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29 de Abril de 2024

Ministra Nancy: "Por qualquer coisa estão pedindo dano moral"

Críticas ao comentário da Ministra.

Publicado por Patricia Teixeira
há 8 anos
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O tema que envolve a responsabilidade civil no tocante à reparação dos danos morais ainda é motivo de grande perplexidade. Muitos criticam o instituto do dano moral e sua atual banalização. Sabe-se que o instituto do dano moral está dentro da esfera da responsabilidade civil.

A responsabilidade civil está relacionada à noção de não prejudicar o outro. Nesse sentido Rui Stoco:

“A noção da responsabilidade pode ser haurida da própria origem da palavra, que vem do latim respondere, responder a alguma coisa, ou seja, a necessidade que existe de responsabilizar alguém pelos seus atos danosos. Essa imposição estabelecida pelo meio social regrado, através dos integrantes da sociedade humana, o dever de todos responderem por seus atos, traduz a própria noção de justiça existente no grupo social estratificado. Revela-se, pois, como algo inarredável da natureza humana.” (STOCO, 2007, p.114)

Apesar da doutrina vir discutindo desde então sua existência, ela de fato se efetivou apenas em 1966, quando o Supremo Tribunal Federal admitiu pela primeira vez sua reparação. Ainda assim a jurisprudência continuava hesitante até 1988, no qual, por força de texto constitucional expresso, consolidou-se incontestável a reparabilidade do dano moral no artigo incisos V e X da Constituição Federal.

Posteriormente com o novo Código Civil de 2002, seguindo o preceito assegurado pela lei maior, ratificou a responsabilidade civil subjetiva no caput e objetiva no parágrafo único do artigo 927. Previu também expressamente a reparação do dano exclusivamente moral no artigo 186.

Nos dias de hoje, o dano moral é rodeado de questões polêmicas a respeito do quantum indenizatório; sobre os critérios analisados para a fixação de um valor; a falta de uma conceituação sólida e precisa do que seria dano moral; o uso indevido e banalizado deste direito; a comparação entre o método indenizatório de outros países; a suposta morosidade do sistema judiciário consequente do aumento de ações por danos morais; o que é o dano moral e onde ele se encaixa; e muitas outras. (CLEBIS, 2015).

Para acirrar a questão, recentemente a ministra do STJ Nancy Andrighi se manifestou de forma contrária à aplicação do instituto:

"As pessoas por qualquer coisa estão pedindo dano moral. Por qualquer simples aborrecimento." A ministra Nancy Andrighi fez a crítica à indústria do dano moral ao julgar um processo na 3ª turma nesta manhã. (REsp 1.426.710)

"Dissabores, desconfortos e frustrações de expectativa fazem parte da vida moderna, em sociedades cada vez mais complexas e multifacetadas. Não se pode aceitar que qualquer estímulo que afete negativamente a vida ordinária configure dano moral."

No caso concreto, uma empresa de material de construção foi condenada por dano moral por aparecimento de manchas no piso cerâmico da consumidora. Embora tenha entendido que houve, sim, frustração da consumidora (com alterações na reforma que promovia), considerou que tais questões são materiais e não afetam o âmago do indivíduo.


Com a devida vênia, abro um parêntese para discordar da eminente ministra, eis que a sociedade mudou, briga mais por seus direitos e as empresas continuam prestando, muitas vezes, um péssimo serviço ou colocam produtos de baixíssima qualidade no mercado. Portanto, verdadeira banalização deste regimento se dá quando são fixados valores tão baixos aos sofrimentos e constrangimentos alheio, dando a entender que a aflição das vítimas tem menor importância para o judiciário se comparado a outros institutos, sendo que, a maior tutela da Constituição vigente é a preocupação com a pessoa e sua dignidade.

Essa busca pela reparação dos danos no Brasil reflete também na sociedade, eis que deveria melhorar a relação entre as empresas e os consumidores, aumentando a atenção e a qualidade em seus serviços ou produtos.

Portanto deixo aqui a minha discordância com relação ao pensamento da ministra e ao de todos que defendem a dita "indústria do dano moral". O que visualizo é: não será possível a aplicação plena e eficaz dos danos morais enquanto estiver enraizada na cabeça dos magistrados a ideia da existência de um “enriquecimento ilícito” limitando sua majoração.

Antes de ser banalizada pela sociedade, o dano extrapatrimonial está sendo banalizado pelo próprio judiciário, por seguir uma suposta verdade entrelaçada, premissa falaciosa de uma “indústria”, oriunda das cortes americanas, que em nada se parece no seu sistema judiciário com o brasileiro.

Portanto, defendo aqui a luta pelo reconhecimento dos danos morais de cada cidadão que se sentir lesado em seu âmago, afinal, a dor é individual e subjetiva, sendo assim, cada um sente a sua. Além disso, vislumbro ser perfeitamente normal uma sociedade que está em constante mudança e seus reflexos se desdobram para a esfera jurídica.

Considero assim, o comentário da ministra um verdadeiro retrocesso no reconhecimento dos direitos tão lutados para proteger os cidadãos, já que sem eles os mesmos restarão submissos ao animalesco caráter do capitalismo.

Sem mais...


Fontes:

http://www.migalhas.com.br/Pilulas/247928

Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: CLEBIS, Vitoria. O equívoco a respeito da indústria dos danos morais. Conteudo Jurídico, Brasilia-DF: 30 set. 2015. Disponivel em:. Acesso em: 26 out. 2016.

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