jusbrasil.com.br
30 de Abril de 2024

Justiça não encontra provas e inocente Júlio Uemura

Publicado por JurisWay
há 14 anos
0
0
0
Salvar

José Ribamar Trindade

Redação 24 Horas News

O empresário Kazuyoshi Uemura, também conhecido como Júlio Uemura, de 60 anos, foi inocentado pela juíza Edleuza Sorgetti Monteiro da Silva, da 6ª Vara Cível de Cuiabá. A magistrada entendeu que dentro do processo cívil de cobrança de uma dívida e indenização por danos morais dentro de uma Ação Monitória não havia, sequer uma prova contra o acusado.

As denúncias, segundo os documentos exclusivos que a reportagem do Portal 24 Horas News teve acesso, foram feitas pelos também empresários Helton SantAna, Adriana Maria Menegazzo de Barros e Ambrózio Luiz Brogattiçti. Os três teriam vendido produtos hortifrutigranjeiros no período de três anos para Júlio Uemura e mais um grupo de pessoas

Os prejuízos dos empresários teriam passado de R$ 1 milhão. Só que, segundo a decição da juíza, nos autos do processo não constam provas, sequer de que a compra foi feita, muito menos das entregas das mercadorias. Desde que foi acusado, chegando a passar cerca de três meses preso, o empresário Júlio Uemura, tanto elegou inocência, como também fez desafios.

Júlio Uemura chegou a ir ao Programa Cadeia Neles, da TV Record, onde ao ser entrevistado pelo jornalista-apresentador Clóvis Roberto fez o seguinte desafio: Eu pago dobrado se alguém me apresentar um cheque meu sem fundos. Não devo ninguém, se devesse eu pagaria, como tenho pago tudo que eu comprei e compro nestes últimos 40 anos como empresário.

Hoje, procurado pela reportagem, Júlio Uemura não quis se alongar sobre a decisão da Justiça em inocentá-lo. Ele só lembrou que antes da sentença, foi taxado de bandido. De líder de quadrilha e organização criminosa. Só que agora, segundo o empresário, as coisas estão mudando, porque a verdade está vindo à tona.

Eu sempre acreditei na Justiça. Acreditei porque sei que nunca fiz o que muitas pessoas andaram falando. Mesmo assim eu não guardo mágoas de ninguém, desabafou Júlio Uemura. O empresário ainda aguarda julgamento em outro processo criminal que tramita na 15ª Vara Criminal da Capital.

Segue, na íntegra, as denúncias ajuizadas pelos três empresários, e a decisão da Justiça, trasitada e julgada.

AS DENÚNCIAS

Helton SantAna, Adriana Maria Menegazzo de Barros e Ambrózio Luiz Brogatti, devidamente qualificados nos autos, ingressaram com a presente ação de Cobrança c/c indenização c/c pedido liminar de depósito para garantia de juízo em face de Kazuoyoshi Uemura (Júlio Uemura), Rene dos Santos Oliveira, Ronaldo Luiz Mateus, Lupercio Augusto de Campos, Onésimo Martins de Campos, Ailton Fernandes de oliveira, Francisco Dias Lourenço, Edivaldo Tavares Vilela e Francisco Fernandes Sobrinho.

Alegam, resumidamente, que os autores venderam para os réus produtos hortifrutigranjeiros no período de final de 2005, 2006 e início de 2007, sendo que algumas transações foram recebidas com cheques e outras não foram pagas, existindo declarações de compra, em branco, assinadas e reconhecidas por testas de ferro do Sr. Kazuyoshi Uemura (Julio Uemura).

Sustentam que os requeridos respondem a processo criminal perante a 15ª Vara criminal desta Capital, onde está demonstrado que aplicavam golpes comprando mercadorias em diversos Estados do País e não pagando, agindo como testas de ferro do requerido Sr. Kazuyoshi Uemura.

Afirmam que sofreram prejuízos materiais, e requerem a condenação dos requeridos ao pagamento do valor de R$ 1.020.528,42 pelos danos materiais, e a indenização pelos danos morais sofridos com a atitude dos requeridos, no valor de R$ 10.000.000,00.

Anexaram a exordial os documentos de fls.16/258.

A medida liminar pleiteada de depósito dos bens bloqueados no valor da ação foi indeferida às fls. 259.

As fls. 285 os autores desistiram da ação com relação aos demais requeridos, pleiteando o prosseguimento da mesma somente em relação ao requerido Kazuyoshi Uemura, o que foi deferido às fls. 286.

