TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO SEGUNDA TURMA RECURSAL FAZENDÁRIA Processo nº XXXXX-52.2016.8.19.0001 Recorrente: Município do Rio de Janeiro Recorrido: CAROLINA BEATRIZ FONSECA FERRETTI RECURSO INOMINADO. JUIZADO DE FAZEN-DA PÚBLICA. INSULINA LANTUS (GLARGI-NA). INSULINA APIDRA (GLULISINA). MEDI-CAMENTO NÃO INTEGRA NENHUMA LISTA OFICIAL PARA DISPENSAÇÃO NO SUS. PA-RECER FAVORÁVEL DO NAT. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA PARCIAL CONFIRMANDO A LIMINAR. RECURSO DO MRJ. DESPROVI-MENTO RELATÓRIO Trata-se de ação pelo rito especial da Lei n. 12.153 /09 em que a parte autora, portadora de DIABETES MELLITUS TIPO1 (CID 10 - E10) requereu a condenação do Estado do Rio de Janeiro e do Município do Rio de Janeiro ao fornecimento do medi-camento INSULINA LANTUS (GLARGINA) e INSULINA APIDRA (GLULISINA). Laudo médico à fl. 23. Parecer do NAT às fls. 34/38, confirma que os medicamentos pleiteados são al-ternativas adequadas para o seu quadro clínico. Decisão deferindo o pedido de tutela antecipada para que os réus autorizem, em 5 dias, o fornecimento dos medicamentos solicitados na inicial. fl. 49/50. Contestação do Estado do Rio de Janeiro às fls. 55/65, em que alega que embora a insulina postulada pela parte autora não seja padronizada pelo Sistema Único de Sa-úde (SUS), a rede pública já fornece gratuitamente outras insulinas similares, com idêntica eficácia terapêutica, fornecidas gratuitamente para o tratamento da doença que acomete o demandante. Por fim, sustenta a ilegalidade de multa cominatória Contestação do Município do Rio de Janeiro às fls. 76/93. O Município impugna o valor da causa e suscita preliminar de falta de interesse de agir e, no mérito, sustenta a existência de política pública eficaz para o tratamento de diabetes no âmbito do MRJ além da presunção de eficiência quanto aos medicamentos fornecidos pelo SUS, pois o relatório médico não demonstra que a autora tenha sido submetido a tratamento esta-belecido no programa. Sustenta ainda a sua ilegitimidade tendo em vista a divisão de competência presente no Termo de Cooperação. Por fim, alega a impossibilidade de fornecimento dos insumos e medicamentos pleiteados, por não fazerem parte de ne-nhuma lista oficial de dispensação. Pedido de inclusão de novo medicamento/insumo a lista de requerimento da parte autora à fl. 95 requerendo por 180 fitas para glicosímetro por mês. Parecer do MP às fls. 101/102 pela procedência do pedido autoral e confirma-ção da tutela antecipada. Parecer do NAT às fls. 111/103, afirmando que as fitas para glicosímetro está indicado para o tratamento da autora conforme laudo de fl. 96. Parecer MP á fl. 121 reiterando seu parecer anterior. Atualização da lista de medicamentos às fls. 130/131, sendo esta de ¿INSULI-NA LEVEMIR ¿ VALOR 3 MESES ¿ R$ 998,34 - INSULINA APRIDA ¿ VALOR 3 MESES ¿ R$ 260,10 - AGULHAS 4 OU 6CM ¿ VALOR 3 MESES (600 AGULHAS) ¿ R$ 533,40.¿ Alega também que a decisão não havia sido cumprida até aquele momen-to. Parecer do MP às fls. 145, pelo deferimento do requerido pela autora. Decisão de fl. 147, deferindo o sequestro. Sentença de procedência parcial do pedido às fls. 235/237, nos seguintes termos: "JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE O PEDIDO, confirmando a medida de antecipação dos efeitos da tutela, pelo que extingo o processo, com resolução do méri-to, na forma legal, para condenar os réus, SOLIDARIAMENTE, ao fornecimento do medicamento/insumo mencionado na inicial, necessário à manutenção da saúde da autora, mediante apresentação de receita e atestado médico atualizado, enquanto per-durar a necessidade.¿ No Recurso Inominado de fls. 253/258, requer o Município do Rio de Janeiro a reforma da sentença no que tange ao fornecimento de medicamentos, considerando que o Estado é o responsável pelo fornecimento dos medicamentos pleiteados, essa siste-matização afasta, por conseguinte, a concepção de solidariedade nesta seara e que sua condenação oneraria em demasia as finanças públicas. Parecer do MP às fls. 305, pela manutenção da sentença. Contrarrazões da parte autora não foram apresentadas. VOTO Presentes os requisitos extrínsecos e intrínsecos do recurso inominado. Voto pelo co-nhecimento do recurso do MRJ. Frise-se, inicialmente, que a competência para cuidar da saúde, nos termos da CRFB/88 , é comum da União, Estados e Municípios (art. 23, II). Em se tratando de competência comum, os entes estatais atuam em pé de igualdade dentro da área de atuação, sem que a ação de um deles venha a excluir a do outro. A responsabilidade, portanto, recai