Os recorrentes não se conformam com a r. sentença que julgou a reclamação trabalhista parcialmente procedente. Enquanto o empregador não se conforma com a condenação ao pagamento da gratificação da função de tesoureiro, diante do reconhecimento do acúmulo de função, e da indenização por danos morais, a trabalhadora busca a ampliação da condenação pelo acúmulo de função, a majoração da indenização por danos morais e o acolhimento dos pedidos de intervalo para refeição, de indenização por danos materiais e morais decorrentes de doença ocupacional e de honorários assistenciais. A trabalhadora apresentou contrarrazões. É o relatório. V O T O Referência ao número de folhas A referência ao número de folhas considerou o "download" do processo pelo formato "PDF", em ordem crescente. Questão processual A presente ação foi ajuizada antes da entrada em vigor da Lei 13.467 /2017. Sendo assim, não se aplicam, no caso em análise, as regras processuais criadas ou alteradas pela referida Lei, especialmente aquelas de natureza sancionatória ou restritiva de direitos. Realmente, entendimento em sentido contrário pode configurar grave ofensa ao devido processo legal. Conhecimento dos recursos Recurso do empregador Os requisitos de admissibilidade estão presentes, de modo que conheço do recurso do empregador, mesmo porque, além de tempestivo, foi demonstrado corretamente o depósito recursal (fl. 2858) e o pagamento das custas (fl. 2857). Recurso da trabalhadora Também conheço do recurso da trabalhadora, porque preenchidos os requisitos de admissibilidade. Mérito Análise conjunta Acúmulo de função Não se conforma o empregador com a condenação ao pagamento da gratificação de tesoureiro à autora, ao argumento de que ela exercia exclusivamente a função de caixa. Afirma que compete ao tesoureiro o provisionamento de numerário para a agência, o pedido de carro forte para tanto, a responsabilidade pela guarda de documentos, bem como o acesso ao cofre, atribuições não realizadas pela trabalhadora. Além disso, afirma que o abastecimento dos caixas eletrônicos pode ser realizado também pelos caixas. A trabalhadora, por sua vez, discorda do deferimento apenas parcial do pedido, limitado à diferença entre a gratificação de tesoureiro e a gratificação de caixa recebida por ela. Afirma que o acúmulo de função se caracteriza diante da novação objetiva do contrato de trabalho, mediante a exigência de tarefas diversas daquelas para as quais o empregado foi contratado, ou, ainda, acúmulo de atividades diversas e incompatíveis com a condição pessoal do trabalhador. Em outras palavras, ocorre quando o empregado é contratado para uma função e sofre acréscimo de tarefas por iniciativa unilateral do empregador. Desta forma, pretende receber, além da gratificação de caixa, a gratificação de tesoureiro, mais adicional de 30% sobre o seu salário. A despeito de relevantes, não há como acolher os argumentos dos recorrentes. Extrai-se dos descritivos funcionais de fls. 2210/2211 que as funções de caixa e de tesoureiro se diferenciam, basicamente, pela responsabilidade deste pelo cofre, incluída a responsabilidade pela guarda das chaves e da senha, bem como pelo abastecimento dos caixas, incluindo os terminais eletrônicos. Em depoimento pessoal, o preposto admitiu que a reclamante fazia o abastecimento do caixa eletrônico e que tinha acesso às chaves e às senhas do cofre do PAB, esclarecendo que por se tratar de posto de atendimento pequeno não havia tesoureiro designado. (fls. 2795/2796) Não há como negar, assim, que a reclamante extrapolava o feixe de atribuições da função de caixa. É importante esclarecer que somente se admite o acréscimo remuneratório por acúmulo de função caso haja previsão legal, contratual ou normativa para tanto, porque ao empregador, dentro de seu poder de direção empresarial, é conferido o direito de atribuir ao trabalhador outras funções ou atividades além daquela preponderante ou pactuada no contrato, sem que isso possa gerar, por si só, o direito a um acréscimo salarial. De se destacar, ainda, que o exercício de atribuições mais amplas do que as originalmente pactuadas, dentro de uma única jornada e para o mesmo empregador, não implicam em acréscimo salarial, desde que respeitado o feixe de atividades que integram a função. É certo dizer, portanto, que o verdadeiro desvio ou acúmulo de função consiste na modificação, não episódica ou eventual, pelo empregador, das funções originalmente conferidas ao