Citado o requerido apresentou contestação às fls. 293/319, argüindo, preliminarmente, ilegitimidade passiva, em razão de não haver nenhuma relação comercial entre o requerido e os autores, não estando comprovado o fato constitutivo do direito dos autores, e não havendo razão para se falar em dano moral.

Pleiteia a improcedência da ação.

Às fls.321/324 os autores impugnaram a contestação apresentada, reiterando as argumentações da exordial e pugnando pela procedência da ação.

O JULGAMENTO

É o relatório.

Fundamento e Decido.

Analisando os autos, observa-se que não há necessidade de dilação probatória no caso presente, pois os autos estão a fornecer elementos suficientes para o julgamento da presente ação, e a produção de prova testemunhal, nada mais acrescentará aos autos.

Existem nos presentes autos elementos suficientes para embasar o julgamento antecipado da ação.

É certo que a preliminar argüida se confunde com o mérito e assim será analisada.

Ressalte-se, inicialmente, que o artigo 1525 do código civil de 1916 e o artigo 935 do Código civil em vigor (ambos na primeira parte do dispositivo), determinam que a responsabilidade civil é independente da criminal, o que faz crer inexistirem motivos para a suspensão de uma ação ordinária de cobrança por mercadorias vendidas, pois tanto na ação penal quanto na civil são diversas as aferições dos exames da culpa e sua finalidade.

Assim, mister é esclarecer quais são as hipóteses em que seria necessária a suspensão do processo cível, a fim de que antes ocorra a decisão penal.

O risco de decisões conflitantes é uma das hipóteses das causas.

No caso dos autos, verifica-se que os autores ajuizaram ação de cobrança de valores relativos à venda de produtos hortifrutigranjeiros sem o devido pagamento, bem como danos morais decorrentes deste inadimplemento.

Sustentam que tramita ação penal contra o requerido pela acusação de pertencer a uma organização criminosa que aplicava golpes deste tipo.

Assim, considerando que os autores buscam receber os valores relativos à venda de produtos não pagos, e o conhecimento desta lide não depende necessariamente da verificação da existência de fato delituoso, e tratando-se a suspensão do feito de medida facultativa entregue ao prudente exame da autoridade judiciária, entendo não ser o presente caso uma das hipóteses de suspensão do feito cível.

Pelo que se depreende dos autos, buscam os autores receber valores oriundos da venda de produtos hortifrutigranjeiros a pessoas ligadas ao requerido, que era o destinatário das mercadorias e auferia vantagens com o negócio.

Consta das fls. 22/27 termo de declaração prestado pelo autor Helton SantAna ao grupo de atuação Especial contra o crime organizado do Ministério Público deste Estado, onde conta que trabalha com compra e venda e cereais e hortifrutigranjeiros na região de Ibiá/MG, e nesta qualidade fez negócios com a empresa Cláudio Cereais, sendo que no começo recebeu a vista, mas depois o responsável pela empresa passou a pedir prazo para pagamento, e os cheques foram devolvidos por falta de pagamento, e então, pagou os produtores, seus fornecedores, e ficou com um prejuízo estimado, na época, em R$ 600.000,00.

Conta, ainda, que ao tentar cobrar a divida, ficou sabendo que a empresa fazia um esquema com o Sr. René Santos Oliveira e o sócio deste, Sr. Julio Uemura.

Às fls. 29 juntou uma Declaração de compra onde consta que Fernando Franco Neves Rodrigues, produtor rural, adquiriu 40000kgs de milho a granel de Reinaldo Olini Rocha, com uma observação no rodapé dizendo: ...Favor reconhecer firma e enviar para: Helton Santana...

Às fls. 30/36 estão declarações de compra, firmada por Fernando Franco Neves Rodrigues, com espaços em branco no referente à mercadoria e fornecedor.

A fotocópia de um cheque emitido por Mariozan Duarte Serra e carimbado atrás pela empresa Maurinho Cereais Ltda, consta das fls. 38.

Não há nos autos qualquer comprovação de que a mercadoria que adquirida pelo Sr. Fernando, constante da declaração de fls. 29 foi efetivamente vendida para a empresa Cláudio Cereais ou para a empresa Sewal Hortifrut Ltda, ou qualquer outra empresa mencionada no depoimento prestado pelo autor Helton Santana junto ao Ministério Público Estadual, que supostamente está ligada, por atos ilícitos, ao requerido Kazuyoshi Uemura.

Não há comprovação de entrega de quaisquer mercadorias para as empresas suposta e criminosamente ligadas ao requerido.

