TRF-3 - HABEAS CORPUS: HC XXXXX20154030000 SP
HABEAS CORPUS. PENAL. PROCESSO PENAL. INTERCEPTAÇÕES TELEFÔNICAS. FORO POR PRERROGATIVA DE FUNÇÃO. COMPETÊNCIA NÃO PRORROGADA. ORDEM VÁLIDA PARA NÃO DETENTORES DE PRERROGATIVA DE FORO. PROVA LÍCITA COM RELAÇÃO AOS PACIENTES. ORDEM DENEGADA. 1. Habeas corpus impetrado com o intuito de pleitear o reconhecimento da nulidade de provas obtidas por meio de interceptações telefônicas autorizadas por Juízo de primeiro grau. Interceptações que foram prorrogadas após a constatação de indícios de participação, nos fatos, de detentores de prerrogativa de foro. 2. O foro por prerrogativa de função fixa a competência do órgão jurisdicional, relativamente às autoridades que o detém, para a prática de todos os atos que exijam autorização/decretação judicial, inclusive em sede de supervisão de inquérito ou de realização de medidas cautelares. 3. Conquanto sejam enumeradas taxativamente as competências jurisdicionais decorrentes dos casos de foro por prerrogativa de função previstos na Lei Maior (e em suas congêneres estaduais), é pacífica a jurisprudência dos tribunais superiores quanto ao fato de que se aplicam, com acentuados temperamentos, as regras processuais penais de conexão e continência também ao instituto da competência decorrente das hipóteses de prerrogativa de foro normativamente previstas. Ademais, também é consolidada a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal no sentido de que, constatados indícios de participação - nos fatos investigados - de agentes detentores de foro por prerrogativa de função, deve a integralidade das investigações ser remetida ao órgão ad quem (aquele com competência para supervisionar a investigação, processar e julgar os que ostentam a prerrogativa de foro). 3.1 Não obstante isso, em respeito à excepcionalidade inerente ao próprio instituto da prerrogativa de foro - do que decorre a taxatividade das disposições que o preveem -, adotou a Suprema Corte, em precedentes recentes, a posição de que a competência determinada pela prerrogativa de função é de direito estrito, ressalvados os casos em que os fatos devam ser apurados no próprio âmbito do órgão ad quem, sob pena de graves prejuízos às investigações ou à própria prestação efetiva da jurisdição. Desse modo, apenas em casos excepcionais e de efetiva necessidade, a ser aferida pelo órgão ad quem, é que se prorroga a competência decorrente de prerrogativa de função, abarcando o julgamento de réus que não detém, eles mesmos, a prerrogativa de serem processados e julgados perante aquele órgão jurisdicional. Não se tem, pois, "mera" conexão, mas, ao contrário, reconhecimento de prorrogação da competência do órgão jurisdicional superior apenas nos casos em que a apuração dos fatos em tese relativos ao não detentor da prerrogativa de foro apresentem identidade ou grande imbricação e encadeamento com aqueles relativos, também em tese, a pessoa detentora do foro por prerrogativa de função. 4. Não se trata de questão atinente à mera conveniência da instrução penal. Trata-se, isto sim, da correta e constitucional aferição de competência por parte do órgão ad quem, a qual só se estende/prorroga em casos de contexto fático de tal grau de ligação ou mesmo identidade com os relativos (em tese) a agente que ostenta prerrogativa de foro, que seja imprescindível à própria efetivação e coesão da jurisdição in concreto que haja a unidade de processamento. Excepcionalidade fática e necessidade que ensejam o reconhecimento de que a Constituição , nesses casos, admite a prorrogação da competência decorrente de prerrogativa de função. 5. Não se controverte que os autos devem ser remetidos, assim que possível, ao órgão jurisdicional ad quem quando constatados indícios de participação de agentes detentores de foro por prerrogativa de função nas supostas práticas ilícitas objeto da investigação. Ocorre que dessa competência para exame a respeito da conexão e da continência (no sentido específico e restritivo que ostentam tais institutos no que tange ao foro por prerrogativa de função) não decorre uma imediata assunção da competência pelo órgão ad quem com relação a todos os fatos e pessoas investigadas. A competência será aferida pelo órgão ad quem e, como regra, constatará ele ser caso de desmembramento da investigação ou do processo no que tange aos agentes que não ostentem prerrogativa de foro. 6. O ato de desmembramento dos autos pelo órgão ad quem (com relação a agentes não detentores de prerrogativa de foro) apenas reconhece não ter havido, em nenhum momento, competência do órgão ad quem para efetivamente supervisionar investigação ou conduzir o processo criminal e, portanto, constatando que compete - e sempre competiu - ao órgão a quo presidir o feito. Trata-se de ato processual de natureza declaratória. 7. A competência para aferição a respeito do âmbito de abrangência da própria competência por prerrogativa de função incumbe ao órgão ad quem, mas não se trata de deslocamento imediato da competência global relativa àqueles fatos, e sim de remessa para que o próprio órgão ad quem analise e determine tal âmbito. Por certo, poderá o órgão ad quem, então estiverem sob sua guarda e análise os autos, determinar medidas necessárias à preservação e continuidade das investigações. No entanto, é essa capacidade algo instrumental, e decorre não de sua imediata competência para presidir o feito globalmente considerado, mas de sua competência para analisar qual parcela dos fatos deverá ser, doravante, mantida sob sua supervisão ou presidência. 8. Se há a determinação de desmembramento, pelo órgão ad quem, e se isso se baseia na constatação de que aqueles fatos (cuja investigação ou julgamento se desmembra) não se adstringem à sua esfera constitucional de competências, há um reconhecimento de que todos os atos praticados pelo órgão a quo com relação aos investigados ou réus dos autos desmembrados foram praticados por autoridade competente para fazê-lo. Em casos como esse, a usurpação da competência (pelo órgão a quo) do órgão ad quem e a consequente ilicitude das provas se dá apenas quanto a agentes detentores de prerrogativa de foro, mas não quanto àqueles cujos processos são desmembrados e remetidos novamente ao órgão de onde originariamente provieram. 9. No caso da impetração, não houve usurpação da competência desta E. Corte, mas descumprimento procedimental relativo ao momento de remessa dos autos para a aferição da competência do órgão ad quem, do que não decorreu prejuízo aos pacientes, porquanto era o órgão a quo o efetivamente competente para a decretação das medidas. 10. Provas lícitas com relação aos pacientes. Constrangimento ilegal não caracterizado. Ordem denegada.