empregado, destinando-lhe atividades, em geral, mais qualificadas e superiores, sem a respectiva contrapartida. Afinal, nos termos do artigo 456 , parágrafo único , da CLT , na falta de provas ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, a conclusão é a de que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal. No caso em apreço, a autora realizava o abastecimento do caixa eletrônico e acessava o cofre dentro da sua jornada regular de trabalho, sem que isso interferisse nas suas atribuições como caixa. Tais atribuições, contudo, pertencem à função de tesoureiro, razão pela qual ela tem o direito de receber a gratificação devida para esta função. Não há como acolher, por outro lado, a pretensão de recebimento das duas gratificações (de caixa e de tesoureiro), além de mais 30% de adicional por acúmulo de função, o que implicaria em enriquecimento ilícito, pois, como dito, tais tarefas eram feitas dentro da jornada de trabalho da autora. A r. decisão de Origem que deferiu as diferenças entre a gratificação de caixa e de tesoureiro se mostra, assim, acertada, não merecendo reforma, razão pela qual nego provimento aos recursos. Indenização por danos morais Busca o empregador o afastamento da condenação ao pagamento de indenização por danos morais no importe de R$20.000,00, ao argumento de que a autora autorizou o desconto salarial referente ao empréstimo consignado ajustado com a CAIXA, bem como dos valores superiores à margem consignável da sua conta corrente. Além disso, argumenta que o valor de desconto é autorizado no momento da pactuação do empréstimo, razão pela qual posterior redução salarial lícita em nada altera o valor ajustado e devidamente autorizado pelo empregado. No caso de ser mantida a condenação, requer a redução do valor arbitrado. A trabalhadora, por sua vez, busca a majoração da indenização, diante da gravidade da ofensa, potencializada pelo recém nascimento da sua filha e pela perda do cargo de Caixa, com a consequente redução salarial. Dessa forma, e com base nos critérios da proporcionalidade e da razoabilidade, requer a fixação da indenização no valor equivalente a 100 salários. À análise. Importante esclarecer, inicialmente, que a autora postulou indenização por danos morais com base em mais de um fundamento, no entanto, o pedido foi acolhido apenas em relação aos descontos do empréstimo consignado realizados pelo empregador após a redução salarial sofrida por ela ao deixar a função de Caixa, fazendo com que o limite legal de desconto fosse ultrapassado. Não houve, contudo, nenhuma insurgência da autora em relação à parcial rejeição do pedido, que requer apenas a majoração do valor arbitrado. Eis os fundamentos do julgado: "Com relação aos descontos salariais sofridos pela postulante, no entanto, tem-se que os elementos de convicção existentes nos autos indicam, seguramente, a violação ao princípio da intangibilidade salarial, em razão de conduta ilícita e abusiva, por parte da empregadora, para além das hipóteses autorizadas pelo art. 462 da CLT , uma vez extrapolado o percentual legal do desconto autorizado (que no caso em apreço seria de 30%, conforme § 1º do art. 1º da lei 10.820 /2003)- fato incontroverso nos autos. Por outro lado, deve-se pontuar que o contrato de empréstimo bancário, quando firmado diretamente entre a instituição financeira e o empregado, perde sua natureza estritamente civil, sujeitando-se aos ditames gerais da tutela contratual trabalhista (que, dentre as garantias civilizatórias, protege o empregado contra o assédio de seus credores), o que reveste de nulidade absoluta a cláusula autorizativa de utilização do" saldo de quaisquer contas, aplicação financeira e/ou créditos "de titularidade do devedor," em qualquer unidade da CAIXA, para liquidação ou amortização das obrigações assumidas "em decorrência do contrato de crédito consignado (cláusula 11a, fls. 2249 - pdf). Evidente, portanto, que a referida cláusula contratual civil não poderia se sobrepor, na situação em análise, ao próprio art. 462 da CLT , atraindo, ainda, a incidência dos arts. 9o , 444 e 468 da CLT , sem prejuízo da tutela principiológica e normativa de magnitude constitucional inserida no art. 7º , X , da Constituição Federal de 1988. Sendo assim, reputa-se configurado o dano moral referido pela postulante, porquanto presumido o impacto negativo em sua órbita subjetiva, decorrente dos descontos salariais ilícitos e abusivos. Por conseguinte, sopesando-se o quanto até aqui já