CERCEAMENTO DO DIREITO DE DEFESA. GRAVAÇÃO REALIZADA PELA ESPOSA DO RECLAMANTE DE CONVERSA TELEFÔNICA ENTRE ELA E O PREPOSTO DA RECLAMADA, QUE PRESTAVA INFORMAÇÕES SOBRE EX-EMPREGADOS. GRAVAÇÃO VISAVA COMPROVAR QUE A RECLAMADA FORNECIA INFORMAÇÕES NEGATIVAS A RESPEITO DO RECLAMANTE A EMPRESAS INTERESSADAS EM CONTRATÁ-LO. IRRELEVANTE O FATO DE QUE O RECLAMANTE, BENEFICIÁRIO DA GRAVAÇÃO, NÃO TER PARTICIPADO DA CONVERSA GRAVADA. EXIGÊNCIA INVIABILIZA O DIREITO DE DEFESA. PROVA LÍCITA. A discussão dos autos não se refere à interceptação telefônica, a qual é feita por terceiro que não participa da conversa, mas de "gravação feita por um dos interlocutores (ou com autorização deste), no caso, a esposa do autor", por meio da qual se comprovaria que a reclamada "estava repassando informações negativas a seu respeito [reclamante] para outras empresas onde estava prestando processo seletivo". O diálogo entre a esposa do reclamante e o preposto da reclamada, responsável por prestar informações sobre ex-empregados, também não se insere em causa legal de sigilo ou de reserva de conversação para ser inadmitido como prova. Se houvesse vedação, seria em favor do reclamante, sobre quem versava a conversa, e não da reclamada, como entendeu equivocadamente o Regional, ao concluir pela ilicitude da prova. Registrou o Tribunal a quo que a gravação não foi utilizada em proveito da esposa do reclamante (interlocutora que realizou a gravação), "e sim de terceiro (autor), que não participou da conversa", sendo diversa da hipótese decidida no RE-402.717/PR , na qual se concluiu pela licitude da gravação. Quanto à gravação utilizada como prova, a Suprema Corte, nos autos do RE-583.937-RJ , Tema nº 237 da Tabela de Repercussão Geral, em acórdão da relatoria do Exmo. Ministro Cezar Peluso (DJE 18/12/2009), reafirmou a jurisprudência daquela Corte (fundamentos expendidos na decisão proferida no RE-402.717/PR ), fixando a tese: "é lícita a prova consistente em gravação ambiental realizada por um dos interlocutores sem o conhecimento do outro". Impõe ressaltar que, na fundamentação do acórdão do RE-402.717/PR (DJe 13/2/2009), cujos fundamentos foram ratificados em decisão com caráter vinculante (repercussão geral), o Supremo Tribunal Federal destacou que "já proclamou esta Corte, em hipótese em certo sentido até mais singular, onde se discutia a licitude do uso do teor de conversa telefônica por quem alegava ter sido vítima de crime cometido de um dos interlocutores, o qual desconhecia a gravação feita por terceiro com autorização do outro" (destacou-se), referindo-se à analogia entre "causa excludente de injuridicidade da ação" e "legítima defesa", adotada no acórdão proferido no HC nº 74.678 (DJ 15/8/97), relatado pelo Exmo. Ministro Moreira Alves. Nesse habeas corpus , discutia-se a "utilização de gravação feita por terceiro com autorização de um dos interlocutores sem o conhecimento do outro", em que se decidiu pela licitude da prova, com fundamento em "causa excludente da antijuridicidade da ação", em que a vítima de extorsão pretendia comprovar a prática do referido crime pelo interlocutor (fiscal de rendas), que não tinha conhecimento da gravação. In casu, o reclamante defendia seu direito de personalidade, pretendendo comprovar a prática de ato ilícito pela reclamada (prestação de informações desabonadoras contra ele). Salienta-se que , se o reclamante solicitasse à reclamada informações (como empregador interessado na sua contratação), "sua voz seria reconhecida pelo chefe e pelos colegas de trabalho", que não prestariam informações. Somente por meio de ligação telefônica feita por outra pessoa seria possível a produção da prova. Nesse contexto, a exigência de que o reclamante fosse um dos interlocutores da conversa gravada inviabilizaria a produção da prova do fato constitutivo do direito daquele e a pretendida proteção jurisdicional de direitos da personalidade. Por outro lado, o direito à privacidade da reclamada não é absoluto para cercear a defesa do reclamante, que também busca preservar sua intimidade, privacidade, honra e imagem. Ao contrário do entendimento adotado pelo Regional, a Suprema Corte não exige que a gravação seja utilizada, em Juízo, em proveito de quem a realizou para ser considerada lícita, mas que tenha sido realizada por um dos interlocutores da conversa, no caso, a esposa do reclamante. A situação se assemelha à destacada pelo Exmo. Ministro Moreira Alves ( HC nº 74.678 ), em que "seria uma aberração considerar como violação do direito à privacidade a gravação pela própria vítima, ou por ela autorizada, de atos criminosos, como o diálogo com sequestradores, estelionatários e todo tipo de achacadores" (destacou-se). Diante do exposto, a gravação de conversa por um dos interlocutores (esposa do reclamante), a despeito do desconhecimento pelo outro interlocutor (empregado da reclamada), a fim de repelir conduta ilícita do outro , é lícita, não se enquadrando na vedação constante do artigo 5º , incisos LVI e XII , da Constituição Federal , uma vez que constitui exercício regular do direito e de legítima defesa (artigo 5º, inciso LV). Recurso de revista conhecido e provido .