PROCESSO CIVIL. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 1.017 DO CPC . PEÇAS OBRIGATÓRIAS DEVIDAMENTE JUNTADAS E CATALOGADAS. FALHA DE PROCEDIMENTO NA JUNTADA DE PEÇAS FACULTATIVAS. NÃO CONHECIMENTO DO AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO ESPECIAL. DELIMITAÇÃO DE CONTROVÉRSIA JURÍDICA. NÃO INCIDÊNCIA DO ÓBICE DA SÚMULA N. 7 DO STJ. ADMISSIBILIDADE IMPLÍCITA. PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS. PRIMAZIA DO JULGAMENTO DE MÉRITO. RECURSO ESPECIAL PARCIALMENTE CONHECIDO PARA RECONHECER A PRELIMINAR DE OFENSA AO ART. 1.017 DO CPC . AGRAVO INTERNO. DECISÃO MANTIDA. I - Na origem, trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de liberação de valores bloqueados, proferida em processo de execução fiscal ajuizada pelo Estado do Rio Grande do Sul. No Tribunal a quo, o agravo de instrumento foi inadmitido monocraticamente e o agravo interno interposto dessa decisão teve seu provimento negado. Após decisão que inadmitiu o recurso especial foi interposto agravo, que foi conhecido para conhecer em parte do recurso especial para acolher a preliminar de ofensa ao art. 1.017 do CPC . II - Na decisão agravada, a controvérsia foi delimitada da seguinte forma: "Com efeito, cinge-se a controvérsia na definição da necessidade ou não de identificação do conteúdo material das peças facultativamente apresentadas pela parte agravante quando da interposição do recurso de agravo de instrumento na origem". Assim, foi implicitamente afastada a incidência da Súmula n. 7 do STJ na hipótese. III - Anote-se que a Corte Especial deste Tribunal já se manifestou no sentido de que o juízo de admissibilidade do especial pode ser realizado de forma implícita, sem necessidade de exposição de motivos. Assim, o exame de mérito recursal já traduz o entendimento de que foram atendidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade, inexistindo necessidade de pronunciamento explícito pelo julgador a esse respeito. (EREsp XXXXX/PI, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Corte Especial, DJe 19/12/2014). No mesmo sentido: AgInt no REsp XXXXX/MG , relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado em 10/8/2020, DJe 26/8/2020; AgRg no REsp XXXXX/SC , relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/6/2015; AgRg no Ag XXXXX/AL , relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 3/4/2014.) IV - Dessa forma, a decisão recorrida deve ser mantida por seus próprios fundamentos, devendo a preliminar de ofensa ao art. 1.017 do CPC/2015 ser acolhida. V - De fato, cabia à parte agravante apresentar as peças obrigatórias para interposição do agravo de instrumento e, facultativamente, apresentar peças reputadas úteis, nos termos do art. 1.017 , I , II e III , do CPC/2015 . VI - O acórdão recorrido desproveu o agravo interno colacionando a decisão monocrática e alegando que tal decisão havia esgotado o exame da matéria, o qual aplicou o princípio da identificação do teor material dos arquivos nos autos eletrônicos, decorrente da regra prevista no art. 6º, IV, do Ato da Presidência do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul n. 17/2012, para, ao final, deter-se à questão processual do não conhecimento, reputando prejudicadas as questões de mérito. VII - Da leitura do art. 1.017 , I , do CPC/2015 , denota-se que a parte agravante deve apresentar, na interposição do recurso de agravo de instrumento, as peças obrigatórias, que são as cópias da petição inicial, da contestação, da petição que ensejou a decisão agravada, da decisão agravada, da certidão da respectiva intimação (ou outro documento oficial que comprove a tempestividade) e as procurações outorgadas aos advogados do agravante e do agravado. E o seu inciso III faculta à parte agravante apresentar outras peças que reputar úteis. VIII - Depreende-se, portanto, que a admissibilidade do recurso de agravo de instrumento está condicionada, tão somente, à apresentação da petição recursal e à juntada das peças consideradas obrigatórias por expressa determinação legal. Assim, mostra-se necessária a indicação do conteúdo material apenas das peças obrigatórias, ou seja, daquelas sem as quais o recurso não será admitido. IX - A ausência de "lançamento individualizado" e de especificação do conteúdo material das demais peças apresentadas, por serem facultativas, não pode, por óbvio, impedir o conhecimento do agravo de instrumento, se já apresentadas as peças obrigatórias para a formação do instrumento, com a respectiva indicação de cada peça, como ocorreu na espécie. O entendimento firmado na decisão monocrática e corroborado pelo colegiado do Tribunal a quo - qual seja: de que também se deve indicar o conteúdo material das peças facultativamente apresentadas - não possui amparo no ordenamento jurídico, no CPC/2015 e mesmo na Lei n. 11.419 /06, que disciplina a informatização do processo judicial. X - Nesse passo, acolher tal entendimento configura inaceitável e inexplicável tratamento desigual na admissibilidade do recurso de agravo de instrumento se comparada, em tese, à hipótese de agravante que apresente apenas as peças obrigatórias, com a respectiva indicação do conteúdo material de cada uma delas, a qual teria seu recurso, em tese, conhecido pelo Tribunal. Nesse sentido, caso as peças facultativamente apresentadas não estejam corretamente indicadas ou especificadas, basta que o Tribunal não as aprecie, ignorando os documentos juntados, hipótese na qual poderá, em tese, recusar-se a analisá-las. XI - O Código de Processo Civil de 2015 consagrou o princípio da primazia do julgamento do mérito como um de seus pilares fundamentais. De fato, deve-se evitar o formalismo exacerbado e o rigor desmesurado, prestigiando-se a resolução do mérito da demanda, isto é, a efetiva prestação jurisdicional requerida pelas partes. Em que pese à relevância das formalidades expressamente previstas em lei e necessárias à prática de ato processual, dessume-se a necessidade de afastar as que sejam notoriamente desnecessárias, de forma a permitir o saneamento de vícios menos graves, em prol do julgamento de mérito da demanda. XII - Por fim, deve-se ter em mente que o processo não constitui um fim em si mesmo, e sim um instrumento para a realização do direito material, segundo preceitua o princípio da instrumentalidade das formas. Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte Superior: AgInt nos EDcl no AREsp XXXXX/MG , relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 11/11/2019, DJe 18/11/2019; AgInt no AREsp XXXXX/MG , relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 19/6/2018, DJe 25/6/2018; AgRg no AREsp XXXXX/PA , relator Ministro Jorge Mussi, Quinta Turma, julgado em 20/2/2018, DJe 2/3/2018. XIII - No caso sob exame, a agravante juntou e especificou cada uma das peças obrigatórias elencadas no art. 1.017 , I , do CPC/2015 , na interposição do agravo de instrumento na origem, sendo indevido o não conhecimento do recurso por ausência de lançamento individualizado e especificação do teor material das peças facultativamente apresentadas, pois referida exigência, além de não encontrar respaldo legal, viola os princípios da primazia do julgamento do mérito e da instrumentalidade das formas ( AREsp n. 1.276.659 , DJe 23/10/2018; AREsp n. 1.417.793 , DJe 11/02/2019.) XIV - Dessa forma, deve o Tribunal de origem prosseguir na análise da admissibilidade do agravo interno lá interposto, desconsiderando a exigência, que ora se afasta. XV - Agravo interno improvido.