foi considerado, e com fulcro nos escopos punitivos, compensatórios, satisfativos e pedagógicos da indenização em apreço, defere-se à postulante o pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais), a título de reparação por dano moral, a serem atualizados a partir da data da publicação da sentença, (assim considerada a data do arbitramento, nos termos da Súmula n. 439 do TST), e acrescidos dos juros legais, o que ficará a cargo da reclamada, na forma da lei, observando-se os termos da O.J. n. 07 do Tribunal Pleno do C. TST. Contribuições sociais e IRF não incidentes." Irretocável o julgado. De fato, o contrato de empréstimo bancário firmado diretamente pelo empregado e por seu empregador (instituição financeira) perde sua natureza estritamente civil, sujeitando-se aos ditames trabalhistas. Dessa forma, a previsão contratual de desconto dos valores acima da margem consignável diretamente de qualquer conta bancária ou aplicação financeira do trabalhador é abusiva, na medida em que submete o trabalhador ao arbítrio do credor, que se vale da condição de empregador e, ao mesmo tempo, de instituição financeira ao qual o empregado é vinculado para receber seu salário, para promover descontos relativos ao empréstimo regido pela Lei nº 10.820 /03 acima dos limites legais. Agiu o empregador, portanto, com abuso de direito, causando dano moral à trabalhadora, que se viu desprovida de boa parte de seu salário para quitar o empréstimo obtido do banco. Caracterizado o dano moral, ele deve ser compensado financeiramente a partir de uma estimativa que guarde alguma relação com o sofrimento causado. Não há, todavia, uma fórmula matemática capaz de traduzir as repercussões íntimas do evento em um equivalente financeiro. No caso em análise, considerando os fatos ocorridos, a posição social do ofendido, a gravidade da ofensa e a situação econômica do ofensor, entendo adequado o valor de R$20.000,00 arbitrado na r. sentença, pelo que fica mantido. Por tais motivos, nego provimento aos recursos. Recurso da trabalhadora Salário substituição Não se conforma a trabalhadora com a rejeição do pedido de recebimento do salário substituição com base no salário contratual do gerente Eduardo, substituído por ela nas férias de 2012, 2013 e 2014 (20 dias cada), tendo em vista o que estabelece a S. 159, I, do E. TST. Em que pesem os respeitáveis fundamentos da r. sentença, entendo que a trabalhadora tem razão em sua insurgência. A questão relativa ao salário substituição encontra-se pacificada pela S. 159 do E. TST, que tem o seguinte teor: "SUBSTITUIÇÃO DE CARÁTER NÃO EVENTUAL E VACÂNCIA DO CARGO I - Enquanto perdurar a substituição que não tenha caráter meramente eventual, inclusive nas férias, o empregado substituto fará jus ao salário contratual do substituído. II - Vago o cargo em definitivo, o empregado que passa a ocupá-lo não tem direito a salário igual ao do antecessor." (g .n.) No caso, é incontroverso que a autora substituiu o gerente Eduardo nos anos de 2012, 2013 e 2014 durante seus 20 dias de férias, conforme defesa do empregador. Não prospera, contudo, a tese patronal de que a autora tem direito apenas ao piso de mercado da função de gerente de atendimento pessoa física, e não ao salário do substituído, em razão do tempo de serviço deste empregado em relação ao tempo da autora. Ora, o instituto em discussão decorre da aplicação do princípio da isonomia salarial, insculpido no art. 5º da CLT , segundo o qual "a todo trabalho de igual valor corresponderá salário igual, sem distinção de sexo". Aliás, a não discriminação salarial foi elevada ao nível constitucional, nos termos do art. 5º , caput e I e art. 7º , XXXII da CF . Dessa forma, tendo a autora exercido as atividades daquele empregado durante a sua ausência, deveria ter recebido o valor correspondente ao salário dele durante o período de substituição, e não o piso de mercado da função. Por tais motivos, dou provimento parcial ao recurso da autora para condenar o empregador ao pagamento do salário substituição durante os períodos de substituição do funcionário Eduardo Akira Miura (fl. 2219), considerando-se o salário padrão mais gratificação de função recebida por ele, conforme contracheques apresentados às fls. 2320 e seguintes, com reflexos em férias + 1/3, 13º salário e FGTS. Intervalo para refeição A autora requer a reforma do julgado também em relação ao intervalo para refeição, ao argumento de que os próprios cartões de ponto indicam para dias em