jusbrasil.com.br
16 de Maio de 2024

Paralegal: o que realmente está descrito no Projeto de Lei e suas consequências no mundo jurídico

Publicado por Gm M.
há 10 anos
12
0
5
Salvar

Ricardo Freire Vasconcellos

Advogado. Integrante do Conselho de Políticas sobre Drogas do Distrito Federal (Conen).

No dia 06 de agosto de 2014, foi aprovado o Relatório do Projeto de Lei 5.749/2013, de autoria do Deputado Sérgio Szveiter, que altera o artigo terceiro, § 2º da Lei 8.906/94 (Estatuto da Ordem dos Advogados do Brasil) para incluir em seus quadros o assistente jurídico, denominado de paralegal.

O “paralegal assistant” profissão que existe nos Estados Unidos conceitua em um assistente jurídico ao Advogado, e sem capacidade postulatória.

Em resumo o paralegal nos EUA não pode atuar em juízo, não tem acesso a autos, não pode exercer defesas perante os Tribunais e não pode representar a sociedade de advocacia perante magistrados.

Por outro lado por se tratar de um bacharel em Ciências Jurídicas, pode redigir internamente petições com supervisão de um advogado, pode pesquisar jurisprudências, pode intermediar negociações e contratos para a sociedade em que atua, pode efetuar trabalhos nas áreas jurídicas dentro de uma sociedade.

Assim, o projeto de Lei que em sua justificativa informa que o modelo brasileiro se inspira na função de paralegal já existente nos Estados Unidos, não copia o modelo americano, não tem a mesma redação, e cria outros direitos privativos aos advogados que o paralegal americano não possui, como veremos adiante.

O projeto de Lei 5.749/2013 ao instituir a função de paralegal ao bacharel de direito que não obteve a aprovação no Exame de Ordem, originalmente permitia que o bacharel se inscrevesse como paralegal na Ordem dos Advogados do Brasil, por tempo indeterminado - foram feitas diversas sessões da CCJ na qual os deputados decidiram de que este prazo se limitaria a 3 anos de atuação como paralegal.

Ocorre que diferente do real significado da função paralegal nos Estados Unidos, no Brasil os senhores deputados querem aprovar que um bacharel de direito possa, mesmo sob a supervisão de um advogado, postule em juízo, e exerça funções privativas de advogado como defesas em Tribunais, juizados especiais e em órgãos do poder judiciário. E para isso não há necessidade de estar inscrito como advogado, e sim como paralegal, sem aprovação no exame de ordem por um período de três anos.

Resumindo, o projeto de Lei permite que um bacharel de direito possua a mesma capacidade postulatória de um advogado, acompanhado deste, sem ser aprovado no exame de ordem - e justificam tal fato como injusta a reprovação no exame de cerca de 2 milhões de Bacharéis em direito.

Comparam, inclusive em sua justificativa para tal projeto de Lei que nos Estados Unidos cerca de 71% dos bacharéis em direito são paralegais (dados de 2008), que não se diferem dos dias de hoje, mas como informado, os paralegais nos Estados Unidos não podem postular em juízo, muito diferente da proposta brasileira o que não justifica o argumento de que os mesmos estão empregados como paralegais para poder advogar como no conceito deturpado tupiniquim, eles não podem mesmo e não devem já que não podem postular em juízo.

Também usam como justificativa que de que o exame de Ordem é difícil, esse argumento torna-se minúsculo quando se comparado ao Exame de Ordem Americano (BAR Exam) – se formos fazer uma pequena comparação da dificuldade de se passar no BAR e no Exame de Ordem brasileiro, seria como fossemos disputar uma única vaga do concurso público mais difícil do país e pudéssemos postular apenas em um estado.

Nos EUA os advogados são limitados a atuar no estado em que fizeram o BAR Exam, podem solicitar atuar em outros estados, mas se quiserem atuar nos 14 estados que possuem o BAR Multistate entre os 49 estados dos Estados Unidos, devem possuir aprovação no BAR Multistate compostos de 200 questões na qual o examinando tem de ser aprovado em 130 questões ou seja, cerca de 70% de acerto. Os exames nos EUA ocorrem apenas duas vezes ao ano, a exceção dos estados como Dellaware e Dakota do Norte só ocorre o exame uma vez ao ano.

Portanto a justificativa que a função de paralegal é necessária ao Brasil como existe nos EUA não condiz com a realidade dos Estados Unidos onde mais e 70% dos bacharéis são paralegais por não passarem no BAR Exam mas não estão exercendo funções de um advogado e sim diferentes funções.

Nos EUA o bacharel não pode advogar e não tem licença para atuar em juízo, aqui querem que o mesmo bacharel exerça não a função de paralegal assistant, mas a própria de advogado e de estagiário, eis que o projeto de Lei permite que o paralegal brasileiro exerça, mesmo acompanhado de advogados, funções privativas da advocacia como postular em juízo, e isso sem aprovação no exame, e por um período de três anos.

Outra justificativa para proposta do projeto de Lei foi de que no Brasil temos 2 milhões de bacharéis em direito, em um limbo jurídico, e cerca de 500 mil advogados aprovados no exame de Ordem, novamente os nobres deputados citam os EUA como exemplo onde o mercado de paralegais é bem aceito, mas como dito anteriormente, eles não advogam, e nem podem – Nos EUA a realidade para um mercado de paralegais é muito diferente, sessenta mil pessoas fizeram o BAR Exam no ano de 2013 e a média de 68% foram aprovados, mas há estados como na Califórnia onde apenas 20% dos candidatos foram aprovados, e a população dos EUA é o dobro da brasileira e nem por isso, os EUA sofrem o que aqui chamam de crise de advocacia.

