Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO PRIMEIRA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 RECURSO INOMINADO Nº XXXXX-37.2020.8.05.0001 RECORRENTE: INA DE OLIVEIRA SILVA BARROS ADVOGADO: LUIZ BRITO DE SANTANA JUNIOR RECORRIDO: LOJAS RENNER S/A ADVOGADO: RICARDO LOPES GODOY JUÍZO DE ORIGEM: 8ª VSJE DO CONSUMIDOR DE SALVADOR JUIZ RELATOR: ALBÊNIO LIMA DA SILVA HONORIO EMENTA RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. VÍCIO DO SERVIÇO. ALEGAÇÃO DE NÃO ENTREGA DE PRODUTO E NÃO ESTORNO DO VALOR PAGO. SENTENÇA QUE JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS CONDENANDO A RÉ A RESTITUIR OS VALORES PAGOS PELA COMPRA. RECURSO DA AUTORA, OBJETIVANDO O PAGAMENTO DE INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. DANO MORAL CONFIGURADO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RELATÓRIO Tratam-se de recursos inominados interpostos contra a sentença prolatada no processo em epígrafe nos seguintes termos: ¿Do conjunto probatório, verifica-se que, de fato, a Autora adquiriu os produtos no site da empresa acionada, em 03/06/2020, e, em 08/06/2020, a compra foi cancelada, de forma imotivada e unilateral. Do e-mail de cancelamento, observa-se que foi disponibilizado um link para esclarecer sobre o cancelamento e formas de devolução, negando, a Demandante, que tenha recebido o valor. Constata-se, ainda, que o valor foi devolvido em vale-troca, que a Ré diz ter sido feito após o contato da Autora, prova não trazida aos autos. Ocorre que, à míngua de provas de que foi opção da Autora a restituição do valor em vale-compra, uma vez que a Acionada não trouxe provas suficientes nesse sentido e a Demandante nega a restituição, ratificando os termos da inicial em audiência, tem-se por abusiva a prática de devolução em tal modalidade, pois contrária às normas protetivas de consumo. Uma vez cancelada a compra, não pode a empresa impor, à consumidora, que tenha o valor indenizado mediante crédito a ser gasto na plataforma que disponibiliza, pois retira, inclusive, à liberdade em adquirir os mesmos produtos não entregues em loja diversa. Outrossim, a opção não tem respaldo legal, visto que inexistente a previsão no art. 35 , CDC , que dispõe sobre as opções, do consumidor, quando a proposta não é cumprida: Art. 35. Se o fornecedor de produtos ou serviços recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: I - exigir o cumprimento forçado da obrigação, nos termos da oferta, apresentação ou publicidade; II - aceitar outro produto ou prestação de serviço equivalente; III - rescindir o contrato, com direito à restituição de quantia eventualmente antecipada, monetariamente atualizada, e a perdas e danos. Nesse passo, sem provas satisfatórias de que foi opção da Demandante a forma de restituição, faz jus, à Promovente, ter acolhido parcialmente o seu pedido de reparação material, para ter o valor da compra, na forma simples, acolhido. Não há, na hipótese, que falar em restituição na forma do art. 42 , parágrafo único , CDC , pois não há provas de má-fé da fornecedora a justificar a incidência. DOS DANOS MORAIS Quanto ao pleito de indenização por danos morais, entendo que não merece prosperar. Tal indenização depende da comprovação do efetivo abalo anímico, o que não restou configurado nos autos. Não há provas de ter sido, a Autora, submetida a qualquer situação vexatória, humilhante ou que tenha despendido tempo e esforço além do necessário para a solução da questão, uma vez que, ao apresentar a sua postulação em juízo, não fez prova nesse sentido. Deve-se considerar, ainda, que o bem não é essencial pelo que a frustração da compra se inseriu no contexto dos problemas comuns de relações consumeristas modernas, em especial, as compras online. Acautele-se, nesse ponto, que nem mesmo considerando o momento pandêmico há como chegar a conclusão diversa, pois, embora o álcool em gel tenha ganhado papel de destaque, se ele fosse primordial e imediato, poderia ter sido adquirido em qualquer farmácia, que não teve as atividades em momento algum suspensa. Há muito a jurisprudência, evitando a banalização do instituto do dano moral, consolidou o entendimento de que mero descumprimento contratual não gera danos extrapatrimoniais. Configura, na verdade, mero dissabor do