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30 de Abril de 2024

Apesar do período eleitoral, juiz decreta prisão de homem por violência doméstica

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“O cometimento de atos graves de violência doméstica não podem estar excetuados pela Lei Eleitoral, sob pena de criarmos – no período de eleição – um salvo conduto aos agressores”. Com esse entendimento, o Juiz de Direito Luciano Bertolazi Gauer decretou prisão preventiva de homem acusado de descumprimento de medidas protetivas e tentativa de feminicídio. O caso ocorreu no sábado, 27 de outubro, véspera do segundo turno das eleições, período em que o cumprimento de ordens de prisão é proibido por lei.

O artigo 236, do Código Eleitoral, somente autoriza prisão “em flagrante delito ou em virtude de sentença criminal condenatória por crime inafiançável, ou, ainda, por desrespeito a salvo-conduto”. O acusado – que já estava judicialmente proibido de se aproximar da vítima, invadiu a residência da mesma durante a madrugada e, munido de uma faca, desferiu golpes em direção ao pescoço de sua ex-companheira. A vítima conseguiu se defender, procurou atendimento médico e a autoridade policial. Com a decisão do juiz, o homem foi preso.

Sobre o tema o magistrado refletiu: “A vedação da Lei Eleitoral, consoante se extrai da própria legislação, objetiva – com a proibição da prisão preventiva, evitar arbitrariedades que pudessem comprometer a tranquilidade do pleito eleitoral. Todavia, o direito de sufrágio não se sobrepõe ao direito de incolumidade física e psíquica das pessoas de sorte que, sem maiores delongas em razão da ponderação relativa ao conflito aparente de normas constitucionais, em juízo de ponderação, tenho que o art. 20 da Lei nº 11.340/2006, o qual autoriza a prisão do agressor, por ser posterior à Constituição Federal e à própria Lei Eleitoral, prevalece sobre a vedação de prisão prevista na Lei Eleitoral. Desse modo, a prisão cautelar do requerido é imprescindível para assegurar a eficácia da medida protetiva deferida, garantir a ordem pública e para assegurar a adequada instrução processual”.

Direito à integridade física deve prevalecer

Para Luciano Bertolazi, “é preferível que se justifique a perda de um voto que se chore sobre um cadáver em pleno dia de votação”.

Ao Boletim IBDFAM, o magistrado afirmou que, desde a sua posse, adota a postura de decretar a prisão preventiva do agressor nos casos de violência doméstica em que a vítima apresenta laudo médico atestando as lesões corporais, e que ‘no período eleitoral não poderia ser diferente”.

Ele expõe: “Se pararmos para pensar, estaríamos admitindo um período de exceção à integridade física da mulher, com o que não se pode compactuar. Após muito refletir, sem olvidar que a decisão foi tomada em regime de plantão, sem efetuar qualquer tipo de controle de constitucionalidade, entendi que - em juízo de ponderação - deveria prevalecer o direito à integridade física, cuja incolumidade também se encontra garantida pela Constituição Federal. Sendo o direito de sufrágio um direito constitucional e a dignidade da pessoa humana um princípio da mesma Constituição, a vedação da prisão - anterior à Carta Política - para assegurar o direito de voto, não se sobrepõe à proteção assegurada na Lei Maria da Penha e posterior à Constituição, ou seja, a ela balizado, razão pela qual - nesse conflito aparente de normas infraconstitucionais em relação aos direitos constitucionalmente assegurados - o juízo de ponderação me fez decidir pela possibilidade da prisão. O julgamento pela justeza ou acerto da decisão cabe às instâncias superiores, caso provocadas”.

Avanço positivo

Para a vice-presidente da Comissão de Gênero e Violência Doméstica do Instituto Brasileiro de Direito de Família - IBDFAM, Ana Florinda Dantas, a decisão é um avanço “extremamente positivo” na proteção da mulher contra a violência doméstica. “Para bem compreender o progresso representado por esta decisão, é preciso entender que o artigo 236 do Código Eleitoral, que veda, com poucas exceções, a prisão ou detenção de eleitores desde 5 (cinco) dias antes e até 48 (quarenta e oito) horas depois do encerramento da eleição, tem por objetivo garantir o direito ao voto como exercício da cidadania, mas não pode se tornar obstáculo para que outros direitos constitucionalmente protegidos sejam preservados”, diz Ana Florinda.

Para ela, a lei eleitoral foi interpretada em harmonia com o artigo 42 da Lei 11.340, de 7 de agosto de 2006, que acresceu, no Código de Processo Penal, na parte que trata da prisão preventiva, o inciso IV ao artigo 313, admitindo a decretação da prisão preventiva nos crimes dolosos envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.

“Desse modo, tratando-se de violência doméstica, a prisão preventiva foi elevada à categoria de garantia de direitos fundamentais como a vida, a integridade física e a dignidade da pessoa, e como um instrumento processual apto a prevenir a escalada da violência que comprovadamente ocorre de maneira habitual quando não adequada e rigidamente contida”, comenta.

Ana Florinda defende, ainda, a possibilidade da prisão em período eleitoral também para devedores de alimentos. “A exemplo de outros especialistas, por motivos igualmente relevantes, como medida apta a proteger os direitos dos alimentandos, juridicamente presumidos hipossuficientes, que dependem da prestação alimentar para sua manutenção”, diz.

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