\n\nAPELAÇÃO CRIMINAL. ART. 312 , CAPUT, C/C ART. 327 , § 2º , AMBOS DO CP . PECULATO-APROPRIAÇÃO MAJORADO. SERVIDOR OCUPANTE DE CARGO COMISSIONADO EM SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. INÉPCIA DA DENÚNCIA NÃO CONSTATADA. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS DO ART. 41 , DO CPP . NULIDADE DAS PROVAS COLHIDAS EM AUDITORIA INTERNA NÃO VERIFICADA. PRELIMINARES REJEITADAS. MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA PECULATO CULPOSO. IMPOSSIBILIDADE. DOLO COMPROVADO. APENAMENTO REDIMENSIONADO. GRAVIDADE CONCRETA DO FATO. EXASPERAÇÃO DA PENA-BASE.\nI - A exordial acusatória preencheu todos os requisitos exigidos pelo art. 41 , do CPP , sendo apta, portanto, a deflagrar a ação penal, existindo justa causa para tanto. Há indícios mínimos de autoria e materialidade, de maneira a assegurar ao réu o exercício das garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório. Diversos pormenores do delito somente deverão ser esclarecidos durante a instrução processual. Da mesma forma, houve correta delimitação temporal referente à prática do crime (outubro de 2007 a julho de 2012), o que se reputa suficiente para o exercício da atividade defensiva. Não se constata, igualmente, prejuízo na ausência de especificação minuciosa do número de vezes que o delito foi supostamente cometido, tendo em vista que tal informação se constata através das provas dos autos (considerando o número de alvarás falsificados e transações indevidamente realizadas).\nII - A auditoria interna teve o condão de averiguar a veracidade dos fatos que haviam sido noticiados, além de colher elementos mínimos que evidenciassem alguma irregularidade, a fim de contar com substrato para levar tais ocorrências ao conhecimento das autoridades policiais e judiciais competentes. Outrossim, todos os documentos produzidos naquela oportunidade foram juntados aos autos, permitindo o pleno exercício do contraditório e ampla defesa, mesmo que de forma diferida. Conforme sedimentada jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, eventual nulidade demandaria respectiva comprovação do prejuízo sofrido (pas de nullité sans grief). Competia ao servidor, ademais, ter alegado prejuízo à defesa no bojo da própria sindicância, sob pena de preclusão – é o que a jurisprudência vem denominando de “nulidade de algibeira”, aquela constatada desde o início, mas alegada de forma tardia, somente após a ciência de resultado de mérito desfavorável.\nIII - Do contexto probatório denota-se devidamente comprovada a ocorrência dos fatos e sua autoria delitiva. O réu, na condição de funcionário público em cargo comissionado, apropriou-se, em proveito próprio, de valores públicos de que tinha a posse em razão do cargo exercido no Banco Banrisul. Consoante apurou-se, eram realizadas transferências de valores de uma conta judicial para outra, sem qualquer vinculação. Após, as quantias contidas nessas contas eram sacadas por meio de alvarás falsificados. No período da fraude, a condição financeira do acusado cresceu de forma incompatível com salário por ele percebido. Além disso, pela própria posição que ocupava na instituição financeira, a prática delitiva restou facilitada, circunstância que permitiu a burla ao sistema e o locupletamento econômico ilícito sem que fossem, por longo período de tempo, levantadas suspeitas.\nIV - Inviável se cogitar em peculato culposo, pois ausente suporte probatório à narrativa de que o servidor infringiu dever objetivo de cuidado. Não há falar em negligência, pois não se tratou o caso de episódio isolado, sendo que o prejuízo total experimentado pela entidade beirou a quantia de oito milhões de reais. Não é fato que passa despercebido por funcionário com vasta experiência na função exercida. A dinâmica do ocorrido não deixa dúvida do agir doloso do réu, assim como as demais provas colhidas em juízo sedimentaram esse agir consciente.\nV – Considerando que metade das circunstâncias judiciais do art. 59 , do CP , são desfavoráveis ao réu (culpabilidade, motivos, circunstâncias e consequências do crime), bem assim diante da gravidade dos fatos ora em apreço, é necessária, para correta individualização da pena e repressão do delito praticado, a exasperação da reprimenda basilar. Vai mantido, por outro lado, a fração de 2/3 em razão da continuidade delitiva, tendo em vista que a quantidade de crimes praticados (cento e onze) extrapola, em muito, o ordinário. Quanto à pena de multa, inviável sua isenção, pois esta integra o preceito secundário do tipo penal, imposição que não comporta relativização.\nRECURSO MINISTERIAL PROVIDO.\nRECURSO DEFENSIVO DESPROVIDO.