APELAÇÃO . MINISTÉRIO PÚBLICO QUE REQUER A CONDENAÇÃO DA APELANTE NAS PENAS DOS ARTIGOS 21 E 42 , I , DO DECRETO- LEI Nº 3688 / 1941 . DEFESA QUE POSTULA A ABSOLVIÇÃO DA ACUSADA DA IMPUTAÇÃO DO DELITO DE DESACATO. PREQUESTIONAMENTO DE DIVERSOS DISPOSITIVOS LEGAIS E CONSTITUCIONAIS. PARCIAL PROVIMENTO DOS APELOS. Da condenação : a materialidade e a autoria das infrações de desacato e perturbação do trabalho alheio restaram comprovadas na hipótese dos autos, sobretudo diante dos depoimentos prestado em Juízo, aos quais corroboram as demais provas do processo ¿ registro de ocorrência, termos de declaração, laudo de exame de local de constatação e relatório final de inquérito, que não deixam a menor dúvida acerca da procedência da condenação . Com o fim da instrução criminal, restou incontroverso que a apelante compareceu à Escola Municipal Hetelvina Carneiro no dia 18 de fevereiro de 2 0 19 , quando proferiu palavras de baixo calão contra a diretora do estabelecimento de ensino em pleno exercício da função e com o nítido propósito de desprestigiar a função pública da vítima, além de ter perturbado o trabalho de diversos funcionários durante a troca de turno. A grande confusão gerada pela gritaria da apelante durante a troca de turno dos funcionários configurou a contravenção prevista no artigo 42 , I, do Decreto- Lei nº 3.688 / 41 , cujo bem juridicamente tutelado é a paz pública , caracterizada, na hipótese dos autos, pela grande presença de funcionários que se encontravam na instituição de ensino no momento da prática da infração penal e que sofreram perturbação durante o exercício das suas atividades laborativas, tal como narrado pelo Ministério Público na denúncia. Logo, diante dos depoimentos prestados em Juízo, aliados às demais provas coligidas ao longo da instrução criminal, correto se mostra o juízo de reprovação, o que torna, pois, impossível a absolvição da apelante das penas das infrações penais previstas nos artigos 42 , I, do Decreto- Lei nº 3.688 / 41 , e 331 do Estatuto Repressivo. Da absolvição: em relação à imputação da contravenção das vias de fato, porém, razão não assiste ao Ministério Público. Não obstante a presença de indícios de que a acusada Dirce tenha desferido um tapa nas adolescentes Kaenny e Daiane , o decreto de condenação pressupõe um exame de cognição exauriente, com base em juízo de certeza, e não de probabilidade, como acontece na decisão de recebimento da denúncia, quando o Magistrado analisa um suporte probatório mínimo, apto a indicar a prova da materialidade e dos indícios de autoria. Os indícios apurados na fase pré-processual não se confirmaram em relação às contravenções penais previstas nos artigos 21 e 42 , I , do Decreto- Lei nº 3.688 / 41 . O depoimento da adolescente Kaenny se apresentou confuso e contraditório, sem o condão de fundamentar um juízo de certeza, pois primeiro alega que a apelante lhe acertou um tapa ¿devagar¿, mas depois afirma que ¿uma das duas tentou me dar um tapa, mas acho eu que foi a Letícia. Eu estava tentando tapar meu rosto, mas não sei a pessoa certa que deu o tapa. Eu tenho certeza de que levei tapa, acho que a dona Dirce estava em cima da diretora, foi tudo muito rápido. Não posso dizer que foi a dona Dirce quem me deu um tapa, eu não sei qual das duas foi, só sei que uma me deu um tapa. Foi a filha dela, porque a Letícia que estava mais perto de mim¿. A vítima Camila , a seu turno, não teve dúvidas em afirmar que a apelante não agrediu a integridade física de ninguém. A testemunha Luciana , por sua vez, asseverou que não se recorda se a apelante agrediu fisicamente alguém. A única pessoa que afirmou com segurança que a apelante a agrediu com um tapa foi a adolescente Daiane , cuja versão, porém, se apresenta isolada, e não se coaduna com os depoimentos das demais testemunhas, o que torna, pois, impossível a