TRF-2 - Apelação - Recursos - Processo Cível e do Trabalho XXXXX20164025110
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MILITAR. SOLDADO LICENCIADO. DESERÇÃO. REFORMA. ALIENAÇÃO MENTAL. CONTEMPORANEIDADE AFASTADA. I - Pontue-se que o militar - de qualquer posto ou graduação, seja durante a prestação do serviço militar obrigatório, ou no serviço militar voluntário, seja na sua carreira -, que pratica o ato de deserção cometecrime tipificado no Código Penal Militar (Decreto-lei 1.001 /69). De acordo com o Código de Processo Penal Militar (Decreto-lei1.002/69), consumada a deserção de Praça sem estabilidade, será ela imediatamente excluída do serviço ativo e, ao se apresentarvoluntariamente ou se for capturada, a mesma deverá ser submetida à inspeção de saúde: (a) quando julgada apta para o serviçomilitar, será reincluída, para se ver processar; e/ou (b) em caso de incapacidade definitiva, será isenta da reinclusão edo processo, sendo os autos arquivados, após o pronunciamento do representante do Ministério Público Militar. II - Passadosquase 41 anos do desligamento do Serviço Ativo da Marinha-SAM (em 08/10/76) e o primeiro registro da alienação mental peloPerito Judicial (em 27/07/17), há que se exigir o devido rigor na comprovação do fato alegado (efeito) - alienação mentaldesde o desligamento do SAM - e a relação deste fato com o período a serviço da Força Naval (suposta causa), com o propósitode obter-se a reforma, com proventos integrais de 3º Sargento. III - A Administração da Marinha, no caso, agiu nos estritostermos da legislação que regula o processamento do crime de deserção. O ex Soldado ingressou no Corpo de Fuzileiros Navaisem 19/01/72 e permaneceu regularmente na carreira por 2 anos. No decorrer do 3º ano, cometeu o primeiro crime de deserção,apresentou-se voluntariamente, e, por ser desertor sem estabilidade e ter sido julgado apto para o serviço militar em inspeçãode saúde, foi reincluído, processado e cumpriu a pena. No decorrer do 4º ano, cometeu o segundo crime de deserção, foi capturadoe, por ser desertor sem estabilidade e ter sido julgado incapaz definitivamente para o SAM, ficou isento da reinclusão e doprocesso. Antes de completar o 5º ano, foi licenciado ex officio a bem da disciplina e desligado do SAM. Por fim, decorridosperto de 16 anos do desligamento, o ex Soldado foi "reabilitado" (em 18/05/92), fazendo jus à substituição de seu Certificadode Isenção do serviço militar pelo Certificado de Reservista de 1ª Categoria, com a inclusão na Reserva Não Remunerada de1ª Categoria da Marinha / RN1, devido ao grau de instrução alcançado como Soldado Fuzileiro Naval. IV - Nas inspeções quederam azo ao desligamento da Marinha, as Juntas de Saúde diagnosticaram o então Soldado como portador de "Personalidade Afetiva"e/ou "Personalidade Psicopática", firmando que o militar poderia prover a subsistência, não estando impossibilitado totale permanentemente para qualquer trabalho. Além disso, consoante a normatização de regência, ao tempo da exclusão, não haveriaenquadrar-se o estágio do quadro clínico apresentado como "alienação mental"; inclusive porque o então Soldado tampouco passarapor 1 qualquer dos meios habituais de tratamento, donde a enfermidade ainda não poderia ser tida por refratária aos meioshabituais de tratamento, uma das condições legalmente prescritas para identificá-la como "alienação mental". V - Por sua vez,o ex Soldado não comprovou pelo menos uma situação de fato que poderia fundamentar sua pretensão: ou a contemporaneidade daalienação mental com a prestação do serviço militar, ou a relação de causa e efeito entre o serviço militar e a doença mental.Não acostou nenhum laudo médico, ou registro de atendimento médico ou de internação hospitalar, ou receituário de medicação,enfim nada que demonstre que, ao longo de quase 41 anos, o seu quadro clínico