PROCESSO CIVIL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA C/C REPARAÇÃO DE DANOS. BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA CONFIRMADO EM FAVOR DA AUTORA. DESCONTOS INDEVIDOS NOS PROVENTOS DE APOSENTADORIA DA CONSUMIDORA. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO. CONTRATO JUNTADO PELA RÉ. LAUDO PERICIAL ATESTANDO A IMITAÇÃO DA ASSINATURA DA PARTE AUTORA. NULIDADE DO INSTRUMENTO. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA CASA BANCÁRIA. DECLARAÇÃO DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO ACERTADA.CONDUTA DO FORNECEDOR CONTRÁRIA A BOA-FÉ OBJETIVA. DANOS MORAIS. CONFIGURAÇÃO. REPETIÇÃO DO INDÉBITO NA FORMA DOBRADA. POSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA MODULAÇÃO DE EFEITOS FIRMADA NO ACÓRDÃO DO ERESP Nº 1413542 RS. APELOS DE AMBAS AS PARTES CONHECIDOS. REJEITADO O RECURSO DO RÉU E PROVIDO O DA AUTORA. SENTENÇA ALTERADA EM PARTE. ENVIO DE CÓPIA DOS AUTOS AO ÓRGÃO MINISTERIAL PARA APURAÇÃO DE EVENTUAL ÍLICITO PENAL. I ¿ Trata-se de apelações cíveis interpostas, respectivamente, pelo BANCO C6 CONSIGNADO S.A. (fls. 205/210) e por ROZILDA MAIA LIMA , (fls. 227/235), ambas visando reformar a sentença proferida pelo Juízo da 2ª Vara Cível da Comarca de Limoeiro do Norte às fls. 196/202, nos autos de ação declaratória de inexistência de débito c/ pedido de repetição de indébito e indenização por danos morais, na qual ambas as partes contendem, na qual as partes contendem; as duas já estão devidamente qualificadas e representadas nos autos. II - De plano, ratifico prontamente o benefício da gratuidade judiciária concedido à autora na sentença de piso tendo em vista que a presunção de pobreza se dá pela mera afirmação nos autos. Ademais, no compulsar dos presentes fólios não existem elementos apresentados por nenhuma das partes que me façam adotar posicionamento diverso. III - A teor do disposto no artigo 14 da Lei nº 8.078 /90, a responsabilidade da instituição bancária em reparar os danos causados aos consumidores, em decorrência na prestação do serviço, é objetiva, bastando para a sua caracterização, a ocorrência do ato delituoso e do consequente dano ao cliente. E, para se desonerar da responsabilidade, é ônus do fornecedor do serviço, produzir prova da ausência de direito de serviço ou da culpa exclusiva do consumidor ou terceiro (incisos I e II, do parágrafo 3º, do artigo 14 do CDC ). IV - Analisando detidamente os autos, observa-se mais um caso de cobrança indevida, descurando-se o banco de demonstrar que tomou todas as devidas cautelas no momento da contratação, no intuito de evitar a utilização de documentos falsos ou clonados, agindo de forma negligente ao proceder aos descontos no benefício de aposentadoria da parte autora, sem se acautelar da legitimidade das dívidas apontadas. V - Considerando que a instituição financeira não conseguiu trazer ao processo nenhuma prova, de que, de fato, o autor teria contrato o empréstimo consignado, infundada, portanto, a alegação de que apenas exerceu a função de agente financeiro, disponibilizando um empréstimo consignado em nome da parte Recorrida, para ser debitado em seus proventos como pensionista, ou ainda, alguma prova que demonstrasse que adotou todas as medidas necessárias para evitar a contratação fraudulenta suscitada nos autos ou, mais, que tal evento tenha decorrido de ação de terceiro, hábil a induzi-lo a erro. VI. In casu, dessume-se que a higidez do contrato de empréstimo de nº 010017704931 não restou demonstrada, eis que, por meio do laudo pericial acostado aos autos, foi confirmado que a assinatura aposta no instrumento é inautêntica, estando passível, inclusive, de apuração em âmbito criminal. Portanto, pode-se afirmar que a instituição financeira ré não se desincumbiu do ônus de apresentar fato impeditivo, extintivo ou modificativo do direito do autor (art. 373 , II , CPC ). Em hipóteses tais, o julgamento procedente da demanda é o que se conclui. Precedentes. VII ¿ A reparação por danos morais