Página 2297 da Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte III do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 26 de Setembro de 2012

Em seu depoimento pessoal (fls. 159/160), a autora narrou, com riqueza de detalhes, a traição ocorrida na festa de formatura do requerido. Disse que, após este se ausentar por algumas vezes, surpreendeu-o, em local discreto, mas dentro do recinto da festa, ?abraçado e de rosto colado? com outra mulher, conhecida da autora. Na ocasião, o requerido disse que eram amigos e que estava tentando ajudar a referida mulher. Porém, impediu que a autora fosse até ela confirmar tal justificativa. A requerente afirmou, ainda, que a partir desse fato, passou a investigar a vida do requerido e, ao longo de quase um mês, descobriu várias outras relações extraconjugais com cerca de seis ou sete mulheres, mantidas durante a união com a autora. Pela coerência e pela riqueza de detalhes, o depoimento pessoal da autora merece credibilidade. Ademais, foi totalmente corroborado pelos depoimentos das testemunhas. Karen Danielle Secani da Cunha e Maycon Secani Cunha, primos da autora e que também estavam na festa de formatura do requerido, embora não tenham presenciado o ato de infidelidade, dele tomaram conhecimento logo em seguida. A testemunha Karen narrou que o requerido se manteve ausente durante parte da festa. Quando a autora saiu para procurá-lo, retornou chorando e dizendo que o havia flagrado abraçado e beijando outra moça. A depoente chegou a ver a referida mulher. Após o ocorrido, a requerente ficou muito abalada e teve de ser levada embora da festa (fls. 161/163). Maycon também soube, logo após o ocorrido, que a autora havia surpreendido o requerido beijando outra mulher (fls. 163/v). A testemunha Ana Carolina também soube dos fatos por intermédio da autora, a qual se mostrava ?desestruturada emocionalmente? (fls. 163/v). Percebe-se que a versão apresentada pelas testemunhas é absolutamente coerente com o relato da autora, o que confere verossimilhança às narrativas. Tamanho foi o abalo psicológico da requerente que, após o ocorrido, passou se submeter a tratamento psicoterápico, conforme se extrai da prova oral e documental. A negativa do requerido e a alegação de que se tratava de uma amiga, a quem ele oferecia ajuda por estar ?com o salto quebrado e embriagada?, não encontram amparo nas provas dos autos. Tampouco há prova de que a autora estava embriagada na festa e que tenha agredido fisicamente a mulher com quem o requerido foi flagrado em demonstrações evidentes de afeto. Em suma, nenhuma prova foi produzida em sentido contrário, ou que colocasse em dúvida a versão apresentada pela autora, com riqueza detalhes, repita-se, em seu depoimento pessoal. Nesses casos, que se caracterizam pela discrição e ausência de publicidade, há de se deferir credibilidade à versão apresentada pela requerente, única que presenciou o ato de adultério e cujo depoimento, corroborado pelos testemunhos, tem força probatória. E, nesse contexto, vale repetir, nenhuma contraprova foi produzida. Assim, é forçoso concluir que os fatos narrados na inicial estão devidamente comprovados e configuram ofensa ao dever de lealdade e respeito que caracterizam a união estável (art. 1.724 do Código Civil) e, portanto, conduta ilícita. O dano moral decorre do sofrimento exagerado imposto à autora. Não se pode duvidar que o fato em questão gerou enorme vexame, humilhação e representou duro golpe à autoestima da requerente, sobretudo porque praticado em ambiente familiar (festa de formatura do requerido), de confraternização, expondo a autora ao ridículo perante sua família, a família do requerido e outras pessoas que frequentavam a festa. A jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo é controvertida acerca da ocorrência de dano moral em hipóteses de adultério. Tem prevalecido o entendimento de que não é qualquer situação de adultério que causa o dano moral, mas sim casos excepcionais, que fogem a uma certa ?normalidade?, devido à intensidade com que atinge a honra subjetiva e objetiva da parte contrária. Nesse sentido, contrario sensu: ?UNIÃO ESTÁVEL. Quebra dos deveres de lealdade e respeito pela ré. Manutenção, em paralelo à união, de relacionamento com terceiro. Adultério que, por si só, não enseja dano moral. Ausente circunstância excepcional a autorizar a pretendida indenização. Sentença reformada. RECURSO PROVIDO? (TJSP - Apelação Cível nº 000XXXX-66.2009.8.26.0063 - 7ª Câmara de Direito Privado - Rel. Des. Elcio Trujillo -j. 23/2/11) (grifei). Na mesma linha, a confirmar o quanto exposto: ?O importante, para efeito de