Divisão de competências entre STF e STJ faz sentido?
A existência de dois tribunais de cúpula, um dedicado à interpretação da Constituição, e, outro, da lei federal, tem razão de ser?
Na década de 60 do século passado, passava o Supremo Tribunal Federal por grandes dificuldades, decorrentes do elevado número de processos que tramitavam, naquele tribunal. O problema tornou-se crônico, passando a ser conhecido como a crise do Supremo.
Várias medidas foram tomadas com o intuito de resolver a crise. Impedimentos e óbices legais e regimentais foram criados, para dificultar a subida de recursos ao Supremo Tribunal (a expressão jurisprudência defensiva, à época, ainda não era utilizada). Foi nesse contexto, com a Emenda Constitucional 7/1977, que surgiu a arguição de relevância.
Mas ela não resolveu o problema. Tornava-se necessário, então, procurar outra alternativa. José Afonso da Silva defendia, na doutrina, a criação de um novo tribunal, que retiraria a competência do STF para julgar pelo menos 75% dos feitos. Essa tese foi ganhando adeptos, na doutrina e entre ministros do Supremo Tribunal Federal (escrevi a respeito desse movimento no livro Prequestionamento e repercussão geral e outras questões relativas aos recursos especial e extraordinário, 6.ed., Ed. Revista dos Tribunais, 2012).
Com a Constituição Federal de 1988, a ideia foi finalmente adotada. Criou-se o Superior Tribunal de Justiça, que, com o recurso especial, passaria a decidir questões atinentes à inteligência da lei federal (Constituição Federal, artigo 105, inciso III). O Supremo Tribunal Federal continuaria a julgar o recurso extraordinário, mas tal recurso, doravante, se restringiria a questões constitucionais (artigo 102, caput e inciso III, da Constituição Federal).
Essa divisão padece de um grave problema, que, com o passar do tempo, tornou-se cada vez mais evidente: em boa parte dos casos, é muito difícil eu diria, até, que é impossível dizer que a questão de direito é constitucional ou federal.
É certo que, em muitas situações, a questão se resolve, em termos aparentemente definitivos, a partir de apenas um dispositivo da Constituição ou de uma lei federal. Parece claro, por exemplo, que a questão relativa à tempestividade da apelação é resolvida apenas com base em um dispositivo de lei federal 1.
Mas não é de questões como essa que desejo tratar, aqui. Refiro-me ao crescente número de situações em que, no dia a dia, não conseguimos discernir se o tema é de direito constitucional ou federal.
Penso em algo que não chega a ser uma tese, mas considero uma hipótese a ser considerada: demoramos alguns anos para despertar, realmente, para o real alcance da Constituição Federal de 1988. Parece que mesmo a jurisprudência dos tribunais superiores levou tempo para compreender o sentido e a amplitude de disposições constitucionais consideradas, hoje, algumas das mais importantes.
Pode-se citar, como exemplo disso, o que sucedeu com o disposto no artigo 1º, inciso III da Constituição, que estabelece como um dos fundamentos do Estado brasileiro a dignidade da pessoa humana. De acordo com informações colhidas no site do STF, a primeira decisão que faz referência ao tema em sua ementa é d...
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