que o trabalho foi superior a 06 horas, citando como referência o mês de novembro de 2012. Mais uma vez, o inconformismo prospera. O cartão de ponto citado (novembro de 2012 - fl. 1768) indica trabalho superior a 06 horas com intervalo para refeição de apenas 15 minutos. Cite-se como exemplo o dia 05 daquele mês, em que a autora ingressou as 11:55 e encerrou a jornada as 18:14, extrapolando a jornada contratual de 06 horas em 19 minutos, tanto que há anotação de 09 minutos como crédito do banco de horas e 10 minutos remunerados. Outro exemplo é o dia 12, com início da jornada as 11:38 e término as 17:55, 17 minutos além das 06 horas contratadas. Nesse caso, tem direito a reclamante ao recebimento de 01 hora de intervalo para refeição pela infração ao art. 71 da CLT . Em situações como a do caso vertente, o certo é que o descumprimento da norma acarreta o pagamento do período integral do descanso, consoante entendimento cristalizado na Súmula 437 , I, do E. TST. A mesma Súmula, aliás, já reconheceu a natureza salarial da verba em questão, de modo que os reflexos deferidos na origem são realmente exigidos. A partir de 11/11/2017, contudo, diante da alteração da redação do art. 71 , § 4º , da CLT pela Lei nº 13.467 /17, somente é devido o tempo não usufruído (45 minutos) de forma indenizatória. Isso porque, em matéria de direito intertemporal, preservam-se o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, a teor dos artigos 5º , inciso XXXVI , da Constituição Federal e 6º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Contudo, não se pode confundir "direito adquirido" com mera "expectativa de direito". Assim, seja em relação aos novos contratos de trabalho, seja quanto aos vínculos que, mesmo iniciados anteriormente, se extinguiram após a entrada em vigor da Lei n. 13.467 /17, as normas de direito material têm incidência imediata a expressa previsão legal, a partir do dia 11/11/2017, não comportando, contudo, aplicação retroativa: as prestações contratuais já consolidadas não se afetam, porém as novas prestações sucessivas submetem-se à nova lei. Por tais razões, dou provimento parcial ao recurso da trabalhadora para condenar o empregador ao pagamento do intervalo para refeição de 01 hora com o adicional de 50% e reflexos em DSR´s, férias + 1/3, 13º salário e FGTS até 10/11/2017, e de 45 minutos de forma indenizada a partir de 11/11/2017, que deverão ser calculados com a aplicação do divisor 180 (S. 124 do E. TST). Indenização por danos morais - cobrança excessiva de metas e tratamento ofensivo Ao argumento de que, ao contrário do que restou decidido, houve pedido específico de indenização por danos morais em razão da cobrança excessiva de metas e do tratamento ofensivo recebido por parte do seu gestor, busca a autora a reforma do julgado no aspecto, diante da prova produzida. Não há o que alterar na r. sentença, em que pesem os respeitáveis argumentos da recorrente. Verifica-se da petição inicial pedido de indenização por danos morais em razão do transporte de valores, das doenças que teriam sido originadas no trabalho e da transferência de agência com a perda da função de caixa. As questões relativas ao tratamento recebido do seu superior hierárquico, bem como das pressões e cobranças sofridas no ambiente de trabalho se incluem na causa de pedir das indenizações por danos materiais e morais decorrentes dos transtornos psicológicos que a autora afirma terem surgida no trabalho. Correta, portanto, a r. decisão de embargos de declaração. Nada a reformar, portanto. Doença ocupacional - indenização por danos materiais e morais Não se conforma a autora com a rejeição dos pedidos de indenização por danos materiais e morais decorrentes de doença ocupacional, diante do que restou apurado nas perícias médicas realizadas, que indicam que o trabalho ao menos contribuiu para as patologias. Afirma ter sofrido grande pressão por parte dos seus superiores hierárquicos, principalmente após se apresentar gestante. Relata que após a licença-maternidade, passou por situações demasiadamente estressantes, em razão da mudança do sistema do banco, ao qual teve que se adaptar com rapidez para cobrir as férias do gerente da unidade, o que a levou a se afastar do trabalho após o fim da substituição, devido à alta carga de estresse. Quanto aos problemas de coluna, aponta para o atestado de saúde periódico realizado em 2014, que indica a postura inadequada e os movimentos excessivos como fatores de risco. Em