Pergunta-se, no Brasil, o exame é mais fácil. É repetido 3 vezes em um ano, possui 80 questões na qual o bacharel tem que acertar 40, ou seja 50% de acertos, para primeira fase, e na segunda também, porém nossas estatísticas são de 70% de reprovação, o erro não está no exame, o exame comparado ao americano é proporcionalmente uma prova de iniciante.

Onde está o erro? Na má qualidade das faculdades de direito, na proliferação de cursos jurídicos de péssima qualidade, ser um bacharel no Brasil não é ser advogado, o bacharel como nos EUA não advoga, ele pode exercer as funções de um paralegal como nos EUA e pode, além disso, optar pelas carreiras jurídicas dos concursos públicos que não exigem aprovação no Exame de Ordem para tal.

Porque um bacharel não reclama para a profissão de Delegado ele tem que fazer concurso? Porque não reclama para ser analista judiciário ele tem que fazer concurso? Notário? Precisa fazer concurso. Serventuário da justiça? Também, Consultor Jurídico? Idem E para advogar? É a mesma situação, tem que passar no exame de Ordem. O Exame de Ordem é ainda mais fácil do que muitos concursos, pois o bacharel não tem concorrentes a não ser ele mesmo, e tem uma prova relativamente fácil comparado aos exames de outros países como EUA, Singapura, filipinas, Japão, Itália.

São países que possuem Exames infinitamente mais difíceis que o Exame de Ordem brasileiro.

O paralegal abrasileirado pelo conceito dos senhores deputados é um advogado sem OAB, e sem voz, uma vez que para postular tem que estar supervisionado, mas vamos às consequências de se admitir a legalização de postular-se sem aprovação no exame de ordem por três anos.

É notório que os escritórios de advocacia que precisam de novos advogados, geralmente, os contratam para serem advogados iniciantes. Em geral pagando o piso salarial de um advogado, cerca de R$ 2.000,00 (dois mil reais por 8 horas corridas).

A função de paralegal tupiniquim difere-se da qualificação como advogado em dois aspectos, o paralegal não foi aprovado no exame de ordem, e também para postular em juízo, ele precisa de estar acompanhado de um advogado, mas por outro lado, pode fazer todas funções de um advogado internamente dentro de uma sociedade, somadas as funções de um estagiário.

Assim, não pode ter o mesmo piso de um advogado, e obviamente ganharia mais que um estagiário, portanto, para os escritórios o paralegal seria mais vantajoso do que contratar um advogado recém aprovado no exame de ordem com um valor protegido por Lei.

Eis que pagaria menos ao paralegal do que ao advogado que seria contratado. Em resumo o paralegal ganha menos para exercer as funções do novo advogado e de um estagiário, por três anos, e o escritório manteria o seu advogado experiente supervisionando o chamado paralegal durante este tempo sem necessidade de contratar um novo advogado e mais um estagiário.

Neste contexto, até a vaga do estagiário passa a ser ameaçada com a entrada de dois milhões de pessoas no mercado – tanto o mercado de advogados recém aprovados no exame como as vagas dos estagiários correm um enorme risco, uma vez que o projeto também engloba as funções dos estagiários dentro das funções dos paralegais.

Em resumo, nos EUA o paralegal não advoga e não ocupa a vaga de advogados, sequer possui capacidade postulatória supervisionada, também não se equipara ao estagiário e exerce funções diferentes.

No Brasil querem equiparar o paralegal reunindo nele as funções de um sub-advgado, uma vez que para estar em juízo precisa de estar supervisionado. Remete a este novo profissional as funções de um estagiário podendo ter inscrição como paralegal nos quadros da OAB. Ameaça o mercado de advogados recém aprovados, desestimula o estudo para aprovação no exame de Ordem e para que o bacharel se esforce a entrar em outras carreiras jurídicas, pois como ele pode sub-advogar por três anos, ganhando menos que um advogado, para que quer o mesmo fazer concursos? Para que se esforçar em passar no exame se posso ganhar próximo ao advogado aprovado?

Por estas razões a Ordem dos Advogados do Brasil tem o dever de tomar uma postura contrária a esta manobra para burlar o Exame de Ordem, queira ou não seleciona os mais qualificados, seja de boa, ou ruim qualidade, o Exame ainda é necessário.

Publicado por - Ricardo Freire Vasconcellos

Fonte

  • Sobre o autorEmpresário
  • Publicações1158
  • Seguidores302
Detalhes da publicação
  • Tipo do documentoNotícia
  • Visualizações1636
De onde vêm as informações do Jusbrasil?
Este conteúdo foi produzido e/ou disponibilizado por pessoas da Comunidade, que são responsáveis pelas respectivas opiniões. O Jusbrasil realiza a moderação do conteúdo de nossa Comunidade. Mesmo assim, caso entenda que o conteúdo deste artigo viole as Regras de Publicação, clique na opção "reportar" que o nosso time irá avaliar o relato e tomar as medidas cabíveis, se necessário. Conheça nossos Termos de uso e Regras de Publicação.
Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/noticias/paralegal-o-que-realmente-esta-descrito-no-projeto-de-lei-e-suas-consequencias-no-mundo-juridico/133493219
Fale agora com um advogado online