STJ - RECURSO ORDINARIO EM HABEAS CORPUS: RHC XXXXX DF XXXX/XXXXX-2
PENAL E PROCESSO PENAL. RECURSO EM HABEAS CORPUS. 1. INTERPOSIÇÃO DE DOIS RECURSOS. PRINCÍPIO DA UNIRRECORRIBILIDADE. 2. RECURSO INTERPOSTO PELA OAB/DF. INTERVENÇÃO DE TERCEIRO EM HABEAS CORPUS. NÃO CABIMENTO. 3. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. MEDIDA EXCEPCIONAL. 4. "OPERAÇÃO TRICKSTER". ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. ESTELIONATO CONTRA O DF. PERMISSIONÁRIOS DE TRANSPORTE PÚBLICO COLETIVO. ALEGADA NÃO PARTICIPAÇÃO. MATÉRIA QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. 5. RECORRENTE QUE TRANSFERIU SUAS LINHAS EM 2011. ESQUEMA CRIMINOSO PRATICADO ENTRE 2014 E 2018. PARTICULARIDADE DO CASO CONCRETO. 6. TRANSFERÊNCIA QUE NÃO OBSERVOU REGRAS DO DIREITO ADMINISTRATIVO. NOME DO RECORRENTE QUE PERMANECEU FORMALMENTE. LIAME COM AS CONDUTAS DELITIVAS. AUSÊNCIA DE DESCRIÇÃO. MERA VINCULAÇÃO FORMAL. INSUFICIÊNCIA. 7. PARTICIPAÇÃO NA COOPERATIVA. ASSINATURA DE TERCEIRA PESSOA. 8. RECURSO DA OAB/DF NÃO CONHECIDO. RECURSO DA DEFESA PROVIDO PARA TRANCAR A AÇÃO PENAL POR INÉPCIA. 1. "Conforme jurisprudência pacífica, é vedada a interposição simultânea de dois recursos contra o mesmo ato judicial, ante o princípio da unirrecorribilidade e a ocorrência da preclusão consumativa". ( EDcl no AgRg no RE nos EDcl no AgRg no AREsp XXXXX/SP , Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, CORTE ESPECIAL, julgado em 22/06/2021, DJe 25/06/2021). 2. Ademais, registro que, em regra, se conhece do primeiro recurso interposto, haja vista a preclusão consumativa. Nada obstante, observo que o primeiro recurso foi interposto pela OAB/DF, na qualidade de terceiro interessado. Contudo, é firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que não se admite a intervenção de terceiro no habeas corpus. 3. O trancamento da ação penal, assim como do inquérito policial, se trata de medida excepcional, admitida apenas quando ficar demonstrada, de forma inequívoca e sem necessidade de incursão no acervo probatório, a atipicidade da conduta, a inépcia da denúncia, a absoluta falta de provas da materialidade do crime e de indícios de autoria, ou a existência de causa extintiva da punibilidade. 4. "As condições para o exercício da ação têm natureza processual e não dizem respeito ao seu mérito. Na oportunidade do recebimento da denúncia, realiza-se análise hipotética sobre os fatos narrados, a partir da prova da existência do crime e de indícios que sinalizem, de modo suficiente, ter sido o réu o autor da infração penal. Tudo isso sem incursão vertical sobre os elementos de informação disponíveis, porquanto a cognição é sumária e limitada". (HC XXXXX/RJ, Rel. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 17/08/2021, DJe 02/09/2021) 5. Referida conclusão não tem o condão de autorizar o início de ações penais desprovidas de justa causa ou sem a individualização da conduta atribuída a cada réu. Nessa linha de intelecção, diante da situação peculiar do recorrente, que não era mais o permissionário das linhas investigadas desde 2011, mesmo que a transferência tenha se dado em afronta às normas que regem o direito administrativo, caberia ao órgão acusador demonstrar que recorrente permaneceu atuando de forma efetiva, em especial no período em que os fatos ocorreram, entre 2014 e 2018. 6. Os fatos envolvem o recorrente porquanto é seu nome que consta como permissionário das linhas 0.119, 119.1, 119.2, 119.5, 119.6, 119.7 e 119.8, justamente por não ter sido observado o regramento de direito administrativo para realizar eventual transferência destas. No entanto, a denúncia não narra, nem mesmo indiciariamente, de que forma o recorrente atuou na prática criminosa, não descrevendo um mínimo liame entre ele e o corréu Ronaldo Alves da Cunha, que não seja a própria transferência informal das linhas. Contudo, o processo penal não se satisfaz com a mera vinculação formal do sujeito, sendo indispensável que se demonstre sua efetiva participação. - Nesse sentido, recorde-se que o recorrente "sub-rogou os direitos de exploração da permissão pública no ano de 2011, ou seja, três anos antes do suposto fato típico", não possuindo, em princípio, "vínculo ou poder de ingerência sobre a permissão". A sub-rogação se deu em favor do corréu Ronaldo Alves da Cunha, sendo "irrevogável, irretratável, isenta de prestação de contas, podendo ainda ceder, vender, doar, transferir a quem quiser e inclusive em nome próprio, o que era inclusive de conhecimento da SEMOB/DF e do extinto DFTrans". - Na esfera cível, a própria Tomada de Contas Especial foi redirecionada para Ronaldo Alves da Cunha e o Distrito Federal reconhece a venda e pede a extinção, em relação ao ora paciente, por ilegitimidade. 7. Por fim, e não menos importante, no que concerne à informação de que o recorrente efetivamente fazia parte da cooperativa, participando, dessa forma, da associação criminosa, tem-se que a defesa demonstrou que a assinatura que consta da ata e do estatuto da cooperativa é de uma terceira pessoa (e-STJ fl. 5.941). - Com efeito, informação da representante da Cooperativa, com base nessa assinatura, que não corresponde à pessoa do paciente, não constitui indício para a instauração da ação penal. Contra fato documentalmente conferido, não é possível ficção. 8. Recurso interposto pela OAB/DF não conhecido. Recurso da defesa provido para determinar o trancamento da ação penal apenas com relação a DENIS JONES DOS SANTOS BASTOS SIRAGUSA, por inépcia da denúncia, sem prejuízo da apresentação de nova inicial acusatória.