condenação da acusada Dirce nas penas da contravenção de vias de fato, em atenção ao princípio in dubio pro reo. Da dosimetria da sanção penal ¿ desacato: a pena definitiva permanece inalterada em 1 0 dias- multa , à razão unitária do menor valor legal, em prestígio à regra tantum devolutum quantum appellatum, uma vez que o Parquet não se insurgiu contra esse segmento da sentença ; perturbação do trabalho alheio: a pena-base é fixada em 15 dias de prisão simples, ante a ausência de circunstâncias judiciais desfavoráveis. Não há agravantes ou atenuantes a serem valoradas. À mingua de causas de aumento e diminuição, a pena intermediária torna-se definitiva. Do concurso material: levando-se em conta a pluralidade de condutas e diversidade de crimes , impõe-se a aplicação do sistema do cúmulo material na forma do artigo 69 do Código Penal , do que resulta a pena definitiva de 15 dias de prisão simples e pagamento de 1 0 dias- multa . Das penas restritivas de direitos : como não há óbice à concessão do benefício inserto no artigo 44 do Código Penal , a pena privativa de liberdade é substituída por uma restritiva de direitos , na modalidade de prestação pecuniária, ora fixada em 0 1 salário mínimo vigente ao tempo do pagamento, cuja destinação deve observar o disposto na Resolução CNJ nº 154 / 2 0 12 e Ato Executivo TJ nº 1453 / 14 . Na hipótese de descumprimento injustificado da restrição imposta, a pena deverá ser convertida em privativa de liberdade, em regime prisional aberto, a teor dos artigos 33 , §§ 2º e 3º, e 44 , § 4º, ambos do Código Penal . Da reparação de danos : a sentença merece reparo apenas para afastar a condenação a título de reparação de danos . Não obstante as disposições do artigo 387 , IV, do Código de Processo Penal , das quais se extrai a intenção do legislador ordinário de ampliar a tutela dos interesses da vítima no âmbito processual penal, a Lei nº 11.719 / 2 00 8 , responsável pela atual redação do dispositivo, deixou de regular o procedimento necessário a aferição, irrefutável, da natureza e da extensão do prejuízo suportado pela vítima, o que se mostraria imprescindível ao exercício do contraditório e da ampla defesa, corolários do devido processo legal. Ademais, a própria legitimidade do Parquet para requerer a reparação de danos civis é bastante questionada na doutrina. Com efeito, a apuração da natureza e da extensão dos prejuízos suportados pela vítima tornaria obrigatória, repita-se, a observância de um procedimento específico para tal fim, com produção de provas e abertura de vista às partes , em homenagem ao contraditório, o que, infelizmente, não foi previsto na Lei nº 11.719 / 2 00 8 . Decota-se a condenação ao pagamento de verba indenizatória. Do prequestionamento: afigura-se incabível o prequestionamento para fins de eventual interposição de recurso extraordinário ou especial, na medida em que não há nenhuma contrariedade ou negativa de vigência aos dispositivos apontados pelas partes , tampouco violação aos artigos 1 0 2 , III, e 105 , III , da Constituição da Republica . PARCIAL PROVIMENTO DO APELO DEFENSIVO para afastar a condenação ao pagamento de verba indenizatória. PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO MINISTERIAL, para condenar a acusada nas sanções do artigo 42 , I, do Decreto- Lei nº 3.688 / 41 , ao total de 15 dias de prisão simples, cuja pena é substituída por uma restritiva de direitos , na modalidade de prestação pecuniária, ora fixada em 0 1 salário mínimo vigente ao tempo do pagamento, cuja destinação deve observar o disposto na Resolução CNJ nº 154 / 2 0 12 e Ato Executivo TJ nº 1453 / 14 . Na hipótese de descumprimento injustificado da restrição imposta, a pena deverá ser convertida em privativa de liberdade, em regime prisional aberto, a teor dos artigos 33 , §§ 2º e 3º, e 44 , § 4º, ambos do Código Penal .