O mesmo se diga das declarações de fls.30/36 e da fotocópia do cheque de fls. 38.

Estes documentos, nem de longe apresentam quaisquer indícios de que houve uma transação comercial de venda de produtos realizada entre o autor Helton e o requerido, ou qualquer empresa que possa fazer parte da chamada organização criminosa comandada por ele.

Às fls. 40/43 e 50 são fotocópias de Notas fiscais do produtor, emitidas pelo autor Ambrosio Luiz Borgatti e tendo como destinatário a empresa Sewal Hortifruti Ltda, mas não há nenhuma comprovação do efetivo recebimento das mercadorias por esta empresa.

É certo que a nota fiscal é documento produzido unilateralmente pela parte autora, da qual não constam assinatura e/ou identificação de eventual recebedor das mercadorias, e a comprovação da entrega efetiva destas torna-se indispensável para a procedência da ação de cobrança.

Nesse sentido, confira-se a recente jurisprudência que segue:

Ação de cobrança. Emissão de duplicata sem aceite. Nota fiscal. Documento produzido unilateralmente. Inexistência de outros documentos ou indícios de que a autora tenha realizado a operação negocial com o réu. Recurso improvido (Ap.991020415461, TJSP, Relatora: Dês. Rosa Maria de Andrade Nery, 34ª Câm. De direito privado, jug.28/06/2010.

O mesmo se diga das fotocópias dos cheques constantes das fls. 44/49, emitidos por Valdomiro Fernandes da Silva e nominais ao autor Ambrosio Luiz Borgatti, devolvidos pela alínea 21.

Vale ressaltar que a alínea 21 é quando o cheque é devolvido por sustação de seu pagamento pelo emitente.

Poderíamos dizer que esta prática de simples sustação de cheque tem sido utilizada pelos golpistas do mercado, mas no caso em questão não há qualquer indício de ser esta a situação ocorrida, pois pelo que verifica dos documentos acostados aos autos, não há como dizer que houve negócio de venda e compra de mercadorias entre o autor Ambrosio e o emitente dos cheques Valdomiro, em razão de não haver comprovação ou sequer um começo de prova de remessa (por parte do autor) e efetivo recebimento de mercadorias por parte do emitente dos cheques.

Igual situação se apresenta relativa às fotocópias dos cheques apresentadas às fls. 52/57, cujos emitentes e favorecidos são pessoas estranhas aos negócios mencionados na exordial, e não se encontram nos autos quaisquer outras provas capazes de comprovar a compra e venda de produtos entre as pessoas mencionadas como testas de ferro do requerido.

As notas fiscais do produtor constantes das fls. 59/66, da mesma forma que as anteriormente analisadas, foram emitidas por terceiras pessoas, algumas tendo como destinatário o Sr. Fernando Franco Naves Rodrigues (nome constante como comprador nas declarações de compra de fls. 29/36), e outras Ailton G. Ferreira, sem comprovação de entrega efetiva das mercadorias a quem quer que seja, e tão pouco que estas mercadorias tenham sido recebidas por alguma das pessoas envolvidas no processo criminal que tem o requerido como chefe de organização criminosa especializada em aplicar golpes comprando hortifrutigranjeiros.

Nenhuma novidade se extrai das fotocópias dos cheques apresentadas às fls.67/74.

Os documentos de fls. 75/79 são relatórios produzidos unilateralmente não se sabe por qual dos autores, que também não traz nenhuma ligação com o pedido constante da exordial.

Não há nos autos nenhum documento que demonstre qualquer transação comercial realizada pela autora Adriana Maria Menegazzo de Barros.

Importa salientar que a pretensão dos autores se funda no inadimplemento, por parte do requerido, dos valores relativos à compra de produtos hortifrutigranjeiros efetuada por seus testas de ferro, e no ressarcimento do dano moral provocado por esse inadimplemento, transação comercial que, portanto, necessita ser efetivamente comprovada, situação não verificada na hipótese vertente.

Não há nos autos nenhuma comprovação da participação do requerido na suposta organização criminosa.

Destaca-se que o ônus probandi, no caso, é de incumbência da parte autora, ex vi do artigo 333, I do CPC. Preconiza o preceptivo legal acima mencionado:

Art. 333.O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;...

A propósito, ensina Humberto Theodoro Júnior:

Não há um dever de provar, nem à parte contrária assiste o direito de exigir a prova do adversário. Há um simples ônus, de modo que o litigante assume o risco de perder a causa se não provar os fatos alegados dos quais depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar através da tutela jurisdicional. Isto porque, segundo a máxima antiga, fato alegado e não provado é o mesmo que fato inexistente. (Curso de Direito processual Civil, vol. I, 47, ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p.478).

