Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA, LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA ssa-turmasrecursais@tjba.jus.br - Tel.: 71 3372-7460 Ação: Procedimento do Juizado Especial Cível Recurso nº XXXXX-34.2021.8.05.0001 Processo nº XXXXX-34.2021.8.05.0001 Recorrente (s): ALINE FERNANDES NUNES DA SILVA Recorrido (s): BANCO BRADESCO S A EMENTA RECURSO INOMINADO. DIREITO DO CONSUMIDOR. AÇÃO INDENIZATÓRIA POR DANOS MORAL E MATERIAL. TRANSFERÊNCIA REALIZADA PARA CONTA DE TERCEIRO COM NUMERAÇÃO SIMILAR A CONTA DO SEU GENITOR, REAL DESTINATÁRIO DA QUANTIA. RECLAMAÇÃO IMEDIATA JUNTO AO BANCO. AUSÊNCIA DE SOLUÇÃO ADMINISTRATIVA. SENTENÇA DE IMPROCEDÊNCIA. REFORMA. PROVA INEQUÍVOCA DA VEROSSIMILHANÇA DA ALEGAÇÃO, ART. 373 , I DO CPC . TRANSFERÊNCIA REALIZADA EQUIVOCADAMENTE EM CONTA BANCÁRIA DIVERSA DA PRETENDIDA. VÍCIO DE VONTADE. ERRO. ART. 138 DO CC DEMONSTRADO. REFORMA DA SENTENÇA PARA JULGAR PROCEDENTE A AÇÃO PARA ANULAR A TRANSFERÊNCIA, DETERMINANDO QUE A RÉ REALIZE A RESTITUIÇÃO DA QUANTIA. INOCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS NO CASO CONCRETO. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. Dispensado o relatório nos termos do artigo 46 da Lei n.º 9.099 /951. Circunscrevendo a lide e a discussão recursal para efeito de registro, saliento que a Recorrente ALINE FERNANDES NUNES DA SILVA pretende a reforma da sentença lançada nos autos que JULGOU IMPROCEDENTE os pedidos formulados na queixa, declarando extinta a presente ação com resolução de mérito, conforme art. 487 , I do NCPC . Presentes as condições de admissibilidade do recurso, conheço-o, apresentando voto com a fundamentação aqui expressa, o qual submeto aos demais membros desta Egrégia Turma. VOTO Ab initio, afasto a preliminar suscitada em sede de contrarrazões, de ausência de dialeticidade recursal, se verifica que as razões da peça recursal são suficientes para atacar minimamente os fundamentos da sentença. O recurso deixa claro a irresignação da parte recorrente em relação ao teor da sentença vergastada, sendo formulados os devidos pedidos de reforma da decisão ao final da peça recursal. Portanto, não há que se falar em ausência de pedido de nova decisão. Assim, rejeito a preliminar. No mérito, alega a parte autora que é titular da Conta Poupança nº 5501-8 da Agência 3651 no Banco Bradesco, tendo realizado uma transferência bancária em favor do seu pai, o Sr. Luis Alberto Nunes da Silva que também possui conta no Banco Réu, Agência 2425 e Conta Corrente XXXXX-5, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Ocorre que, por erro de digitação, enviou o crédito para Conta Corrente nº 5988-9 do Banco Bradesco, tendo como titular um senhor de nome Osvaldo Alves de Souza. Ao procurar o Banco com o intuito de corrigir a falha, a Requerida negou o estorno da quantia, alegando culpa exclusiva da consumidora. Em sede recursal, ratifica as alegações da exordial e requer a modificação da sentença proferida para que a Ré seja condenada a restituir a quantia e ao pagamento pelos danos morais sofridos (evento 64). A parte demandada, em apertada síntese, afirma que o processamento da transferência bancária se deu nos exatos termos em que solicitado pela parte Recorrente, cabendo a esta a correta indicação do número da conta do beneficiário e a conferência dos demais dados da transação bancária. Que cumpriu com seu dever de prestar o serviço com a qualidade e segurança esperadas, no entanto a falta de atenção da parte recorrente gerou a não conclusão da operação como esperado. aduz que a responsabilidade não pode ser atribuída à instituição financeira, que não dispunha de controle da manifestação de vontade da parte recorrente, revelando a hipótese, na verdade, de culpa exclusiva do consumidor, consoante excludente contida na norma do artigo 14 , § 3º , II , do Código de Defesa do Consumidor . Apresentada