Senado politicamente correto!
Em recente decisão o Senado Federal decidiu por 61 votos a 20, em acatar o pedido de impeachment da Presidenta afastada Dilma Rousseff. Ela foi condenada sob a acusação de ter cometido crimes de responsabilidade fiscal – as chamadas "pedaladas fiscais" – no Plano Safra e os decretos que geraram gastos sem autorização do Congresso Nacional, ambos previstos nos arts. 10 e 11 da lei 1.079/1950.
Na prática a condenação ocorreu em decorrência de má administração, seja por não observância do trâmite legislativo, ou inobservância da própria normal legal. Em comento ao respectivo processo, alguns deputados e senadores chamaram o impeachment de golpe, sustentando que a administração da ex-Presidenta Dilma ocorreu na mais perfeita ordem da legalidade. A própria acusada sustentou em sua defesa que tudo se tratava de um golpe de estado tramado pela oposição, e que seu julgamento deveria ser visto como um “conjunto da obra” e não por “falta de popularidade no Congresso”.
Houve uma segunda votação para decidir se Dilma deveria perder seus direitos políticos, com o placar de 42 votos favoráveis e 36 desfavoráveis. Como houve três abstenções e seriam necessários 54 votos a favor, consequentemente ela não perdeu os direitos e assim poderá se candidatar a cargos públicos.
Insurge-se nesta enseada que qualquer julgamento de impeachment é formado por um único julgamento, resultando em uma decisão que condena ou não. Ou seja, não poderia o Ministro Levandowski em observância ao Art. 52, I, C/C parágrafo único da CF/88, dividir o julgamento e proferir duas decisões.
Senão vejamos:
Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal:
I - processar e julgar o Presidente e o Vice-Presidente da República nos crimes de responsabilidade, bem como os Ministros de Estado e os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica nos crimes da mesma natureza conexos com aqueles;
II processar e julgar os Ministros do Supremo Tribunal Federal, os membros do Conselho Nacional de Justiça e do Conselho Nacional do Ministério Público, o Procurador-Geral da República e o Advogado-Geral da União nos crimes de responsabilidade;
(...)
Parágrafo único. Nos casos previstos nos incisos I e II, funcionará como Presidente o do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a condenação, que somente será proferida por dois terços dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.
Portanto, quanto a julgamento do crime de responsabilidade, havendo este condenação, em ato contínuo ocorre a indisponibilidade do exercício de cargo, emprego, ou função pública. No comentado julgamento, falasse da existência do crime de responsabilidade, porém abstém-se do efeito do julgamento do crime que é claramente previsto no parágrafo único do artigo em comento, que é a condenação.
Ou seja, o Senado Federal tomou uma decisão de não aplicar os efeitos totais do julgamento, que é previsto no texto constitucional. Imagine-se a seguinte situação: sabendo da existência de aplicabilidade do ditado parágrafo único, os senadores entendem por não serem favorável ao impeachment, e assim mudariam sua decisão.
Sabendo da não aplicabilidade da pena, condena-se e satisfaça o eleitorado!
Insurge-se ainda que tal condenação de indisponibilidade de exercer cargo, emprego, ou função pública também é expressa na lei dos crimes de responsabilidade cometido pelo presidente (lei 1.079/1950), em seus arts. 33 e 34. Diante desta enseada, surge-se a pergunta: será que houve uma decisão política no Senado? Será que em conversas de bastidores, negociou-se a manutenção da Sra. Dilma Rousseff no cenário político?
É notório cada vez mais as manobras políticas que se insurgem para agradar as grandes massas, e ainda assim se prosseguir com os julgamentos dos políticos que foram má administradores. Esta decisão se expõem claramente ao que agora é questionado. Quando o Ministro Ricardo Levandowski, que na condição de Presidente do Supremo Tribunal Federal que conduziu o julgamento em questão, reparte a decisão de impeachment em duas matérias como se dois crimes existissem, cria uma manobra de agradar a todos. Há condenação, porém sem pena.
“Condeno Joãozinho por homicídio de trânsito na qualidade dolosa e, porém não lhe retiro o direito de conduzir veículo auto motor, deixando-lhe habilitado par conduzir veículo”.
Se o Senado reconhece os dois crimes a cima citado, este não pode simplesmente deixar facultado a Sra. Dilma Rousseff a possibilidade de exercer outro cargo público. Ocorrendo a eleição de um novo presidente, este pode nomear a condenada para um cargo de ministro, como se nada tivesse acontecido. É ridículo pensar na hipótese, porem é possível, pois não teve inabilitação do exercício dos direitos políticos, nem muito menos da nomeação de cargo público.
O texto constitucional é carta magna, superior a qualquer norma, indisponível de julgamento contrário as suas previsões. A orientação do art. 52, parágrafo único, é matéria de lei que deve ser seguida e imposta, não servindo de mera faculdade para o julgador. Sendo assim, não há que se falar em duplicidade de julgamento, como a este que ocorreu.
A decisão do Senado se mostrou claramente uma manobra política numa sociedade em que logo se esquece das coisas. Assim tão logo esta administradora (ex-presidenta Dilma Rousseff) exercerá um novo cargo político e/ou público e ninguém lembrará do que aconteceu. A manutenção de decisões similares mostra a insegurança jurídica de nossa sociedade, aonde decisões são tomadas com o cunho de favorecer pessoas e não normas.
Como amante da aplicabilidade da norma, como uma espécie de contrato (legalista), posiciona-se pela ilegalidade da decisão por inobservância da matéria constitucional. Em julgamento de impeachment não se decide a pena a se aplicar. Decide-se pela condenação ou não. Ocorrendo condenação, perdem-se os direitos políticos como consequência do julgamento.