( ECA ), é dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente atendimento educacional especializado aos portadores de deficiência, preferencialmente na rede regular de ensino (art. 54, III). 5. A Lei nº 9394 /96, em seu art. 58 , § 1º , estabelece que haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular, para atender às peculiaridades da clientela de educação especial. 6. A Lei nº 12.764 /2012, que instituiu a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com Transtorno do Espectro Autista, assegurou à efetiva integração do estudante à vida em sociedade, garantindo-lhe acesso à educação especial, principalmente no tocante a sua permanência e aprendizagem, de forma a concretizar, assim, os preceitos fundamentais. 7. É dever do Estado assegurar o direito da pessoa com transtorno do espectro autista, em sistema educacional inclusivo, garantida a transversalidade da educação especial desde a educação infantil até a educação superior, nos exatos termos do artigo 4º , do Decreto nº 8368 /2014, que regulamentou o a Lei 12.764 /2012. 8. Bem de ver que a Lei nº 12.674, de 27/12/2012, em seu art. 3º, parágrafo único, preceitua expressamente que "em casos de comprovada necessidade, a pessoa com transtorno do espectro autista incluída nas classes comuns de ensino regular, nos termos do inciso IV do art. 2º, terá direito a acompanhante especializado". 9. Cotejo probatório evidenciando que o autor apresenta comportamento de espectro autista, na forma de síndrome de asperger, necessitando de acompanhante em sala de aula para viabilizar a superação das dificuldades enfrentadas quanto à organização de tarefas de acordo com seu nível de aprendizagem, estímulo no seu progresso, bem como incentivo no contato/interação com outras crianças. 10. Estando o direito à educação capitulado como essencial ao desenvolvimento do menor, se afigurando um direito subjetivo da criança, compete ao poder público garantir sua efetivação, mediante a adoção de políticas públicas capazes de atender a população menos favorecida, assegurando o acesso à escola pública do menor portador de transtorno do espectro autista, em igualdade de condições com as demais crianças. 11. A dignidade da pessoa humana se constitui fundamento do Estado Democrático de Direito, servindo de parâmetro de interpretação e orientação para todo o ordenamento jurídico. 12. A Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 , consagrando o valor da dignidade humana como vetor axiológico da nova ordem jurídica instalada, assumiu a tarefa de promoção efetiva da igualdade social, por intermédio da adoção de políticas públicas interventivas, impondo ao Estado o cumprimento de prestações positivas como forma de apaziguar a desigualdade existente e dar efetividade aos direitos fundamentais. 13. É certo que os direitos prestacionais materiais estão sujeitos a existência de recursos públicos para satisfazê-los, encontrando-se dependentes da conjuntura econômica vigente no momento, estando, assim, submetidos à reserva do possível, de forma a impedir a imediata efetivação do comando inserido no texto constitucional . 14. Contudo, a cláusula de reserva do possível não pode conduzir à ineficácia dos direitos sociais, sendo imperiosa a necessidade de preservação da integridade e intangibilidade do núcleo consubstanciador do mínimo existencial necessário a uma existência digna e à própria sobrevivência do indivíduo. 15. Nesse passo, a recusa do município não se mostra legítima, cabendo ao Poder Judiciário zelar pela efetivação dos direitos fundamentais. 16. Encontrando-se à Administração Pública sujeita ao princípio da legalidade, a ela compete assegurar o direito de acesso à educação dos portadores de necessidades especiais, disponibilizando acompanhante especializado nas classes comuns de ensino regular da rede pública. 17. No que tange à existência de reciprocidade tributária para isenção da taxa judiciária (art. 115 do CTE e Aviso 13/2011 do TJRJ), o Município de Barra Mansa deve comprovar a existência de lei municipal que estabeleça a isenção de taxas e contribuições relacionadas ao patrimônio do Estado do Rio de Janeiro, por meio da exibição do texto publicado em órgão oficial, bem como deve comprovar a vigência da referida norma, por meio de certidão emitida pela respectiva Casa Legislativa, hipótese não evidenciada nos autos. 18. Recurso desprovido.