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26 de Abril de 2024
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    Os pobres devem pagar as contas dos ricos?

    Publicado por Espaço Vital
    há 15 anos

    Por Eduardo Appio ,

    juiz federal (PR) e pós-doutor em Direito Constitucional

    A alocação de recursos escassos sempre foi uma atribuição dos governos eleitos. O direito à saúde, como qualquer outro direito social, deve ser suportado pelo orçamento público. Os custos têm aumentado, junto com a expectativa de vida e o acesso à informação sobre novos medicamentos e exames de alta tecnologia.

    O s custos são suportados pelos tributos cobrados de todos. Todos pagam, mas apenas alguns poucos pacientes têm acesso efetivo a medicamentos de última geração na rede pública de saúde, muitos dos quais amparados em liminares judiciais. Não são pessoas de baixa renda.

    O impacto dos tributos nas camadas mais pobres da população é mais intenso do que nos estratos superiores. Ainda assim, os juízes vêem o orçamento público como uma fonte inesgotável de recursos e não como a raiz de novos tributos. A eficiência alocativa é uma ambição de qualquer administrador público responsável por gerir recursos escassos em um ambiente de grande demanda.

    E m data recente, participei, na condição de palestrante, de um congresso internacional sobre o tema, na Universidade Torquato Di Tella em Buenos Aires, por meio de uma parceria entre a Universidade de Bergen (Noruega) e a Universidade de Harvard (Estados Unidos).

    A judicialização da saúde no Brasil ainda pende de julgamento no Supremo, mas em países como Argentina, Costa Rica, Colômbia, África do Sul e Costa Rica, este tema já foi regulado. Em todos estes países, as Supremas Cortes aceitaram a incumbência política de regular a extensão do direito à saúde, dizendo se ele investe o cidadão comum em um direito subjetivo público de acesso a medicamentos e cirurgias de alto custo.

    N a Colômbia, por exemplo, a Corte Constitucional (em 31.07.2008), por meio da decisão unificada T- 760 /2008, reestruturou todo o sistema público de saúde no país. Esta decisão tem 411 páginas e foi precedida de um amplo debate deflagrado desde 1992. A Suprema Corte da Colômbia reuniu um total de 22 ações (tutelas) dos quais 20 casos individuais e 2 casos trazidos à Corte por companhias de seguro-saúde. Esta decisão histórica parte, por conseguinte, parte da afirmação de que os órgãos de governo responsáveis pela...regulação do sistema de saúde não têm adotado decisões que garantam o direito à saúde sem a busca da tutela judicial pelo cidadão.

    O s casos que se repetiam todos os dias perante os tribunais e juízos inferiores foram reunidos em uma única decisão regulatória. Na Colômbia ao contrário do Brasil entre 1999 e 2005, 89% das cirurgias, 93% dos tratamentos médicos e 84% dos procedimentos buscados em juízo já estavam previstos nos protocolos de seu sistema público (POS equivalente ao nosso SUS sistema único de saúde) o que significa dizer que havia uma clara falha na execução destas políticas públicas.

    N o Brasil, ao contrário da Colômbia, busca-se acesso a medicamentos de alto custo não previstos nas listas do SUS.

    N a Costa Rica, por exemplo, já a partir de 1989, qualquer cidadão pode ingressar com uma petição direta perante a Suprema Corte (Sala IV), mesmo que sem a representação de advogado ou o pagamento de custas judiciais, para a tutela de um direito à saúde que não está previsto, de modo expresso, na Constituição daquele país, mas é considerado uma derivação do direito à vida e à proteção social pelo Estado. Desde uma célebre decisão tomada em um amparo no ano de 1997 (envolvendo pacientes vítimas de aids) a corte tem recebido um número crescente de novas demandas (1.100 novos casos em 2007).

    T anto na Colômbia quanto na Costa Rica, a questão orçamentária (e econômica) não é tratada. Em 1994, a África do Sul deixou de ser uma soberania parlamentar e se transformou em uma democracia constitucional. Foram incluídos direitos sociais na nova Constituição e a Suprema Corte daquele país tem insistido que cabe aos juízes garantir adequação constitucional dos governos em face destas garantias e fornecer remédios constitucionais contra suas violações.

    O direito à saúde, na Constituição da África do Sul (seção 27) é tratado de forma conjunta com o direito à água e comida suficiente e também seguridade social.

    A decisão mais importante da Suprema Corte da África do Sul consta do caso TAC, no qual a corte afirmou que não existe um direito subjetivo público em favor do cidadão, mas que cabe ao Judiciário verificar se os programas governamentais atendem à razoabilidade e fornecem acesso a direitos sócio-econômicos em uma base progressiva.

    F inalmente, na Argentina, temos um único caso de intenso ativismo judicial em favor de portadores do vírus HIV, também por intermédio de uma ação de amparo coletivo, sendo que o enquanto volume de ações judiciais se dá por conta da existência de uma sistema público de saúde bastante abrangente.

    O Supremo Tribunal brasileiro não possui, atualmente, condições de regular todos os casos que têm surgido no país sobre direito à saúde, já que nem mesmo a competência (se federal ou estadual) foi definida. A simples realização de uma audiência pública em Brasília muito embora se constitua em louvável iniciativa do ponto-de-vista político não transforma um debate hoje superficial e retórico em uma ampla e profunda discussão nacional.

    A regulação judicial no Supremo depende de uma pesquisa prévia acerca de quais os casos estão sendo levados rotineiramente ao Poder Judiciário e de que maneira estes casos têm sido decididos.

    A inda assim, fica a pergunta, os pobres devem suportar as despesas (com saúde) dos ricos?

    (*) E.mail: edf@jfpr.gov.br

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