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29 de Abril de 2024

Empresa terá que indenizar família de motorista de caminhão que morreu em acidente

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O motorista de caminhão está sujeito a um grande risco de se acidentar no exercício da profissão, pois, diariamente, enfrenta o perigoso e complicado trânsito nas rodovias brasileiras, além do estado precário das nossas pistas, podendo perder sua vida por um simples descuido. Atentos a essa situação, os magistrados trabalhistas têm aplicado, nesses casos, a teoria do risco profissional, que leva à responsabilização objetiva do empregador (artigo 927, parágrafo único, do Código Civil). É que essa atividade, por sua própria natureza, expõe o trabalhador ao perigo, tornando o empregador responsável por reparar os prejuízos decorrentes do acidente de trabalho, independentemente da comprovação de culpa.

Foi justamente esse o fundamento adotado pela 2ª Turma do TRT/MG, ao julgar favoravelmente o recurso apresentado pelos filhos de um motorista de caminhão que morreu num acidente enquanto trabalhava. Acompanhando o voto do relator, desembargador Sebastião Geraldo de Oliveira, a Turma entendeu que a atividade profissional desempenhada pelo trabalhador o colocava em situação de risco acentuado. Por isso, reconheceu a responsabilidade objetiva do empregador que, assim, deve reparar os prejuízos decorrentes do acidente, independentemente da comprovação de culpa. A sentença foi modificada para garantir aos herdeiros o direito ao recebimento de indenizações por danos morais e materiais.

No caso, o trabalhador estava dirigindo em uma rodovia estadual, transportando cargas para a sua empregadora, uma empresa de comércio de bebidas, quando sofreu o acidente de trabalho fatal. Ele cochilou ao volante e o caminhão que conduzia atravessou a contramão, quebrou a mureta de proteção de uma ponte e caiu próximo ao leito de um córrego. O juiz de Primeiro Grau indeferiu o pedido de indenização por danos morais e materiais, por entender que a empresa não contribuiu direta ou indiretamente para o acidente. Mas o relator deu ao caso uma solução diferente.

Inicialmente, o desembargador afastou as afirmações dos filhos do trabalhador de que ele cumpria jornada exaustiva e estava prestando horas extras no momento do acidente. Isso porque o acidente ocorreu às 03h15 e a jornada contratual do trabalhador, prevista para o horário noturno, era de 22h às 05h. Entretanto, o julgador chamou a atenção para o fato de que a função de motorista de carga, desempenhada pelo falecido, o deixava exposto a um perigo maior de sofrer acidentes automobilísticos. É, portanto, uma atividade de risco acentuado, pois esses profissionais enfrentam diariamente condições adversas ao lidar com o arriscado e complicado trânsito nas rodovias brasileiras, em precário estado de conversação. Sendo assim, para o julgador, deve incidir aí a teoria do risco da atividade, com a responsabilidade objetiva da empresa, ou seja, ela está obrigada a reparar os danos decorrentes do acidente de trabalho que matou o trabalhador, independentemente da sua culpa no acontecimento.

Conforme explicou o relator, nos termos do parágrafo único do art. 927 do Código Civil, não depende de culpa a obrigação de reparar o dano quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano (no caso, a empresa) gerar, por sua própria natureza, riscos para os direitos do empregado, ou seja, quando se criam condições inseguras para o trabalhador, como no caso. Nesse quadro, a responsabilidade da empresa pelos danos decorrentes do acidente decorre, pura e simplesmente, do exercício da atividade de risco (sendo que "atividade" indica a prestação de serviço conduzida pelo empregador), tendo ela contribuído ou não, com qualquer ação ou omissão, para a ocorrência do acidente.

"Quando o empregador decide explorar uma atividade econômica, ele assume os riscos (art. da CLT). O empregado prejudicado em razão da prestação dos serviços não pode ficar desamparado. As disposições legais que, em inúmeras hipóteses, determinam a incidência da responsabilidade de natureza objetiva, visam a realizar a solidariedade social, por meio da ampla proteção aos lesados. Embora os danos (injustos) sejam causados por atos lícitos, o legislador quis fossem indenizados, ampliando intencionalmente a proteção em favor da vítima", destacou o relator.

Ele ressaltou, ainda, que a responsabilidade objetiva prevista no parágrafo único do artigo 927 do Código Civil tem sido repetidamente aplicada nas ações envolvendo acidentes do trabalho. O entendimento é de que o dispositivo não se opõe ao artigo , XXVIII, da Constituição da República, que prevê como direito dos trabalhadores a indenização por acidente de trabalho, a cargo do empregador, mas quando ele incorrer em dolo ou culpa. É que o caput da regra constitucional garante "a inclusão de outros direitos que visem à melhoria da condição social dos trabalhadores", além daqueles estabelecidos nos seus incisos, e interpretação da norma deve levar em conta todo o seu conjunto.

Além disso, frisou o relator, grande parte da jurisprudência do TST é no sentido de enquadrar a categoria profissional do motorista de caminhão como atividade de risco. Para reforçar sua posição, o relator, citou, ainda, o Enunciado 37, adotado na IV Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal, em outubro de 2006: "Responsabilidade civil objetiva no acidente do trabalho. Atividade de risco. Aplica-se o art. 927, parágrafo único, do Código Civil nos acidentes do trabalho". E, na mesma direção, o Enunciado 38 aprovado na 1ª Jornada de Direito Civil, promovida pela mesma entidade, em 2002: "Art. 927: A responsabilidade fundada no risco da atividade, como prevista na segunda parte do parágrafo único do art. 927 do novo Código Civil, configura-se quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano causar a pessoa determinada um ônus maior do que os demais membros da coletividade".

Condenação

Por essas razões, o desembargador reconheceu que a empresa está obrigada a indenizar os prejuízos causados aos reclamantes em decorrência da morte do pai deles. Mas, observou que o trabalhador também teve culpa no acidente, ao "dormir no volante". "Espera-se que todo motorista se prepare adequadamente para as viagens, evitando dirigir com"débitos de sono", pois a falta de sono afeta o tempo de reação do motorista e sua capacidade de concentração, o que, certamente, não era desconhecido pela vítima, na sua função de motorista de caminhão", frisou.

Dessa forma, em razão da culpa concorrente do falecido, o relator aplicou ao caso o artigo 945 do Código Civil, que não exclui a responsabilidade civil do empregador, mas determina a fixação de valor da indenização na proporção da culpa dos envolvidos, levando à distribuição proporcional dos prejuízos, arbitrada pelo relator, ao caso, como sendo de 50% (cinquenta por cento) para cada uma das partes. Considerando que os filhos do trabalhador falecido tiveram prejuízo ao serem privados da renda proporcionada pelo trabalho do pai, o desembargador reconheceu a eles o direito ao recebimento da indenização por danos materiais, na forma de pensionamento mensal, independentemente de a mãe deles já receber a pensão previdenciária por morte. Foi deferida também uma indenização por dano moral, no valor de R$15.000,00 para cada um dos filhos do trabalhador, atingidos que foram pela irreparável perda prematura do pai.




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