Página 673 da Judicial - 2ª Instância do Diário de Justiça do Estado de São Paulo (DJSP) de 27 de Fevereiro de 2015

de realização prática de tais direitos. No mesmo diapasão: Porém é preciso fazer uma ressalva no sentido de que mesmo com a alocação dos recursos no atendimento do mínimo existencial persista a carência orçamentária para atender a todas as demandas. Nesse caso, a escassez não seria fruto da escolha de atividades não prioritárias, mas sim da real insuficiência orçamentária. Em situações limítrofes como essa, não há como o Poder Judiciário imiscuir-se nos planos governamentais, pois estes, dentro do que é possível, estão de acordo com a Constituição, não havendo omissão injustificável. (Recurso Especial nº 1.068.731, Relator Ministro Herman Benjamin). Não se argumente, ademais, com violação aos princípios da impessoalidade e da moralidade, mesmo porque a “Constituição Federal dispõe sobre ser a saúde direito de todos, com quebra desses princípios caso não fornecidos os medicamentos ao impetrante, sem que isso se constitua em privilégio, pois há determinação na Constituição Federal para o atendimento integral da saúde do cidadão, sem prejuízo à coletividade” (Apelação nº 0015023-03.2012, Relator Desembargador Borelli Thomaz, j. 19 de março de 2014). Também não cabe argumentar com princípios concernentes ao orçamento (CF, artigos 165 e 167), visto que este permite contingenciamento de verbas para atendimento de necessidades supervenientes e de atendimento inadiável. Nesse sentido: I. Mandado de Segurança. Fornecimento de medicamentos. Cidadã enferma portadora de ‘Depressão’. Hipossuficiência financeira. Direito à vida e a uma existência digna. Dever constitucional do Estado. Exegese do artigo ‘caput’ e 196 da Constituição Federal. II Ausência de violação da independência dos Poderes. A previsão orçamentária é feita para as despesas ordinárias. A Administração Pública deve suportar determinados gastos não previstos especificamente, mas que constituem sua responsabilidade. É assim, por exemplo, com relação às calamidades públicas derivadas de força maior. Neste caso, a vida e a saúde humana devem ter especial proteção do ente público, até mesmo porque este é o seu interesse público primário, o bem social. III Sentença concessiva da ordem. Recurso improvido (Apelação Cível nº 755.881.5/9-00, Relator Desembargador Guerrieri Rezende, j. 12.05.08). No mesmo sentido, confiram-se: Agravo de Instrumento nº 80.727-5/0-00, Relator Desembargador Peiretti de Godoy, j. 06/08/2002; Apelação Cível nº 319.023-5/4-00, Relator Desembargador José Habice, j. 11/08/2003. Com efeito, a magnitude do direito protegido repele a oposição de argumentos meramente técnicos ou burocráticos. À vista desses, deve prevalecer o disposto no art. 196 da Constituição Federal. Confira-se: Observa-se, pois, que o Sistema Único de Saúde pressupõe a integralidade da assistência, de forma individual ou coletiva, para atender cada caso em todos os níveis de complexidade, razão pela qual, comprovada a necessidade do medicamento para a garantia da vida da paciente, deverá ser ele fornecido. Tem, portanto, a recorrente, visivelmente, direito líquido e certo ao recebimento do remédio. As normas que promovem a garantia de direitos fundamentais não podem ser consideradas como programáticas, porque ‘possuem um conteúdo que pode ser definido na própria tradição da civilização ocidental-cristã’ e ‘a sua regulamentação legislativa, quando houver, nada acrescentará de essencial: apenas pode ser útil (ou, porventura, necessária) pela certeza e segurança que criar quanto às condições de exercício dos direitos ou quanto à delimitação frente a outros direitos’ (cf. José Luiz Bolzan, “Constituição ou Barbárie: perspectivas constitucionais”, in “A Constituição Concretizada construindo pontes com o público e o privado”, Ingo Wolfgang Sarlet (org), Livraria do Advogado Editora, Porto Alegre, 2000, p. 34). Dessarte, defronte de um direito fundamental, cai por terra qualquer outra justificativa de natureza técnica ou burocrática do Poder Público, uma vez que, segundo os ensinamentos de Ives Gandra da Silva Martins, ‘o ser humano é a única razão do Estado. O Estado está conformado para servi-lo, como instrumento por ele criado com tal finalidade. Nenhuma construção artificial, todavia, pode prevalecer sobre os seus inalienáveis direitos e liberdades, posto que o Estado é um meio de realização do ser humano e não um fim em si mesmo” (in Caderno de Direito Natural Lei Positiva e Lei Natural”, n. 1, 1ª edição, Centro de Estudos Jurídicos do Pará, 1985, p. 27).Deveras, como já foi ressaltado pelo ilustre Ministro José Delgado, ao julgar caso semelhante ao dos autos, em que se discutia o fornecimento de medicamentos a portadores do vírus HIV, o Resp nº 325.337/RJ, DJU de 3.9.2001, ‘a busca pela entrega da prestação jurisdicional deve ser prestigiada pelo magistrado, de modo que o cidadão tenha, cada vez mais facilitada, com a contribuição do Poder Judiciário, a sua atuação em sociedade, quer nas relações jurídicas de direito privado, quer nas de direito público.’ (Recurso Especial nº 212.346-RJ, Relator Ministro FRANCIULLI NETTO, j. 09.10.2001). É de se consignar, mesmo, que “a cogitação de óbices orçamentários revela-se impertinente, pois se trata de política pública implantada e em funcionamento, pressupondo-se que esteja contemplada nas leis orçamentárias” (TJSP, Apelação nº 0005646-53.2011, Relator Desembargador Cláudio Augusto Pedrassi, j. 15/01/2013). Não há falar, igualmente, em violação ao princípio da isonomia. A garantia do direito à saúde pressupõe atendimento integral, no qual se compreende a análise individualizada da necessidade. Nesse sentido julgou, à unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em Agravo Regimental na Suspensão de Liminar nº 47, de Pernambuco, relatoria do Ministro Gilmar Mendes. Nessa perspectiva, a responsabilidade pelo fornecimento de medicamentos tem sido aceita até mesmo quando não estão disponíveis em rede pública de saúde (medicamentos não padronizados). Nesse sentido vem decidindo esta Corte (Agravo de Instrumento nº 80.727-5/0-00, Relator Desembargador Peiretti de Godoy, j. 6.8.2002; Apelação Cível nº 319.023-5/4-00, Relator Desembargador José Habice, j. 11/08/2003, Rel. Des. JOSÉ HABICE). Nesse sentido, confira-se também: A Constituição do Estado de São Paulo também dispõe, em seu artigo 219, parágrafo único, que os Poderes Públicos, estadual e municipal, garantirão o direito à saúde mediante “políticas sociais, econômicas e ambientais que visem o bem estar físico, mental e social do indivíduo e da coletividade e à redução do risco de doenças e outros agravos” (item 1); “acesso universal e igualitário às ações e ao serviço de saúde em todos os níveis” (item 2); “atendimento integral do indivíduo, abrangendo a promoção, preservação e recuperação de sua saúde” (item 4). No mesmo sentido a Lei n. 8.080/90 e a LC n. 791/95. Esses objetivos não podem ser preteridos em razão de não existir dotação orçamentária para seu alcance, visto que a garantia do direito à saúde pressupõe análise individualizada e pormenorizada da necessidade em questão, não havendo, portanto, infração ao princípio da isonomia ou da reserva do possível. Nesse sentido julgou, à unanimidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em Agravo Regimental na Suspensão de Liminar nº 47, de Pernambuco, relatoria do Ministro Gilmar Mendes: “em relação aos direitos sociais, é preciso levar em consideração que a prestação devida pelo Estado varia de acordo com a necessidade específica de cada cidadão. Assim, enquanto o Estado tem que dispor de um determinado valor para arcar com o aparato capaz de garantir a liberdade dos cidadãos universalmente, no caso de um direito social como a saúde, por outro lado, deve dispor de valores variáveis em função das necessidades individuais de cada cidadão. Gastar mais recursos com uns do que com outros envolve, portanto, a adoção de critérios distributivos para esses recursos” (Apelação/Reexame Necessário nº 0008818-24.2013, Relator Desembargador Marcelo Semer, j. 27/01/2014). Por isso, a alegação de que o fornecimento do medicamento, no caso, não é possível em razão de cuidar-se de droga não prevista no tratamento oficial, não justifica a atitude resistente da apelante, tampouco a alegação de não ser possível o fornecimento do medicamento em detrimento de outros pacientes. Ora, o Estado o dever de garantir a saúde do cidadão, fornecendo o medicamento a quem dele necessite, ainda que este não se encontre previsto no tratamento oficial, eis que o atendimento é universal e igualitário, entendendo-se o princípio da igualdade como o tratamento igual para os iguais. Se, como no caso, o paciente necessite, para a sua cura, de um determinado tipo de medicamento que é o mais adequado à sua situação individual, não lhe sendo possível dar-se o tratamento geral, deve ser tratado dentro desta condição, cabendo o discrimen, posto não se encontrar ele em situação de igualdade com os demais necessitados e portadores da mesma doença (Apelação nº 990.10.070232-7, Relatora Desembargadora Silvia Meirelles, 14/04/20100). No caso

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