Página 1563 da Judicial - 1ª Instância - Capital do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 18 de Agosto de 2014

pelo interessado. É direito das instituições, aliás, que se presta até mesmo para a finalidade que o autor tanto quer, em vão, ver indevidamente reconhecida em seu favor: serve para, aumentando a segurança das operações, e reduzindo a taxa de risco delas decorrente, possibilitar a redução dos custos operacionais das operações de crédito, barateando o juro praticado. Da pretendida manutenção na posse do bem No que se refere à pretendida “manutenção na posse” do bem cuja aquisição foi financiada pelo réu, mais sem razão se mostra o autor. Determinação daquele jaez atingiria em cheio o direito constitucional reconhecido a qualquer pessoa, jurídica ou física, de reclamar seus direitos e interesses perante o Poder Judiciário, já que se estaria impedindo ao réu, de antemão, buscar a tutela que entendesse de direito seu, calcado na legislação vigente. Por último, deixo consignado que a antecipação de tutela não tem como pressupostos, como parece entender o autor, a existência do fumus boni juris, e do periculum in mora, estes constituindo requisitos ensejadores da concessão liminar de medidas cautelares, que têm natureza e função diversas. Aqui seria possível discutir a verossimilhança das alegações, e a existência de risco de ocorrência de dano de difícil ou impossível reparação, estes sim os pressupostos legais para eventual antecipação de tutela, pressupostos estes que não se mostram presentes, na espécie dos autos. Da não-incidência do código do consumidor na espécie Não há na espécie, como busca sustentar inutilmente a parte autora, relação de consumo a ser considerada para a finalidade de regulação da questão posta nos autos pelas disposições do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº. 9.078/90). O financiamento foi concedido para a aquisição de veículo empregado pelo autor para o exercício de atividade remunerada no sistema de transportes coletivos da cidade, não sendo o negócio da compra financiada, portanto, efetuado pelo autor na condição de beneficiário final do bem. Isso significa que o negócio firmado pelas partes contratantes deve ser analisado e resolvido à luz das disposições do Código Civil Brasileiro sob cuja égide foi aperfeiçoado, e não sob os auspícios da legislação especial pretendida na inicial. Inaplicável no caso presente, portanto, o conjunto de normas contido na Lei Consumerista antes referida (Lei nº 9.078/90). Dessa forma, deve ser afastada desde logo a possibilidade de aplicação do princípio da inversão dos ônus da prova, pretendida pela parte autora, bem como das normas que, constantes daquela Legislação Especial de proteção do consumidor, pudessem dar substrato legal para a declaração de nulidade do contrato firmado, ou de parte de suas cláusulas. Da questão relativa aos contratos de adesão No que se refere à aventada “nulidade” do contrato porque “de adesão”, há que se diferenciar corretamente os conceitos de “contrato de adesão” e “contrato por adesão”, figuras que têm definições sabidamente diversas. No chamado “contrato de adesão”, também conhecido como “contrato de massa”, não há qualquer cerceamento da liberdade de contratar, podendo o interessado aderir aos termos do instrumento proposto, ou não, aceitando suas cláusulas em bloco de forma absolutamente válida. Não se interessando pelo aperfeiçoamento do negócio nas bases em que proposto no contrato ao qual deveria aderir, para a sua conclusão, pode simplesmente deixar de manifestar validamente sua vontade em relação ao proponente, e buscar melhores condições de ajuste com outra parte interessada. Em outras palavras, nada impede que, dada a existência de diversos agentes econômico-financeiros atuantes no segmento visado, busque o interessado contratar com o proponente que lhe apresente melhores condições de negociação para ele, relativamente ao bem ou serviço de seu interesse. Como exemplo dessa situação pode-se mencionar até mesmo o exemplo da própria parte autora nestes autos, que poderia, caso não se interessasse pelas condições do negócio que firmou na forma como oferecidas pelo réu, optar por contratar com outra instituição do mercado financeiro. Diversa é a situação no “contrato por adesão”, em que o interessado se vê diante da presença, no mercado, de reconhecido oligopólio ou mesmo monopólio na distribuição do bem jurídico por ele buscado através da contratação. Hipótese diversa é aquela que se vê no “contrato por adesão”, caso em que, se não suprimida a possibilidade de manifestação livre