também sobre o Município, que não pode se furtar a assumir sua com-petência constitucional de cuidar da saúde do cidadão. No tocante à solidariedade do Estado e do Município quanto à obrigação constitucional em questão, esta decorre, da mesma forma, da aplicação do mesmo artigo 23 , II da CRFB/88 que prevê a competência comum e, portanto, direta e solidária de todos os entes da Federação brasileira. Cite-se, neste sentido a súmula 65 deste E. TJRJ:"Deriva-se dos mandamentos dos artigos 6º e 196 da Constituição Federal de 1988 e da Lei nº 8.080 /90, a responsabilidade solidária da União, Estados e Municípios, garan-tindo o fundamental direito à saúde e conseqüente antecipação da respectiva tutela."Deve ser ainda observado o disposto pelo STF quando do julgamento do RE 855.178 e que ensejou a elaboração do Tema 793 pela sistemática da repercussão geral:"O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Esta-do, sendo responsabilidade solidária dos entes federados, podendo figurar no polo pas-sivo qualquer um deles em conjunto ou isoladamente.""RECURSO EXTRAORDINÁRIO. CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. DI-REITO À SAÚDE. TRATAMENTO MÉDICO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERADOS. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA. REAFIR-MAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA. O tratamento médico adequado aos necessitados se insere no rol dos deveres do Estado, porquanto responsabilidade solidária dos entes federados. O polo passivo pode ser composto por qualquer um deles, isoladamente, ou conjuntamente. ( RE 855.178 RG/SE. Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 06/03/2015, acórdão publicado no DJe de 06/03/2015). O direito à saúde é um direito fundamental do cidadão, dada sua relevância para a vida humana. É consagrado no art. 196 da CRFB/88 que garante a todos o acesso universal igualitário às ações e serviços de combate às doenças. Em tais hipóteses, ante a não padronização em qualquer lista administrativa do SUS dos insumos postulados, aplica-se o entendimento firmado pelo STJ quando do julga-mento do Recurso Especial XXXXX/RJ (Tema 106), retificado em sede de embargos de declaração, verbis: "Dcl no REsp XXXXX/RJ . EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPE-CIAL XXXXX/XXXXX-7. Relator (a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142) Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO. Data do Julgamento 12/09/2018. Data da Pública-ção/Fonte DJe 21/09/2018. (...) TESE FIXADA: A tese fixada no julgamento repetitivo passa a ser: A concessão dos medicamentos não incorporados em atos normativos do SUS exige a presença cu-mulativa dos seguintes requisitos: i) Comprovação, por meio de laudo médico fun-damentado e circunstanciado expedido por médico que assiste o paciente, da impres-cindibilidade ou necessidade do medicamento, assim como da ineficácia, para o tratamento da moléstia, dos fármacos fornecidos pelo SUS; ii) incapacidade fi-nanceira de arcar com o custo do medicamento prescrito; iii) existência de re-gistro do medicamento na ANVISA, observados os usos autorizados pela agência. Mo-dula-se os efeitos do presente repetitivo de forma que os requisitos acima elen-cados sejam exigidos de forma cumulativa somente quanto aos processos distri-buídos a partir da data da publicação do acórdão embargado, ou seja, 4/5/2018." Logo, verifica-se que a hipótese em julgamento se enquadra à jurisprudência consoli-dada acima mencionada, ante o cumprimento cumulativo dos requisitos exigidos, em especial a apresentação de laudo médico - vide fls. 23 - e a evidente situação de hipos-suficiência da autora, devidamente comprovada nos autos. Importa destacar que os argumentos no sentido de existência de outros tratamentos para a enfermidade da autora não merecem ser acolhida. Importa dizer que se deve privilegiar laudo do médico que acompanha o paciente, eis que é este o profissional que conhece melhor o seu quadro clínico. Ora, a medida sequer constitui-se irreversível - salvo para a autora, ora recorrida, dado o óbvio risco à sua vida, decorrente de eventual demora. Assim, VOTO pelo CONHECIMENTO do recurso interposto e seu DESPROVIMEN-TO, para manter a sentença e julgar procedente o pedido autoral de fornecimento dos medicamentos pleiteados, mantendo-se os demais termos da sentença. Sem custas ante a isenção legal. Condenado o recorrente ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do art. 85 , § 8º do CPC , que fixo no valor de R$500,00. Rio de Janeiro, 13 de julho de 2020. Carla Faria Bouzo Juíza Relatora