que pesem os relevantes argumentos da trabalhadora, não há como acolher o pedido de reforma. Pela legislação civil, ressalvada a hipótese em que, por decorrência ínsita à atividade desenvolvida pelo empregado que lhe exponha naturalmente à situação de risco (art. 927 , parágrafo único , do CC)- quando se tem a responsabilidade objetiva do causador do dano-, a responsabilidade civil só se caracteriza, em regra, frente a possíveis danos materiais (emergentes e lucros cessantes) e morais, quando presentes o ato ilícito (decorrente de ação dolosa ou culposa do causador de um dano), o dano e o nexo causal em relação aos dois requisitos antecedentes. Entretanto, é preciso acurada atenção na análise da presença desses requisitos, notadamente quando ocorridos no ambiente laboral. É que, nessa hipótese, não se pode desprezar a presença do próprio fortuito interno, consistente no fato de que, ao lançar-se na exploração de um determinado empreendimento econômico, o empregador assume, por força legal (art. 2º da CLT ), todos os riscos desse empreendimento, nisso estando incluído, por certo, a atenção e asseguração de um ambiente laboral sadio, salubre e não perigoso (resumidamente, o viés psicofísico da ambiência e saúde laboral), de onde se conclui que, ocorrido acidente ou doença profissional, é da ordem natural das coisas que recaia sobre o empregador, em princípio, o ônus de comprovar que geriu o ambiente de trabalho dessa maneira. A ordem constitucional propõe-se a valorizar princípios como o da dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e a livre iniciativa, entronizando em seu texto a necessidade de uma ordem econômica e social pautada igualmente na valorização do trabalho humano, na função social da propriedade, assegurando a todos uma existência digna e sob os ditames da justiça social. Diante de tal arcabouço jurídico, não parece razoável ou aceitável conceber outra conduta, senão e no mínimo, a de que a distribuição do ônus probatório desses elementos (filtros) da reparação civil se faça ou se direcione no sentido de atribuir a quem efetivamente detém o poder de produção, no caso, a empregadora. Nesse sentido, ocorrido o dano (acidente ou doença profissional), vinculado ao trabalho desenvolvido (nexo causal ou concausal), a culpa não existirá somente se comprovada alguma de suas excludentes, e por quem efetivamente detém a plena ou mais adequada aptidão para essa prova, ou seja, a empregadora. Segundo consta da petição inicial, a trabalhadora foi admitida pelo empregador em 08/05/2008, passando à função de caixa em maio de 2012 e à função de técnica bancária em setembro de 2014, estando com o contrato ativo. Afirma que antes de assumir o posto de caixa, realizou exames médicos, que indicam normalidade da coluna cervical e das mãos. Diz que o ambiente de trabalho era muito estressante, tendo havido piora das cobranças após o anúncio da sua gravidez, em janeiro de 2013. Relata ter sofrido verdadeira pressão psicológica, com agressões verbais e psicológicas por parte do seu gestor, incluindo ameaças de transferência para outra agência. Após a licença-maternidade, alega ter sofrido pressão para acompanhar as mudanças do sistema do banco, especialmente porque deveria substituir o gerente durante as suas férias, situação que a levou a procurar ajuda médica em razão dos transtornos psicológicos, sendo identificada crise de artrite reumatoide. A partir daí, também foram constatados problemas de coluna e transtornos osteomusculares nas mãos e ombros. Por fim, diz que após retornar de alguns afastamentos médicos, foi transferida de agência, tendo perdido a função de caixa. O empregador contesta o pedido, alegando que nenhuma das patologias relatadas pela autora tem relação com o trabalho. O primeiro laudo médico (fls. 2701/2718), elaborado pelo Dr. André Luís Caracio, apresenta a seguinte conclusão: "Após os estudos pertinentes com realização de exame médico pericial realizado junto ao Reclamante, analise das atividades profissionais desempenhadas pelo autor, de seu quadro clinico e dos documentos acostados nos autos, podemos concluir que: Existiu incapacidade laborativa. No momento não existe incapacidade laborativa. Não há nexo causal da solicitação do Reclamante." A autora apresentou impugnação à prova pericial (fls. 2722/2725) e na audiência realizada em 28/11/2018 (fls. 2758/2760) requereu e teve deferido o pedido de nova perícia, sem substituição da anterior. O segundo laudo pericial (fls. 2771/2782), elaborado pelo Dr. Fernandoi Doro Zanoni, tem a seguinte conclusão: "A autora refere que as patologias se iniciaram devido as atividades realizadas no trabalho, mas sabemos que as alterações inflamatórias como a tendinopatia pode surgir de problemas diversos, como alterações hormonais (no caso hipotiroidismo), gravidez e processos de artrite (como há suspeitas sobre artrite, que não confirma, nem afastada até o momento de maneira, mas fez uso de hidroxicloroquina por um período). Não apresentou outra ENMG de MMSS para afastar ou confirmar a presença de síndrome do túnel do carpo, apesar do US mostrar aumento do nervo, clinicamente no momento da perícia, não mostrou suspeitas sobre a patologia de síndrome do túnel do carpo, mas demostrou sintomas de processo infamatório como já foi demonstrado em exames anteriores de tendinopatia e tenossinovite. Por tanto não há como afirmar que seja exclusivamente pelo trabalho o início das patologias ortopédicas." Das respostas aos quesitos formulados, extrai-se relevantes informações. Vejamos. Sobre o histórico de doenças antes das patologias que, segundo a autora, teriam surgido do trabalho realizado no banco, apontou o perito para hipotiroidismo, enxaqueca e depressão (na adolescência), afirmando que podem atuar como fator de pré-disposição destas doenças. Além disso, disse que o tabagismo também pode predispor tais doenças. No que se refere à artrite rematóide sofrida pela reclamante, disse o perito que não pode ser agravada por fatores externos, como movimentos repetitivos, posturas inadequadas e estresse, por se tratar de doença autoimune. Por outro lado, afirmou que a depressão pode gerar ou agravar a tensão muscular, aumentando a sintomatologia. A despeito disso, disse que a reclamante estava submetida a riscos ergonômicos próprios da atividade bancária, mas afirmou que sua função não exigia posturas inadequadas, diante do suporte apropriado fornecido, e que os movimentos não são repetitivos de maneira exaustiva e extenuante com esforço. Além disso, consigna que a reclamante não relatou melhoras do quadro clínico após deixar a função de caixa. Com relação à protrusão discal, à artrose lombar e à tenossinovite de mão e punho direitos, o perito informou que podem decorrer da artrite reumatoide ou terem causa independentes. Neste caso, disse que podem ser decorrentes da idade, devido às alterações degenerativas, do hipotiroidismo, da gestação, entre outros diversos fatores. Por fim, no que tange aos transtornos psiquiátricos, que teriam nexo técnico epidemiológico com a atividade bancária, o perito afirmou que "não necessariamente", especialmente no caso em análise, porque as alterações depressivas foram demonstradas previamente na adolescência. No que se refere à capacidade de trabalho, afirmou o Vistor que a autora se encontra trabalhando normalmente. As provas periciais produzidas no processo não amparam a tese da inicial de que as patologias da autora têm origem ocupacional, nem mesmo de que atuaram como fator de agravamento de doenças pré-existentes. A questão da cobrança excessiva de metas e do tratamento ofensivo não restou comprovado, porque a prova testemunhal se mostrou absolutamente dividida sobre a questão. Enquanto a testemunha Monique disse que o gerente Eduardo, pessoa que se exaltava com facilidade, gritava com a reclamante, o Sr. Ronaldo afirmou que tal gestor era tranquilo e educado, já tendo presenciado a cobrança de metas em relação à reclamante de forma normal entre funcionários (fls. 2796/2797). Importante observar que os atestados médicos juntados ao processo (fls. 63 e seguintes) indicam as mais variadas doenças e indisposições, tais como sinusite, pneumonia, infecção viral, cistite, cefaleia, etc, que nada se relacionam às doenças que teriam surgido pelo trabalho. Além disso, como bem observado pelo julgador de Origem, presume-se que os transtornos psiquiátricos decorrem dos impactos psicológicos e emocionais provenientes dos eventos gestacionais destacados pelo perito, reforçando o afastamento do nexo técnico epidemiológico com o trabalho. Para melhor compreensão do que restou decidido, vale transcrever os relatos feitos no início do laudo (fl. 2771): "Autora com 37 anos, refere que trabalha há cerca de 11 anos em banco, evoluindo com início dos sintomas após sua gestação em 2014, apresentando dores poliartralgicas, parestesia e edema generalizado, procurou atendimento, sendo observado alterações nas provas