e soberana da vontade do contratante, esta sofre sensível limitação em conseqüência da reconhecida ocorrência de monopólio ou oligopólio no fornecimento dos bens e/ou serviços buscados pelo interessado. De regra tais contratos se identificam com aqueles firmados entre os consumidores de bens e serviços essenciais, muitas vezes comercializados e/ou prestados por empresas públicas, empresas mistas, paraestatais, concessionárias e permissionárias de serviços públicos, em que não se permite ao contratante, dada a ausência mesmo no mercado, de outro ou outros fornecedores do bem da vida procurado. Nessas hipóteses os exemplos correntes são, via de regra, os dos contratos de fornecimento dos serviços de distribuição de águas e esgotos, de eletricidade etc. Aqui não só a possibilidade de discussão acerca do conteúdo e qualidade das cláusulas que compõem o contrato não se mostra viável, no mais das vezes, como também não se abre ao interessado, de regra, a possibilidade de “livre escolha” da outra parte contratante. Como se pode bem constatar do acima exposto, são bastante diversas aquelas modalidades contratuais, não se podendo confundi-las entre si. Da mesma forma, também se há de reconhecer que no caso dos autos impossível o reconhecimento da existência de “contrato por adesão”, visível a hipótese de “contrato de adesão”. Da taxa de juro contratada e do limite constitucional do juro Nesse particular soa francamente inconsistente a argumentação da parte demandante, que pretende induzir à conclusão de que, ciente do valor do juro contratado, não teria aperfeiçoado o negócio. Como bem admite a inicial, a parte interessada carece de recursos técnicos para apuração da real expressão e influência da taxa de juros (que poderá estar declinada, no contrato, até sob sua forma “nominal” e sua expressão “efetiva”). Daí é forçoso concluir que o foco de interesse está voltado totalmente para o valor da prestação mensal ajustada para a amortização da dívida, e não no conceito e extensão do juro apontado. O propalado “limite constitucional dos juros”, tão decantado pela parte autora na longa inicial, demonstra a verdadeira aventura jurídica que constitui a presente demanda. Na verdade, a disposição constitucional antes existente, e sobre a qual se costumava apoiar pedidos semelhantes, foi objeto de alteração redacional pela Emenda Constitucional nos. 40/2003, que alterou a redação da “cabeça” do artigo 192 da Constituição da República de 5 de outubro de 1988, e suprimiu todos os incisos e parágrafos constantes de sua redação original, não mais fazendo qualquer menção à pretendida “limitação” da taxa de juros. É a seguinte a novel redação da disposição constitucional: Art. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, em todas as partes que o compõem, abrangendo as cooperativas de crédito, será regulado por leis complementares que disporão, inclusive, sobre a participação do capital estrangeiro nas instituições que o integram. Como se pode facilmente constatar, o pedido formulado pela parte, no que se refere a este tópico, não encontra qualquer respaldo, uma vez que há muito não mais se pode falar em “limite constitucional de juros”. Há que se acrescentar, outrossim, o fato de que a questão já está de muito espancada, constituindo objeto da Súmula Vinculante nº 7 do E. Supremo Tribunal Federal (STF). Tampouco poderá dar respaldo à pretensão do autor a alegada infringência das disposições da Lei de Crimes contra a Economia Popular (Lei nº. 1.521/51), como pretende. Aquela legislação não tem aplicação na hipótese, como também não o têm as regras estatuídas na chamada Lei da Usura (Decreto nº. 22.626/33), que tem como pressupostos os mesmos princípios, reconhecido pelo Pretório Excelso que às instituições financeiras que têm suas atividades reguladas pela Lei nº. 4.595/64 não se aplicam as limitações impostas por aqueles regramentos (Súmula nº 596, do Supremo Tribunal Federal). Da mesma forma, também não é capaz de gerar o reconhecimento da pretensão da parte a disposição inserta no artigo 173, § 4º, da Constituição da República, que por seu próprio texto deixa para a legislação infraconstitucional a tarefa de implementar medidas no sentido da repressão ao mencionado “abuso do poder econômico”. De qualquer forma, a disposição, por sua clara redação, deixa patente que seus dizeres se dirigem à questão da regulação das atividades dos mercados produtores, e não do consumidor, fato que também afasta a possibilidade de sua admissão como elemento abonador das teses da parte interessada.

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