contrarrazões pugna pela manutenção da sentença de improcedência (evento 75). Pois bem. Cinge-se a controvérsia em analisar se procede ou não o pedido de estorno da transferência bancária realizado equivocadamente em conta bancária de terceiro. Entendo que o recurso merece provimento, para reformar a sentença de piso, pelas razões que elenco a seguir. Da análise dos autos, bem como da instrução realizada, restou demonstrado a ocorrência de vício de vontade da autora, na modalidade erro, nos termos do art. 138 do CC . Afinal, na realização da transferência, a correntista realizou a transação trocando apenas o dígito final do número da conta corrente do seu genitor, situação que conduziu ao crédito indevido em conta bancária diversa da pretendida. De imediato, a autora aduz que entrou em contato com o banco para um possível estorno do valor depositado, todavia, nada foi realizado. Deste modo, não há dúvida de que para que qualquer negócio jurídico produza efeitos, faz-se necessária a vontade consciente das partes, sob pena de invalidação, em razão de vícios de consentimento. O erro, instituto previsto no art. 138 do CC , manifesta-se mediante compreensão errônea da realidade, ou seja, a incorreta interpretação de um fato: Art. 138. São anuláveis os negócios jurídicos, quando as declarações de vontade emanarem de erro substancial que poderia ser percebido por pessoa de diligência normal, em face das circunstâncias do negócio. Outrossim, deve-se observar a vedação ao enriquecimento sem causa estabelecida no ordenamento jurídico vigente, em respeito ao princípio da boa-fé e função social dos contratos privados. Vejamos: DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO DE IN REM VERSO. DEPÓSITO EQUIVOCADO EM CONTA CORRENTE. RECUSA DE RESTITUIÇÃO PELO CORRENTISTA. ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA CONFIGURADO. CONDENAÇÃO MANTIDA. I. Toda e qualquer migração patrimonial, para se revelar legítima aos olhos do Direito, deve ter o respaldo da ordem jurídica. II. Pleito de devolução de depósito equivocado feito pelo banco na conta de correntista pode ter por fundamento jurídico o instituto do enriquecimento sem causa. III. Quem recebe o que não lhe é devido incrementa o seu patrimônio sem lastro jurídico algum e por isso fica obrigado a restituir. IV. Recurso conhecido e desprovido. (TJ-DF XXXXX DF XXXXX-92.2014.8.07.0018 , Relator: JAMES EDUARDO OLIVEIRA, Data de Julgamento: 28/06/2017, 4ª TURMA CÍVEL, Data de Publicação: Publicado no DJE : 07/07/2017 . Pág.: 341/350) Assim, entendo que é devida a respectiva restituição do valor a correntista, ora Recorrente, eis que imediatamente tomou providências para sanar o equívoco cometido, conduto, tal solução só poderia ser efetivada pelo banco acionado. Nesse sentido trago julgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: Ação de indenização por danos materiais ¿ Autor aduz que fez um depósito bancário equivocado, tendo digitado o número da agência de forma errada e, apesar de efetuar os procedimentos determinados pelo requerido, não foi ressarcido ¿ Negligência do requerido - Autor que tomou as providências necessárias à solução do problema - Falha na prestação de serviço - Sentença que julgou procedente o pedido para condenar o requerido à restituir o montante de R$ 1.986,00 ¿ Manutenção da sentença pelos próprios fundamentos. (TJ-SP - RI: XXXXX20178260362 SP XXXXX-22.2017.8.26.0362 , Relator: Rafael Pavan de Moraes Filgueira, Data de Julgamento: 02/03/2018, Turma Recursal Cível e Criminal, Data de Publicação: 06/03/2018) No que tange o dano moral, entendo que estes não ocorreram na situação em análise, eis que o fato narrado não decorreu da má prestação de serviço pelo banco demandado. Assim, não vislumbro ocorrência de danos à esfera íntima da parte Autora, não havendo prova de danos à sua personalidade, sendo descabida indenização