se caracterizasse como alienação mental. Nãoobstante afirmar, na inicial, que, em 2012 (já transcorrido o lapso de 36 anos do desligamento do SAM), procurou um primeiroatendimento médico no Centro Psiquiátrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e, em 2017, relatar ao Expertdo Juízo que estaria sendo atendido na clínica médica do Hospital do Fundão e na Psiquiatria de um ambulatório em BelfortRoxo, o ex Soldado não apresentou qualquer documentação comprobatória de tais atendimentos médicos. VI - De outro giro, olaudo pericial - único elemento trazido aos autos que poderia convencer acerca do vínculo entre as atividades realizadas durantea prestação de serviço militar e a alienação mental - acaba por não sustentar a pretensão defendida, vez que o próprio diagnósticodas patologias mentais ("Transtorno de Personalidade Borderline, com sinais e sintomas psicóticos frequentes" e "Retardo MentalLeve congênito"), com as características descritas, pela ausência de alguma documentação médica comprobatória, não restouadequadamente demonstrado. VII - Confirmado que o ex Soldado apresentou aptidão para o exercício de atividade laborativano decorrer do período de 27 anos que transcorreu depois do desligamento do SAM e que o próprio diagnóstico das patologiasmentais caracterizadas apenas pelo Expert judicial, após 41 anos do desligamento do SAM, não restou adequadamente demonstrado,correta a ilação de que o laudo pericial, por si só, não se mostra hábil a convencer acerca da contemporaneidade da alienaçãomental com o serviço militar. Inegável, aliás, que é temerário basear-se unicamente no relato do ex Soldado, sem que o mesmose faça acompanhar de alguma evidência nos autos, para firmar-se o diagnóstico de doença psiquiátrica enquadrada como "alienaçãomental". VIII - Anote-se que o trabalho como motorista profissional por 27 anos, a própria qualificação profissional informadaem Juízo de "segurado por doença pelo INSS" e o laudo pericial inferindo pela incapacidade total e permanente para qualquertrabalho amparado em diagnóstico que não encontra eco na prova documental adunada, tudo acaba por não elidir a presunção delegitimidade do parecer da Junta de Saúde da Marinha, que reconheceu a presença de incapacidade definitiva do ex Soldado,única e exclusivamente para prestação do serviço militar, e, não, para o exercício de atividades laborativas civis. Acrescente-seque sequer a qualidade de segurado, por doença, do Instituto Nacional do Seguro Social serve para validar a presença da "alienaçãomental", incapacitando o ex Soldado ao exercício de atividades laborativas civis, na medida em que não ficou esclarecido apartir de que momento se deu a qualidade de segurado do INSS e se esta se originou da aventada patologia psiquiátrica ou,então, do "câncer que se encontra em estágio bastante agravado", segundo noticiado na inicial. IX - Não tendo o Autor sedesincumbido do ônus processual de comprovar o fato constitutivo do seu direito ( CPC , art. 373 , I ), isto é, a contemporaneidadedo aventado quadro de "alienação mental" com a vida na caserna, resulta não apenas inviável o pleito autoral, como tambémhá de 2 se ter por legítimos os fatos articulados pela Administração da Marinha, concluindo-se pela inexistência de algumnexo de causalidade do atual estado psiquiátrico com a atividade militar e pela legalidade do ato de desligamento. X - Nãose conhecendo do direito à reforma, via de consequência inviabilizado fica o reconhecimento do direito aos consectários legaisdela decorrentes, aí se incluindo a assistência médico-hospitalar, máxime porque, efetivamente, tal direito tem por pressupostoo status de militar, ativo ou inativo (da reserva remunerada e/ou reformado), contribuinte obrigatório do Fundo de Saúde darespectiva Força Militar. XI - Apelação e remessa necessária providas. Sentença reformada.