tem por finalidade compensar a parte ofendida pelos constrangimentos, aborrecimentos e humilhações experimentados, advertir a parte ofensora e prevenir a reiteração da prática de condutas ilícitas desta natureza. Compete ao julgador, segundo o seu prudente arbítrio, estipular equitativamente os valores devidos, analisando as circunstâncias do caso concreto e obedecendo aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. VIII - Ao contrário do que insiste em alegar o banco réu, restou manifesta a configuração do dano moral vivenciado pela parte autora, dano inclusive presumido e que decorre dos próprios descontos indevidos, razão pela qual se faz plenamente cabível e oportuna a indenização pleiteada, não somente para compensar aquele pelos prejuízos morais suportados, como também para servir de advertência para a Casa Bancária Recorrente. IX ¿ Do cotejo dos autos, o valor que melhor se ajusta a um patamar razoável, capaz de reparar o dano sofrido e funcionar com salutar efeito pedagógico, para que o banco Promovido não venha a agir de forma negligente em relação a consumidores futuros, é o de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Atendida, portanto, a apelação da Promovente nesse ponto. Precedentes. Sentença modificada em parte. X - Em relação à devolução em dobro dos valores indevidamente cobrados, andou bem a sentença de piso, observando-se a modulação de efeitos realizada pela Corte Superior, quando do julgamento do recurso paradigma tombado sob o protocolo nº 1.413.542 (EREsp), da relatoria da Ministra Maria Thereza de Asssis Moura . XI - O STJ chegou a uma interpretação de que a obrigação de devolver os valores em dobro não depende do elemento volitivo do fornecedor que os cobrou indevidamente. Basta que seja contrária à boa-fé objetiva, fator que está em todas as relações contratuais e nas normas do CDC . As teses foram aprovadas no julgamento dos recursos: EAREsp 676.608 (paradigma), EAREsp 664.888, EAREsp 600.663, EREsp 1.413.542, EAREsp 676.608, EAREsp 622.697. XII - Isso significa que não há necessidade de provar a má-fé, basta que a conduta do fornecedor seja contrária a boa-fé objetiva. Portanto, somente o engano justificável, cuja prova cabe à parte demandada, tem o condão de afastar a aplicação da norma sancionadora em comento. In casu, no entanto, não há falar em engano justificável, pois o requerido, mesmo tendo a disposição diversos sistemas de consultas, cobrou por ser serviços sem antes se certificar de que eles haviam sido autorizados de fato pela consumidora. XIII - O Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do EREsp: XXXXX RS, em 21 de outubro de 2020, com acórdão publicado em 30 de março de 2021, estabeleceu, dentro da faculdade legal de modulação de efeitos (art. 927 , § 3º , do CPC/2015 ), que a tese firmada só seria ajustada aos casos propostos após a publicação do acórdão. O processo em epígrafe fora ajuizado em 14 de janeiro de 2022, portanto, após da publicação do acórdão supratranscrito. Logo, há de se aplicar à espécie o entendimento atual e, portanto, a repetição se dará na forma dobrada. Mantida a sentença nesse ponto. XIV ¿ Recursos conhecidos. Rejeitado o apelo do banco réu e provido o da autora. Sentença alterada em parte. XV - Ademais, havendo indícios robustos do crime de falsificação de documentos e outros delitos correlatos, determino sejam enviadas cópias dos autos ao Douto Órgão Ministerial para que proceda em apuração dos fatos, se assim achar prudente e necessário. A C Ó R D Ã O Vistos, relatados e discutidos os presentes autos, em que figuram as partes acima referidas. Acordam os Senhores Desembargadores da 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em conhecer dos recursos apresentados por ambas as partes para, no mérito, NEGAR PROVIMENTO ao do réu e DAR PROVIMENTO ao da autora, tudo nos termos do voto do Desembargador Relator, observadas as disposições de ofício. Fortaleza/CE, DATA DO SISTEMA. DESEMBARGADOR FRANCISCO BEZERRA CAVALCANTE Relator