por danos morais, portanto, inocorrentes ao caso. Na mesma direção, a título de exemplo: EMENTA RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. BANCÁRIO. ALEGAÇÃO AUTORAL DE TER EFETUADO DEPÓSITO EM CONTA BANCÁRIA ERRADA, TENDO O BANCO RECUSADO A EFETUAR O ESTORNO. DEFESA PAUTADA NA CULPA EXCLUSIVA DA AUTORA, NEGANDO DEVER DE INDENIZAR. SENTENÇA QUE CONDENOU O RÉU A RESTITUIR O VALOR EQUIVOCADAMENTE DEPOSITADO. RECURSO DA AUTORA, OBJETIVANDO INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DANO MORAL NÃO CONFIGURADO. SENTENÇA MANTIDA PELOS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJ-BA - RI: XXXXX20208050248 , Relator: ALBENIO LIMA DA SILVA HONORIO, PRIMEIRA TURMA RECURSAL, Data de Publicação: 14/10/2021) RECURSO INOMINADO. AÇÃO DE RESTITUIÇÃO DE VALOR. DIREITO BANCÁRIO. TRANSFERÊNCIA DE VALORES PARA CONTA CORRENTE ERRADA. ENGANO COMUNICADO À INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. BANCO QUE SE APROPRIA DO VALOR TENDO EM VISTA DE SALDO DEVEDOR DA EMPRESA DESTINATÁRIA DO DEPÓSITO. PEDIDO DE ESTORNO NÃO ATENDIDO. FALHA NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS. DANOS MATERIAS COMPROVADOS. RESTITUIÇÃO DEVIDA. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. Recurso conhecido e desprovido. (TJPR - 5ª Turma Recursal dos Juizados Especiais - XXXXX-22.2020.8.16.0035 - São José dos Pinhais - Rel.: JUÍZA DE DIREITO DA TURMA RECURSAL DOS JUÍZADOS ESPECIAIS FERNANDA DE QUADROS JORGENSEN GERONASSO - J. 21.03.2022) Assim sendo, ante o exposto, voto no sentido de CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto pela parte Recorrente para, reformar a sentença hostilizada, julgando parcialmente procedentes os pedidos autorais para ANULAR a transferência bancária realizada para conta de terceiro, por erro da autora, nos termos do art. 138 do CC , determinando que o Banco demandado proceda ao ressarcimento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), atualizados a partir do fato (súmula 43 , STJ) e juros desde a citação (art. 405 , CC ). Sem custas ou honorários, diante da ausência de recorrente vencido. Salvador, Sala das Sessões, data registrada no sistema. ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA Juíza Relatora ACÓRDÃO Realizado o Julgamento pela 5ª TURMA RECURSAL CÍVEL, CONSUMIDOR, TRÂNSITO E CRIMINAL, decidiu-se, à unanimidade de votos,por CONHECER e DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso interposto pela parte Recorrente para, reformar a sentença hostilizada, julgando parcialmente procedentes os pedidos autorais para ANULAR a transferência bancária realizada para conta de terceiro, por erro da autora, nos termos do art. 138 do CC , determinando que o Banco demandado proceda ao ressarcimento do valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), atualizados a partir do fato (súmula 43 , STJ) e juros desde a citação (art. 405 , CC ). Sem custas ou honorários, diante da ausência de recorrente vencido. Salvador, Sala das Sessões, data registrada no sistema. ELIENE SIMONE SILVA OLIVEIRA Juíza Relatora e Presidente Processo julgado com base no artigo nº 4º, do Ato Conjunto nº 08 de 26 de Abril de 2019 do TJBA, que dispõe sobre o julgamento de processos em ambiente virtual pelas Turmas Recursais do Sistema dos Juizados Especiais que utilizam o Sistema PROJUDI e/ou a decisão do acórdão faz parte de entendimento já consolidado por esta Colenda Turma Recursal e/ou o acórdão é favorável a quem requereu pedido de sustentação oral dentro do prazo legal, tendo este já findado, bem como do art. 15. do Regimento Interno das Turmas Recursais (resolução 02/2021 do TJBA), em seu inciso XII, estabelece a competência do Relator para julgar monocraticamente as matérias em que já estiver sedimentado entendimento pelo Colegiado ou já com uniformização de jurisprudência em consonância com o permissivo do art. 932 , CPC .