cotidiano, transtornos comuns da sociedade moderna, não sendo capaz de lesionar os direitos da personalidade do consumidor. Ora, não havendo comprovação de lesão a direitos da personalidade, incabível falar-se em indenização por danos morais. Sérgio Cavalieri Filho ensina que ¿em sentido estrito dano moral é violação do direito à dignidade¿. O eminente jurista afirma também que em sentido amplo dano moral é ¿violação dos direitos da personalidade¿, abrangendo ¿a imagem, o bom nome, a reputação, sentimentos, relações afetivas, as aspirações, hábitos, gostos, convicções políticas, religiosas, filosóficas, direitos autorais¿ (Programa de Responsabilidade Civil, 9ª ed. São Paulo: Editora Atlas S/A. 2010, páginas 82 e 84). Com efeito, ¿só deve ser reputado como dano moral a dor, vexame, sofrimento ou humilhação que, fugindo à normalidade, interfira intensamente no comportamento psicológico do indivíduo, causando-lhe aflições, angústia e desequilíbrio em seu bem-estar. Mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral, porquanto, além de fazerem parte da normalidade do nosso dia a dia, no trabalho, no trânsito, entre amigos e até no ambiente familiar, tais situações não são intensas e duradouras, a ponto de romper o equilíbrio psicológico do indivíduo. Se assim não se entender, acabaremos por banalizar o dano moral, ensejando ações judiciais em busca de indenizações pelos mais triviais aborrecimentos¿ (obra antes referida, pág. 87). A jurisprudência vem consagrando que mero dissabor ou aborrecimento não é suficiente para ensejar indenização por dano moral. No mesmo sentido, os seguintes precedentes do Egrégio STJ: REsp XXXXX/AM , REsp XXXXX/RJ , REsp XXXXX/RN . Nas relações econômicas e sociais modernas, alguns fatos da vida não ultrapassam a barreira de simples transtornos e dissabores, os quais, embora desagradáveis, não têm relevância suficiente para caracterizar o dano moral indenizável, porquanto não repercutem na esfera íntima e nos direitos de personalidade da pessoa. Por certo, o transtorno vivenciado pela parte autora, conquanto desagradável, é insuficiente para caracterizar dano extrapatrimonial, posto que se traduz em mero dissabor ou aborrecimento, afastando pretensão indenizatória. CONCLUSÃO Do exposto, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação, para EXTINGUIR o processo, com resolução do mérito, com fulcro no art. 487 , I , CPC , e CONDENAR a Ré a pagar, à Autora, a importância de R$ 68,80 (sessenta e oito reais e oitenta centavos), devidamente corrigida monetariamente à data da compra, e acrescida de juros de 1% ao mês, a partir da citação.¿ Sorteados, coube-me a função de relatar, cujo voto ora apresento com fundamentação sucinta. É breve o relatório. VOTO Requisitos de admissibilidade preenchidos. No mérito, a sentença hostilizada deve ser parcialmente confirmada, nos termos do art. 46 da Lei nº 9.099 /95, servindo de acórdão a súmula do julgamento, comportando reforma apenas no ponto atinente à indenização por danos morais Restou comprovada a não entrega do produto adquirido pela parte autora conforme bem pontuado pelo juízo sentenciante. Assim, havendo falha na prestação de serviço nasce o dever de reparar. Por tais motivos, penso que, está configurado e provado os danos morais alegados pelo Autor e voto no sentido de dar provimento ao recurso do consumidor. A compensação por danos morais, deve ser apta ao cumprimento de um duplo papel, qual seja reparatório e punitivo-pedagógico, devendo a fixação dos danos morais observar a extensão do dano ocasionado, o potencial econômico do agente causador da lesão, além da observância aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Em relação ao quantum indenizatório, levando-se em consideração os fatos narrados e o comportamento das Rés, penso que o valor de R$ 1.500,00, está adequado e atende os critérios acima mencionados. Ante o exposto, voto no sentido de CONHECER O RECURSO E DAR-LHE PARCIAL PROVIMENTO, para condenar a Ré ao pagamento de indenização por danos morais no valor de R$ 1.000,00 (mil reais), valor esse que deverá ser devidamente atualizado na forma da Súmula 362 do STJ, e acrescido de juros de mora a partir da citação. Sem custas nem honorários, ante o resultado. ALBÊNIO LIMA DA SILVA HONÓRIO Juiz de Direito Relator