inflamatórias e devido as mesmas, procurou a especialidade de reumatologia, sendo acompanhada com suspeita de artrite, chegou a fazer uso de hidroxicloroquina por um período (SIC), mas sem grande resultado nos sintomas, descoberto pelo reumatologista também, alterações em sua coluna. Nessa investigação, foi observado também alterações de síndrome do túnel do carpo e processos inflamatórias de tendinopatia diversas (SIC). Apresentou nesses anos 3 gestações, sendo que teve um aborto, um filho vivo e um faleceu após o parto. Na sua última gestação, apresentou complicações graves, teve que ser submetida a cesariana de urgência, perdeu muito sangue, infelizmente seu filho não sobreviveu. Ela necessitou ficar na UTI, teve parada cardiorrespiratória, com risco de morte naquele momento, e por todas essas complicações acarretou em agravamento de problemas emocionais prévios (que começaram a ser avaliados por psicólogo em 2014), desenvolvimento de fibromialgia potencializando o quadro inicial e outras complicações atuais como aderências intestinais entre outros. Nesse período ficou afastada por 9 meses, até se recuperar de maneira aceitável, retornando para sua atividade no banco. Não teve indicação cirúrgica do ponto de vista ortopédico até o momento e foi submetida a tratamento conservador, com medicação, fisioterapia e hidroterapia. Atualmente ainda está trabalhando no banco e fazendo caminhada 3 vezes na semana." (g .n.) Como se não bastasse tudo que se apurou, é certo que a autora nunca se afastou pelo INSS para o tratamento das patologias osteomusculares e psiquiátricas que aponta como sendo decorrentes do trabalho. De se destacar que o simples fato de o atestado de saúde ocupacional periódico realizado em agosto de 2014 (fl. 57) apontar para a postura inadequada e para movimentos excessivos como fatores de risco ocupacional não é suficiente para o reconhecimento da existência de nexo causal ou concausal entre as patologias e o trabalho, até porque ficou comprovado que a autora atuava em um posto de atendimento bancário, cujo movimento é inferior ao de uma agência bancária normal. Por fim, embora a autor tenha deixado de exercer a função de caixa em setembro de 2014, não relatou melhoras do quadro clínico ao perito responsável pela segunda perícia, realizada em fevereiro de 2019, o que corrobora a conclusão de ausência de nexo causal ou concausal. Não há, assim, como reconhecer a responsabilidade do empregador pelas patologias que acometem a trabalhadora. Nada a reformar, portanto. Honorários assistenciais Por fim, razão assiste à trabalhadora quanto aos honorários assistenciais. Conforme já esclarecido acima, não se aplicam as regras processuais criadas ou alteradas pela Lei nº 13.467 /17 aos processos distribuídos antes de sua vigência. No caso em apreço, portanto, os honorários advocatícios somente podem ser arbitrados se presentes os requisitos da Lei nº 5.584 /70. Verifica-se que a autora apresentou declaração de pobreza (fl. 45) e está assistida pelo Sindicato da Categoria (fls. 44 e 46). Por tais razões, dou provimento ao recurso da trabalhadora para condenar o empregador ao pagamento dos honorários assistenciais no importe de 20% sobre o proveito econômico da ação. Prequestionamento Para fins de prequestionamento, fica expressamente consignado que a presente decisão não afronta qualquer dispositivo legal, inclusive de âmbito constitucional, especialmente os referidos pelos litigantes, nem contraria Súmulas e Orientações das Cortes Superiores, sendo desnecessário, portanto, a interposição de Embargos de Declaração para tal finalidade. Diante do exposto, decido conhecer do recurso CAIXA ECONOMICA FEDERAL e o DESPROVER; e conhecer do recurso de PRISCILLA CAROLINE DIAS LEITE e o PROVER EM PARTE para condenar o empregador ao pagamento a) do salário substituição durante os períodos de substituição do funcionário Eduardo Akira Miura com reflexos em férias + 1/3, 13º salário e FGTS; b) do intervalo para refeição de 01 hora com o adicional de 50% e reflexos em DSR´s, férias + 1/3, 13º salário e FGTS até 10/11/2017, e de 45 minutos de forma indenizada a partir de 11/11/2017, que deverão ser calculados com a aplicação do divisor 180 (S. 124 do E. TST); e c) dos honorários assistenciais no importe de 20% sobre o proveito econômico da ação, nos termos da fundamentação. Para fins recursais, rearbitra-se o valor de R$50.000,00 à condenação e de R$1.000,00 às custas processuais, ainda a cargo do empregador.