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3 de Maio de 2024

Não cabe ao juiz "legislar" e comparar a injúria racial ao racismo

Publicado por Consultor Jurídico
há 8 anos
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Recentemente, a revista eletrônica Consultor Jurídico protagonizou um belo debate acerca dos contornos dogmáticos e semânticos dos crimes de injúria racial e os resultantes de racismo. O debate teve como ponto de partida uma notícia[1] veiculada na própria ConJur, na qual foi divulgado que a 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça havia restabelecido a condenação do jornalista Paulo Henrique Amorim a um ano e oito meses de reclusão, por ofensas, de cunho racial, praticadas contra o também jornalista Heraldo Pereira. A referida corte entendeu pela aplicação da regra de imprescritibilidade (artigo , XLII, CRFB/88) ao crime de injúria racial (Artigo 140, § 3º, do CP), sendo este o fundamento para a manutenção da condenação do referido jornalista.

Com propriedade, o professor doutor Lenio Luiz Streck criticou[2] o entendimento do STJ, aduzindo que o tribunal fez uso de interpretação extensiva e analogia in malam partem. Cremos, aliás, que este argumento motivou a manifestação do também professor doutor Guilherme de Souza Nucci[3], que, por sua vez, defende a posição adotada pelo STJ, exclamando: “Somente quem nunca sofreu racismo, acha isso injúria racial”.

Sendo assim, instigados pelo debate e tocados com as recentes injúrias raciais sofridas pela atriz Taís Araújo[4] e também por um dos jogadores do São Paulo Futebol Clube, Michel Bastos[5], resolvemos expor nossa respeitosa colaboração, na tentativa de um melhor entendimento acerca da matéria.

Delimitando a questão: injúria racial e racismo
Superada a breve exposição da divergência, entramos no ponto central da presente reflexão: Pode a injúria racial ser comparada à prática de racismo? A fim de elucidar a questão, faz-se necessário pontuarmos algumas peculiaridades a respeito dos delitos em tela.

Pois bem.

Tipificada no artigo 140, § 3º[6], a injúria racial[7] (preconceituosa / qualificada) prevê pena de reclusão de um a três anos e multa. No que concerne ao preceito secundário, Bitencourt entende que a pena em abstrato do crime de injúria preconceituosa é desproporcional, eis que a injúria racial, possui o mesmo quantum condenatório que o homicídio culposo, que também prevê pena de detenção de um a três anos. Percebe-se que violações à honra receberam maior reprovabilidade do que violações à vida. Aliás, o ilustre doutrinador entende que “a própria proteção jurídica é preconceituosa”.[8] Ante sua posição topográfica no Código Penal, o bem juridicamente protegido é a honra (subjetiva), sendo que a utilização de elementos de etnia, raça, cor, religião, origem, condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência são determinantes à sua configuração.

Ainda sob o respaldo das lições de Bitencourt: “De acordo com a intenção da lei nova, chamar alguém de ‘negro’, ‘preto’, ‘pretão’, ‘turco’, ‘africano’, ‘judeu’, ‘baiano’, ‘japa’ etc., desde que com vontade de ofender-lhes a honra subjetiva relacionada a cor, religião, raça ou etnia, sujeita o autor a pena mínima de um ano de reclusão (...)”.9 A propósito, é preciso destacar que o legislador, inicialmente, deu-lhe o tratamento de ação penal privada. Sendo assim, uma vez se tratando de violação à honra subjetiva, a opção legislativa pela ação penal privada se revelou a mais acertada.

Contudo, após a edição da lei 12.033/09, a ação penal passou a ser pública e condicionada à representação. Acreditamos que a opção legislativa pela nova espécie de ação penal tenha levado em consideração a pena em abstrato, pois, conforme acima apontamos, é mais severa que as penas previstas para as hipóteses de homicídio culposo, o que seria incompatível com ações penais de natureza privada. No entanto, a publicidade da ação penal nos crimes que violam a honra também se mostra incongruente à sua própria natureza (subjetiva), pois não há como se aferir, objetivamente, a violação experimentada pelo ofendido.

Delimitado pela Lei 7.716/89, a prática de racismo ainda é objeto de muitos equívocos conceituais. Conforme leciona Andreucci, racismo, preconceito racial e discriminação racial, apesar de intimamente ligados, não são sinônimos. Racismo, segundo o autor, é próprio da história humana, podendo ser classificado como um fenômeno cultural.[10] Em termos mais precisos, o racismo é fonte de segregação e hostilidade à determinada categoria de pessoas, fomentando desigualdade e intolerância....

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