RECURSO ORDINÁRIO DA EMPRESA SUSCITANTE. DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.467 /2017 . 1. MOVIMENTO PAREDISTA DEFLAGRADO EM FACE DO NÃO PAGAMENTO DOS SALÁRIOS. DIREITO FUNDAMENTAL COLETIVO INSCRITO NO ART. 9º DA CF . ARTS. 3º E 4º DA LEI 7.783 /89. INCIDÊNCIA DA EXCEÇÃO DO CONTRATO NÃO CUMPRIDO. Embora se reconheça que o direito de greve se submete às condições estabelecidas na Lei 7.789 /89, em especial nos seus arts. 3º e 4º , torna-se indubitável, em casos concretos - revestidos de peculiaridades que demonstrem o justo exercício, pelos trabalhadores, da prerrogativa de pressionaram a classe patronal para obtenção de melhores condições de trabalho -, que não se pode interpretar a Lei com rigor exagerado, compreendendo um preceito legal de forma isolada, sem integrá-lo ao sistema jurídico. A regulamentação do instituto da greve não pode traduzir um estreitamento do direito de deflagração do movimento, sobretudo porque a Constituição Federal - que implementou o mais relevante avanço democrático no Direito Coletivo brasileiro -, em seu artigo 9º , caput , conferiu larga amplitude a esse direito. Nesse sentido, a jurisprudência desta Corte tem o entendimento de que, em situações especiais, quando a greve é motivada pelo descumprimento patronal de obrigações contratuais e legais importantes (não pagamento ou atraso reiterado dos salários dos servidores; más condições ambientais de trabalho, com risco à higidez das pessoas envolvidas; dispensa em massa de servidores, sem prévia negociação coletiva com o respectivo sindicato, etc.), é possível relativizar a necessidade de cumprimento das formalidades legais para a sua deflagração, com base na diretriz jurídica da exceção do contrato não cumprido. A propósito, a própria Lei de Greve incorpora essa exceção, ao tipificar como excludente de abusividade da greve realizada em período de vigência de diploma coletivo negociado os casos em que se configura o descumprimento patronal de cláusula convencional (art. 14, parágrafo único, inciso I) e em que ocorrer uma alteração significativa das condições pactuadas (art. 14, parágrafo único, inciso II). No caso concreto , embora não tenham sido cumpridos os requisitos legais, a deflagração espontânea da greve, sem aprovação em assembleia ou aviso prévio à parte adversa, mostrou-se justificável, diante da conduta reprovável da Empresa, que não pagou pontualmente os salários e benefícios aos trabalhadores. Desnecessário, pois, o cumprimento das formalidades legais, não havendo falar em abusividade do movimento paredista conduzido pelo Sindicato Obreiro, com apoio na jurisprudência desta SDC/TST. Recurso ordinário desprovido. 2. DESCONTO DOS DIAS NÃO TRABALHADOS EM VIRTUDE DA GREVE. A regra geral no Direito brasileiro, segundo a jurisprudência dominante, é tratar a duração do movimento paredista como suspensão do contrato de trabalho (art. 7º , Lei 7.783 /89). Isso significa que os dias não trabalhados, em princípio, não são pagos, não se computando para esses específicos fins contratuais o mesmo período. Entretanto, caso se trate de greve em função do não cumprimento de cláusulas convencionais e/ou contratuais relevantes, a par de regras legais pela empresa (não pagamento ou atrasos reiterados de salários, más condições ambientais, com risco à higidez dos obreiros, etc.), em que se pode falar na aplicação da regra contida na exceção do contrato não cumprido, a greve deixa de produzir o efeito da mera suspensão. Do mesmo modo, quando o direito constitucional de greve é exercido para tentar regulamentar a dispensa massiva. Nesses dois grandes casos, seria cabível se enquadrar como mera interrupção o período de duração do movimento paredista, descabendo o desconto salarial. Verifica-se que a greve em análise se amolda à hipótese de interrupção do contrato de trabalho, pois decorreu do não pagamento dos salários e benefícios pelo Empregador, sendo devida a remuneração dos dias não trabalhados - conforme decisão proferida pelo Tribunal de origem. Recurso ordinário desprovido. 3. GARANTIA DE SALÁRIOS E CONSECTÁRIOS (ESTABILIDADE PROVISÓRIA). O instituto da greve, ao ser incorporado pela ordem jurídica como um direito, encontra nela suas próprias potencialidades e limitações. No Direito Brasileiro, uma dessas potencialidades é o direito dos grevistas de proteção contra a dispensa por parte do trabalhador. Isso ocorre porque, nessa situação, o contrato de trabalho se encontra suspenso, juridicamente, conforme o art. 7º da Lei 7.783 /89 - sem prejuízo de, em situações excepcionais de descumprimento de cláusulas contratuais e regras legais relevantes, o movimento paredista se enquadrar como simples interrupção da prestação de serviços. Observe-se que o empregador, durante o período de afastamento, não pode dispensar o trabalhador nem mesmo alegar justa causa pela adesão à greve (Súmula 316 /STF). Seguindo essa linha de entendimento, esta Seção Especializada, nos termos do PN XXXXX/SDC/TST, firmou entendimento de que, nas greves não abusivas, os trabalhadores têm direito à garantia de salários e consectários, desde a data do julgamento do dissídio coletivo até 90 dias após a publicação do acórdão , limitado o período total a 120 dias. No caso concreto , o Tribunal Regional deferiu aos empregados da Empresa Suscitante a "garantia de pagamento de salários e consectários, por 90 (noventa) dias, desde a data de retorno ao trabalho", utilizando-se, portanto, de critério dissonante daquele utilizado pela jurisprudência desta Corte, além de menos favorável à categoria profissional. Com efeito, o PN nº 82 da SDC/TST prevê a contagem do prazo de 90 dias a partir da publicação do acórdão, enquanto o acórdão regional considerou a data de retorno ao trabalho (que, no caso, ocorreu antes do julgamento do dissídio coletivo). Nada obstante, mantém-se a decisão recorrida, considerando que apenas a Empresa recorreu e que é vedada a reforma da decisão para piorar a situação do recorrente (princípio da non reformatio in pejus). Recurso ordinário desprovido .