TRF-4 - APELAÇÃO CRIMINAL: APR XXXXX20164047100 RS
PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO. OPERAÇÃO HÉRCULES. EVASÃO DE DIVISAS. ARTIGO 22 , PARÁGRAFO ÚNICO , PRIMEIRA PARTE, DA LEI 7.492 /86. PRELIMINARES DE NULIDADE. ILICITUDES NÃO DEMONSTRADAS. AUSÊNCIA DE PREJUÍZO. REJEIÇÃO. MATERIALIDADE, AUTORIA E DOLO. COMPROVAÇÃO. PRINCÍPIOS DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E DO IN DUBIO PRÓ REO. INAPLICÁVEIS. DOSIMETRIA. CULPABILIDADE E CIRCUNSTÂNCIAS DO CRIME AGRAVADAS. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE E PENA DE MULTA REDIMENCIONADAS. SUBSTITUIÇÃO DA PENA POR RESTRITIVA DE DIREITOS. 1. De acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, "a prova emprestada não pode se restringir a processos em que figurem partes idênticas, sob pena de se reduzir excessivamente sua aplicabilidade, sem justificativa razoável para tanto" (EREsp n. 617.428/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Corte Especial, DJe 17/6/2014). Precedentes. 2. Não se verifica vício na prova advinda de delação premiada de coinvestigado, sobretudo quando vier associada a outros elementos hábeis à formação da convicção judicial. 3. Vige no processo penal o princípio pas de nullité sans grief, materializado no art. 563 do Código de Processo Penal , de modo que a decretação de nulidade processual, no âmbito judicial, pressupõe a demonstração do prejuízo, o que não ocorreu na hipótese dos autos. 4. O delito de evasão de divisas visa à tutela das reservas cambiais do país, a fim de controlar o tráfego internacional de divisas, comportando o artigo 22 da Lei n. 7.492 /86 três formas delitivas. 5. A conduta específica de promover evasão de divisas sem autorização legal (artigo 22 , parágrafo único , primeira parte, da Lei nº 7.492 /86), cuida-se da evasão de divisas propriamente dita e abrange tanto a transferência, o transporte ou a remessa física dos valores, como a transferência ou a remessa eletrônica. 6. Comprovadas a materialidade e autoria delitivas, bem assim o dolo do acusado, sendo o fato típico, antijurídico e culpável, e inexistindo causas excludentes, mantém-se a condenação do réu pela prática do delito do artigo 22, parágrafo único, primeira parte, da Lei nº 7.492 /86. 7. Se a acusação comprovou o que lhe cabia (tipicidade, autoria etc.) e a defesa não produziu prova que refutasse a da acusação, não se desincumbindo de seu ônus probandi (excludentes de antijuridicidade, culpabilidade e punibilidade), art. 156 do CPP , não há falar em prova duvidosa da condenação. Precedente. 8. Os precedentes das turmas criminais e da Quarta Seção deste Tribunal afirmam que, para a configuração da materialidade e da autoria delitiva, usualmente são suficientes os documentos elaborados pelos servidores públicos no exercício de suas funções, pois tais documentos gozam de presunção de legitimidade e veracidade, sendo considerados provas irrepetíveis a serem submetidas ao contraditório diferido. 9. O erro de tipo ocorre quando o agente se engana, isto é, tem percepção distorcida da realidade em relação aos elementos constitutivos do tipo penal, sejam eles objetivos, subjetivos ou normativos. Destarte, resta afastada a alegação que houve "erro de tipo", eis que o recorrente possuía total conhecimento acerca das operações ilícitas de remessa de valores. 10. A culpabilidade, para a fixação da pena-base, deve ser compreendida como juízo de reprovabilidade sobre a conduta, apontando maior ou menor censurabilidade do comportamento do réu. 11. As circunstâncias do crime a serem analisadas abrangem o tempo, o lugar, o meio e o modo de execução do delito, além de outras características que envolvam a infração. 12. A culpabilidade negativa do réu não pode deixar de ser valorada no cálculo da pena, considerando a sua experiência e conhecimento diferenciado em comércio exterior. Igualmente, a adesão ao sistema "dólar-cabo", utilizado para dificultar a apuração da atividade delituosa, deve ser sopesado no cálculo da dosimetria da pena, sem que isso configure dupla valoração, porque se tratam de circunstâncias autônomas. 13. No que tange à valoração das vetoriais previstas no art. 59 do CP , é pacífico o entendimento da 4ª Seção desta Corte no sentido de que não há a obrigatoriedade de adoção do termo médio para o cálculo de cada uma delas. Em outras palavras, não há critério matemático rígido para a carga a ser atribuída a cada uma das circunstâncias judiciais quando da primeira fase dosimetria da pena. Tal dosagem está sujeita à avaliação discricionária do julgador, considerando o caso concreto. 14. Não constando nos autos elementos que demonstrem, extreme de dúvida, ter o agente cometido crime para facilitar ou assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro delito, não incide a agravante do artigo 61 , inciso II , alínea b , do Código Penal . 15. Em conformidade com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a fração de aumento pela continuidade delitiva é balizada pelo número de infrações cometidas, devendo-se aplicar "o aumento de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4, para 4 infrações; 1/3, para 5 infrações; 1/2, para 6 infrações; e 2/3, para 7 ou mais infrações" (STJ, AGRGRE XXXXX-RS, Processo XXXXX, rel. Min. Jorge Mussi, julgamento em 06.11.2012). 16. Na pena de multa, o número de dias-multa deve guardar proporcionalidade como quantum da pena privativa de liberdade estabelecida. Já o valor do dia-multa deve ser fixado de acordo com as condições econômicas do condenado. 17. Mantida a substituição da pena privativa de liberdade por duas penas restritiva de direitos, nas modalidades de prestação de serviços à comunidade ou a entidades públicas, e de prestação pecuniária. 18. Parcialmente provido o recurso da acusação e improvido o recurso da defesa, nos termos da fundamentação.