E, consoante a lição de Nelson Nery Jr. E Rosa Maria Andrade Nery, em seu festejado Código Comentado (2ª Ed., 1996, RT, p. 758), ao tratar do ônus probandi; a palavra vem do latim ônus, que significa carga, fardo, peso, gravame. Não existe obrigação que corresponda ao descumprimento do ônus. O não atendimento do ônus de provar coloca a parte em desvantajosa posição para a obtenção do ganho de ônus da condição de parte..

Sobre o assunto, traz-se à colação jurisprudência pátria:

O ônus da prova incumbe à autora, quanto aos fatos por ela alegados e dos quais depende a existência do direito subjetivo que pretende resguardar pela tutela jurisdicional, nos termos do artigo 333, I, do CPC. Não se desincumbindo do ônus probandi, é de julgar-se improcedente o pedido (Apelação civil nº , de Joaçaba, relator dês. Vanderlei Romer, julg.06/10/2005).

Consoante a doutrina processual, fato constitutivo é aquele que é apto a dar nascimento à relação jurídica que o autor afirma existir ou ao direito que dá sustentação à pretensão deduzida pelo autor em juízo. A consequência do não desincumbimento do ônus da prova pelo autor é o julgamento de improcedência do pedido.

É inconcebível, portanto, na seara do processo civil, o deferimento de pretensões embasadas em meras conjecturas, carecedoras de aparato probatório hábil a lhes dar sustentação.

No caso em questão, os autores limitaram-se aos documentos acima analisados que nada esclarecem, pois não são capazes de demonstrar que houve um negócio de venda de produtos por parte dos autores para quaisquer pessoas mencionadas por eles. Esse seria o primeiro passo para então se vincular essas pessoas que compraram as mercadorias e não pagaram com a pessoa do requerido e dele cobrar o débito e o dano sofrido, mas tal negócio não se encontra demonstrado nos presentes autos, nem mesmo como indício ou começo de prova.

Não há quaisquer provas da existência de um vinculo entre o requerido e os supostos golpistas que teriam negociado com os autores.

Da mesma forma, não há o que se falar em dano moral em razão da falta de comprovação da existência do fato constitutivo do direito dos autores - inadimplemento do requerido - que teria causado o alegado dano moral.

Portanto, julgo improcedente a presente ação de cobrança c/c indenização.

Condeno os autores ao pagamento da verba honorária que fixo em 15% sobre o valor da causa, bem como ao pagamento das custas processuais.

Deverá ficar suspensa esta condenação para o caso de haver alteração da condição financeira dos requerentes, ficando ressalvado que se a alteração não ocorrer dentro do prazo de cinco anos, a obrigação ficará prescrita, conforme artigo 12 da Lei nº 1.060/50 e jurisprudência dominante:

O art. 12 da Lei 1.060/50, ao estabelecer que, havendo sucumbência do beneficiário da justiça gratuita, deverá este arcar com as custas processuais e honorários advocatícios, desde que, até cinco anos, contados da decisão final, puder satisfazê-los sem prejuízo do sustento próprio ou de sua família, não é incompatível com o art. , LXXIV, da CF, que prevê assistência judiciária integral e gratuita aos hipossuficientes (STF-RT 781/170, ementa da redação).

Transitada em julgado, arquivem-se com as necessárias baixas e anotações.

A AÇÃO

Nome da Parte: KAZUYOSHI UEMURA (JÚLIO UEMURA)

Comarca:Cuiabá Cível

Numeração Única: 12801-27.2009.811.0041 Código: 375978 Número/Ano: 250 / 2009

Assunto: AÇÃO MONITÓRIA C/C COBRANÇA C/C INDENIZAÇÃO C/C PEDIDO LIMINAR DE DEPÓSITO PARA GARANTIA DE JUÍZO

Tipo de Ação: Monitória->Procedimentos Especiais de Jurisdição Contenciosa->Procedimentos Especiais->Procedimento de Conhecimento->Processo de Conhecimento->PROCESSO CÍVEL E DO TRABALHO

Lotação: SEXTA VARA CIVEL DA CAPITAL

Livro: Feitos Cíveis

Tipo: Cível

Juiz Atual: Edleuza Zorgetti Monteiro da Silva

  • Publicações73364
  • Seguidores793
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações614
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/justica-nao-encontra-provas-e-inocente-julio-uemura/2391948
Fale agora com um advogado online