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5 de Maio de 2024

Dona de cadela condenada por maus-tratos e abandono

Publicado por Diego Schmitz
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Os Desembargadores da 4ª Câmara Criminal, por maioria, condenaram a dona de uma cachorra a 3 meses de detenção, em regime aberto, por não cuidar do animal que se recuperava de uma cirurgia. Ela poderá prestar serviços à comunidade.

Caso

A ré é acusada de maus-tratos contra o animal, por abandoná-la em via pública, estando em péssimas condições de saúde. Atropelada, teve os membros fraturados e passou por cirurgia na área de medicina veterinária da Secretaria Especial dos Direitos dos Animais (SEDA). A recomendação era de que após a internação e a alta, deveria retornar para revisão.

No dia marcado, a responsável pela cadela não a levou para a consulta. A médica ligou para a ré e ela informou que não havia necessidade de retorno porque o animal estava sendo atendido por um veterinário particular. Pouco mais de um mês após a internação, a cachorra foi encontrada na rua, em situação de abandono e más condições de saúde. Inclusive, com o mesmo curativo do dia em que teve alta da internação. Houve outra ligação para a responsável e ela disse que o animal estava muito bem. Quando a médica avisou que a cadela estava com ela, na clínica, com uma grave infecção, a ré desligou o telefone.

A dona da cachorra foi absolvida em primeira instância. O Ministério Público recorreu da decisão ao Tribunal de Justiça.

Acórdão

Em seu voto, o Desembargador Rogério Gesta Leal, relator do Acórdão, afirmou haver provas suficientes sobre a materialidade do delito.

Ele detalhou que a situação só foi descoberta porque a SEDA recebeu a solicitação para verificar um animal encontrado em situação de abandono portando coleira de identificação da SEDA.

O magistrado reproduziu os depoimentos de testemunhas e uma delas, a gestora da unidade de medicina veterinária, afirmou que a ré chegou a assinar um termo se comprometendo a dar continuidade ao tratamento e retornar no dia agendado.

Por fim, a dona do animal foi condenada a 3 meses de detenção em regime aberto. A pena foi substituída por prestação de serviços à comunidade.

Participaram da votação os Desembargadores Newton Brasil de Leão e Aristides Pedroso de Albuquerque Neto.

Proc. nº 70078185261

Fonte: TJRS

Confira a ementa do julgado:

Ementa: APELAÇÃO. CRIME AMBIENTAL. MAUS-TRATOS. ART. 32, CAPUT, DA LEI Nº 9.605/98. MATERIALIDADE E AUTORIA DELITIVA DEVIDAMENTE COMPROVADAS. PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE SUBSTITUÍDA POR UMA PENA RESTRITIVA DE DIREITOS. I - O entendimento sedimentado pelo Superior Tribunal deJustiça é no sentido de que tal prova pode ser suprida por outros elementos de convicção, tais como prova testemunhal, documental, desde que declinadas as justificativas robustas que ensejaram a condenação do acusado, com fundamento no contexto probatório existente nos autos. No presente feito, o relatório da AMV/SEMA e o laudo médico pericial indicam que o animal apresentava transfix no MAD (membro inferior direito) e MPD (membro posterior direito) com curativo antigo, odor fétido, local de inserção dos transfix contaminado, apresentando secreção purulenta e edema nos membros afetados, caracterizando intensa infecção bacteriana. A soma destes elementos, por certo, comprova a existência da materialidade delitiva. II - A prova coligida confirma que o animal realmente passou por procedimento cirúrgico e 43 (quarenta e três) dias depois de sua alta foi encontrado vagando pelas ruas com transfix acoplado em seus membros anterior e posterior direito, em péssimas condições de saúde, tomado por necrose e apresentando intensa infecção bacteriana. Tal circunstância, sem sobra de dúvidas, decorreu da omissão da ré em tomar os cuidados necessários para o tratamento do animal, que apresentava o mesmo curativo desde sua alta, obrigações essas que ela própria se comprometeu, conforme fazem prova os termos de recebimento e de responsabilidade de fls. 22/23, firmados pela acusada. Além disso, de acordo com o relato da testemunha M. M. S. G., gestora da unidade de Medicina Veterinária onde o animal foi atendido, depois de encontrá-lo nas condições acima descritas, foi realizado contato telefônico com a ré e questionado o quadro clínico do animal. Em resposta, a ré afirmou que a canina estava muito bem, no entanto, ao ser informada que o animal estava sob a posse da unidade de Medicina Veterinária, prontamente desligou o telefone. Em face do conjunto de fatores mencionados, inexiste dúvida quanto ao dolo da conduta, razão pela qual se impõe a condenação da ré como incursa nas sanções do art. 32, caput, da Lei nº 9.605/98. III - Pena privativa de liberdade fixada no mínimo legal, substituída por pena restritiva de direitos consistente em prestação de serviço comunitário, observadas as peculiaridades do art. , da Lei nº 9.605/98. APELO MINISTERIAL PROVIDO. POR MAIORIA. (Apelação Crime Nº 70078185261, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rogerio Gesta Leal, Julgado em 11/10/2018).

Comentários:

Atualmente o crime de maus-tratos é previsto no Art. 32, caput, da Lei nº 9.605/98, o qual prevê pena de detenção, de três meses a um ano, e multa, para quem “Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos”. Infelizmente o tipo penal em discussão é crime de menor potencial ofensivo, possuindo pena muito branda em relação ao bem jurídico que deveria ser tutelado que visa a proteção animal. Por tratar-se de crime de menor potencial a pena facilmente pode ser substituída por restritiva de direitos, como ocorreu no caso apreciado pelo Tribunal Gaúcho, o que, na prática, não tem o condão de inibir que condutas como deste tipo se repitam, trazendo ares de impunidade aos infratores e não atingindo um caráter punitivo-educativo adequado. Certamente a punição prevista na Lei nº 9.605/98 não se adequada a realidade atual, onde o animal doméstico – e até mesmo exótico – é tratado muitas vezes com status de membro da família (o que, por óbvio, não era a visão que tinha a autora dos fatos condenada no julgado), gerando grande comoção e indignação popular quando se deparam com notícias do tipo. Há inclusive inúmeros projetos de Lei na Câmara dos Deputados sobre o tema justamente para aumentar as penas contra a pratica de atos abusivos e maus-tratos contra animais e o meio ambiente, a exemplo do Projeto de Lei 10827/2018, PL 8521/2017 E PL 2004/2011 . Não obstante essa lacuna legislativa, um meio alternativo criado por alguns municípios para tentar inibir essa prática, além da própria conscientização da sociedade para denunciar esses crimes, é a aplicação de multas administrativas aos infratores, a exemplo do que foi colocado pela Lei Municipal nº 9.605/98 (Campinas-SP), de autoria do vereador Olimpio Oliveira, que estabelece penalidades administrativas para quem praticar ato de abuso, maus-tratos, abandonar, ferir ou mutilar animais, e dá outras providências, a qual impõe multas pesadas aos infratores que podem chegar a quatro mil reais. Se a aplicação de sanções penais, por si só, não é suficiente para coibir estes atos de violência contra os animais, o infrator certamente – ou ao mesmo deveria – se sentir desestimulado a novas práticas quando tiver seu patrimônio atingido por severas multas administrativas.

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