verificação do dano moral indenizável, não é o adultério em si mesmo, porque fato previsível e até comum na atualidade, cuja ocorrência, é bom destacar, não se dá apenas por deslealdade, mas também pelas circunstâncias que hoje aproximam as pessoas com afinidades comuns muito mais do que antes. O importante é saber se dele resultou para o outro uma situação vexatória ou excepcionalmente grande o suficiente para ultrapassar os limites do desgosto pessoal pela conduta do outro cônjuge ou companheiro.? (TJSP - Apelação Cível nº 361.324-4/7-00 - 4a Câmara de Direito Privado - Rel. Des. Maia da Cunha - j. 27.03.2008). É o caso dos autos, como visto, em que a autora foi exposta ao ridículo perante sua família e amigos, o que confere excepcional gravidade ao fato. Dentro desse contexto, e a chancelar o entendimento deste magistrado, merece transcrição parte da declaração de voto vencido proferida pelo Eminente Desembargador Ênio Santarelli Zuliani, nos autos da Apelação Cível nº 361.324-4/7, de São Paulo, cuja maestria, típica de Relator, dispensa maiores comentários: Para ARNOLDO WALD o adultério ?é na vida conjugal a maior das injúrias de um cônjuge em relação ao outro? [Do desquite, Editora Nacional de Direito, RJ, 1959, p. 114]. Quando há traição, quer pelo marido, quer pela esposa, emprega-se um componente físico [a cópula com outrem] para confirmação de ruptura total do dever de fidelidade. Segundo TITO FULGÊNCIO, não cabe diferenciar a dor masculina da feminina, ?tão viva é a ferida no coração da mulher quanto a do marido enganado pela esposa? [Do desquite, Saraiva, 1923, p. 31]. O adultério é uma infração que desonra os compromissos matrimoniais e constitui causa para a separação porque a coabitação passa ser insuportável [artigo 5º, caput, da Lei 6515/73 e artigo 1573, I, do CC, de 2002]. Os Juízes sabem que o adultério, mesmo reprovado pelo Direito e pela moral, continua sendo um acontecimento social que destrói os lares. (...) O recurso dos requeridos fica rejeitado, mantido o dever de indenizar, por ofensa aos predicados da honra da mulher ultrajada pela traição que fez ruir os alicerces de seu lar, perturbando a vida familiar [artigo 5o, V e X, da CF]. Reconhecendo o dever de indenizar, confira-se: ?INDENIZAÇÃO - NAMORADOS EM VIA DE CASAMENTO - VIRAGO QUE DESCOBRE A INFIDELIDADE DO VARÃO - NAMORO DESFEITO EM RAZÃO DESTA ATITUDE REPROVÁVEL - DANO MORAL CONFIGURADO - VALOR FIXADO CONSOANTE PRUDENTE ARBÍTRIO DO MAGISTRADO - CONSONÂNCIA COM O VULTO DOS INTERESSES EM CONFLITO - SUCUMBÊNCIA - VERBA HONORÁRIA ACIMA DO MÍNIMO LEGAL - DECISÃO MANTIDA - RECURSOS IMPROVIDOS? (TJSP - Apelação Cível nº 453.776-4/4-00 - 7ª Câmara ?B? de Direito Privado - Rel. Des. Antônio Marcelo Cunzolo Rimola - j. 15.10.2008) Assim, demonstrada a conduta ilícita e o dano moral, surge a responsabilidade civil. Na fixação da verba indenizatória, levo em consideração algumas peculiaridades do caso concreto. Primeiramente, a gravidade da conduta do requerido, que ganha relevo quando se tem em conta que praticada em total desprezo à presença da autora e seus familiares, ignorando os riscos de ser surpreendido. Com efeito, o requerido faltou com o respeito à autora, à família dela e à sua própria família, que estava na festa de sua formatura. Expôs a todos ao ridículo, de forma pública, ao protagonizar o episódio vexatório e lamentável em plena festa de formatura. Isso, sem dúvida, aumenta a reprovabilidade de sua conduta. Somado a isso, tem-se o fato de a autora ter descoberto outras traições, que, se não são causa de pedir nestes autos, obviamente confirmam a ideia de que o requerido descumpria continuamente o dever de lealdade no relacionamento e, por isso, merece reprimenda adequada com vistas a evitar novas práticas ilícitas e imorais. De outro lado, chama a atenção o fato de a autora ter permitido o retorno do réu ao lar conjugal e com ele convivido por mais vinte ou trinta dias. Não ficou clara a intenção da autora. Tampouco ficou claro se houve, ou não, reconciliação nesse período. De qualquer forma, é legítimo supor que essa postura da autora representou ato de tolerância que, se não afasta o dano moral, pelo menos teve o condão de minimizar suas consequências, levando-se em conta o que geralmente acontece. Em outras palavras, sem embargo do reconhecimento do dano moral, é certo que a autora conseguiu conviver com o requerido por quase um mês após a traição narrada na inicial, o que se pode traduzir em tolerância ao sofrimento que lhe foi impingido. Diante de tais balizas, e atento ao caráter compensatório e

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