APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES DE ESTELIONATO POR DUAS VEZES EM CONCURSO MATERIAL. SENTENÇA CONDENATÓRIA. RECURSO DA DEFESA. PACOTE ANTICRIME. REPRESENTAÇÃO EFETIVADA. PLEITO ABSOLUTÓRIO. NÃO ACOLHIMENTO. ATIPICIDADE DA CONDUTA AFASTADA. DOLO CONFIGURADO. AUTORIA E MATERIALIDADE DEVIDAMENTE DEMONSTRADAS EM RELAÇÃO A AMBOS OS DELITOS. DOSIMETRIA. PEDIDO DE AFASTAMENTO DA VALORAÇÃO NEGATIVA DOS ANTECEDENTES. ACOLHIMENTO. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. PRETENSÃO DE RECONHECIMENTO DA CONTINUIDADE DELITIVA. VIABILIDADE. PEDIDO DE FIXAÇÃO DE REGIME MENOS GRAVOSO PARA CUMPRIMENTO DA PENA E DE SUBSTITUIÇAO DA PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE POR PENAS RESTRITIVAS DE DIREITOS. IMPOSSIBILIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. A Lei nº 13.964 /2019 acrescentou o § 5º ao artigo 171 do Código Penal , estabelecendo que o crime de estelionato deve ser processado mediante ação penal pública condicionada à representação. 2. Nas ações penais de estelionato em curso, deve ser considerada sanada a condição de procedibilidade prevista no artigo 171 , § 5º , do Código Penal , nos casos em que a vítima tenha manifestado o desejo inequívoco de apurar o fato, independentemente de formalidade específica. 3. Para a configuração do crime de estelionato, é exigível que o agente empregue qualquer meio fraudulento, induzindo ou mantendo alguém em erro e obtendo, assim, uma vantagem ilícita para si ou para outrem, com a consequente lesão patrimonial da vítima. 4. Na espécie, não há que se falar em mero ilícito civil, porquanto se extrai do farto conjunto probatório dos autos que a intenção da apelante, ab initio, era de obtenção de vantagem indevida. Isso porque, com o dolo de obter vantagem econômica em prejuízo das vítimas, mesmo ciente de que as pretensões das vítimas não seriam concretizadas, induziu-as em erro prometendo vantagens. 5. Condenações definitivas por crimes praticados após o crime em julgamento não servem para configuração de maus antecedentes. 6. A ?relação afetiva? é um elemento que traduz maior gravidade ao crime, uma vez que traz maior vulnerabilidade à vítima, fazendo com que ela seja mais facilmente ludibriada. 7. Conforme a teoria objetivo-subjetiva, adotada pela jurisprudência majoritária, para o reconhecimento da continuidade delitiva, exige-se a presença cumulativa dos requisitos objetivos (crimes de mesma espécie, praticados nas mesmas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes) e subjetivo (unidade de desígnios). 8. Na espécie, os requisitos estão demonstrados, uma vez que o modus operandi dos crimes os vinculam entre si e foi semelhante em ambos os casos - a apelante, por intermédio das redes sociais, captou as vítimas e as ludibriou, passando-se por advogada e filha de empresário influente, inclusive entrelaçando ambas as vítimas na mesma narrativa fraudulenta quando as apresentou uma à outra -, tendo ainda os crimes sido praticados nas mesmas circunstâncias de tempo e de lugar. 9. Sendo a ré reincidente, não há como se fixar o regime aberto de cumprimento de pena. 10. A reincidência da acusada inviabiliza os benefícios da substituição da pena privativa de liberdade por penas restritivas de direitos (artigo 44 do Código Penal ) e da suspensão condicional da pena (artigo 77 do Código Penal ). 11. Recurso conhecido e parcialmente provido para, mantida a condenação da acusada nas sanções do artigo 171 , caput, por duas vezes, do Código Penal (crimes de estelionato), afastar a avaliação desfavorável da circunstância judicial dos antecedentes criminais, diminuir a pena-base em relação a cada um dos crimes e reconhecer a continuidade delitiva entre os crimes, reduzindo-lhe as penas de 02 (dois) anos e 09 (nove) meses de reclusão, em regime inicial semiaberto, e 27 (vinte e sete) dias-multa, para 01 (um) ano, 07 (sete) meses e 01 (um) dia de reclusão, mantido o regime inicial semiaberto para o cumprimento da pena, e 14 (quatorze) dias-multa, calculados à razão mínima.